PSD tem margem orçamental para cumprir promessas, mas economistas pedem “prudência”
Cenário económico é mais favorável do que o esperado e novo Governo deve cumprir promessas, mas aumento da despesa do Estado coloca pressão sobre as contas públicas.
Luís Montenegro vai assumir o leme da governação do país com uma economia mais favorável do que o esperado: o excedente orçamental foi de 1,2% em 2023 e o Banco de Portugal já prevê que o PIB vai crescer 2% este ano. Apesar deste enquadramento, têm-se multiplicado os alertas para que a margem seja guardada para o futuro e que se tenha em atenção as “pressões financeiras” que existem, como os salários e o investimento público. O Governo terá, assim, de atingir um equilíbrio entre cumprir o que prometeu mas com “prudência e saber”, destaca o economista António Nogueira Leite ao ECO.
O Banco de Portugal (BdP) reviu em alta as previsões para o crescimento da economia este ano, estimando agora um salto de 2% do PIB em 2024, segundo o boletim económico de março. Esta é uma perspetiva mais otimista do que a de dezembro, quando esperava um crescimento de 1,2%. O banco central também prevê que a inflação será mais baixa do que o esperado.
Além disso, soube-se esta segunda-feira, através do Instituto Nacional de Estatística (INE), que o excedente orçamental atingiu 1,2% do PIB em 2023, acima do previsto pelo Ministério das Finanças e o valor mais elevado em democracia.
Esta revisão “poderá ter impacto em termos de projeções que se possam fazer para a evolução de receitas, mas, mesmo assumindo que os impostos se mantêm na mesma, não é possível replicar o crescimento das receitas dos últimos dois anos que ajudaram a explicar o excedente e que tiveram a ver com um processo inflacionário conjuntural, que está mais controlado”, alerta o também ex-secretário de Estado das Finanças.
Assim, apesar da almofada orçamental, já começaram a surgir vários alertas para se ter em atenção a gestão desta margem. O governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, apelou a que se guarde a margem para o futuro e para a “próxima crise”, ao invés de a “consumir no presente”. E salientou que há certas medidas que têm de ter contraponto.
Já Fernando Medina, ministro das Finanças cessante, numa reação depois de serem conhecidos os dados do INE, avisou o Governo da Aliança Democrática (AD) que há “pressões orçamentais” que vão condicionar as decisões financeiras futuras.
Estas pressões incluem os efeitos da inflação sobre as pensões e salários, bem como as renegociações dos contratos de despesa na Administração Pública. O investimento público para as transições ambiental e digital é outro fator, nomeadamente após o fim do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) — sendo de recordar que Medina propôs a criação de um fundo pós-PRR, mas a concretização da medida anda é incerta.
António Nogueira Leite também deixa o aviso de que é uma situação que “merece cautela”, tendo em conta o “novo normal se o Banco Central Europeu tiver sucesso no controlo da inflação”.
Há várias classes profissionais que esperam aumentos significativos das remunerações. Vai ter um impacto permanente no Orçamento do Estado e põe patamar de exigência em relação ao que tem de ser o comportamento da economia.
Mas, mesmo com estes alertas, o ex-secretário de Estado destaca que, “politicamente, foram criadas expectativas durante a campanha e devem ser, o mais possível, satisfeitas”. “Há várias classes profissionais que esperam aumentos significativos das remunerações. Vai ter um impacto permanente no Orçamento do Estado e põe patamar de exigência em relação ao que tem de ser o comportamento da economia, porque também há uma promessa de redução de impostos”, salienta.
João César das Neves, economista e antigo assessor económico de Cavaco Silva, também destaca, em declarações ao ECO, que, graças ao excedente, que foi “extraído ao país através de uma política que comprometeu seriamente o desenvolvimento nacional”, o futuro Governo “pode agora ter alguma margem, não para tomar medidas necessárias para o desenvolvimento do país, mas para distribuir aos grupos de pressão que têm capturado a agenda política a seu favor”, reiterou.
As reivindicações de alguns grupos profissionais, nomeadamente os polícias e os professores — cuja recuperação gradual do tempo de serviço deverá custar 240 milhões de euros, segundo as contas da AD –, deverão estar entre as prioridades do novo Governo, mas é ainda incerto se para tal será necessário um Orçamento retificativo. Tendo em conta a margem que existe, parece ser improvável, como também salientou Rui Baleiras, em entrevista ao ECO: “As traves mestras contabilísticas do Orçamento em vigor têm flexibilidade suficiente para acomodar e suportar uma troca de prioridades políticas“, disse o presidente da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO).
Mesmo com este espaço para acomodar medidas mais “urgentes” em termos das prioridades do PSD, para o economista João César das Neves “o problema orçamental continua quase tão grave como era há oito anos, porque o anterior Governo, em vez de fazer reformas estruturais, limitou-se a espremer a economia com impostos e o aparelho do Estado, cortando no investimento”, pelo que “as emergências financeiras estruturais vão continuar na ordem do dia”.
António Nogueira Leite também destaca que “há uma expectativa de que o produto possa crescer um pouco mais, mas, globalmente, as coisas estão na mesma”, sendo que “a ideia de que caiu do céu um superavit gigantesco que permite política diferente” não é verdade. O economista espera que o Governo “cumpra o que prometeu, mas que seja responsável”, admitindo que a “realização vai implicar um exercício orçamental de muita prudência e saber”.
Assim, “o cumprimento das promessas deve ser feito tendo em conta que a despesa nominal do Estado, das Administrações Públicas, entre 2018 e o que está previsto no OE para o final do ano de 2024, tem um aumento de quase 20 mil milhões de euros”, nota. Tendo em conta as pressões da despesa e também do investimento, há uma situação orçamental “complexa”.
A verdade é que os resultados de 2023 já deverão dar um empurrão às contas este ano, que partem de um ponto mais positivo que o esperado pela coligação liderada pelo PSD. O cenário macroeconómico apresentado pela AD previa um crescimento de 1,6% este ano, que deverá ser mais elevado, segundo as últimas previsões do Banco de Portugal.
A expectativa da coligação liderada por Luís Montenegro é de um crescimento do PIB de 2,5% em 2025, 2,7% em 2026, 3% em 2027 e 3,4% em 2028. Estes resultados são obtidos, segundo argumenta, com a implementação das medidas previstas no programa, com destaque para a reforma fiscal, que prevê uma baixa de impostos, tanto no IRS como IRC.
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