Há menos trabalhadores a deixarem as empresas e salários vão abrandar
Menos empregos disponíveis, cenário político relativamente instável e melhores estratégias de retenção de talento levam saídas voluntárias a cair, segundo a Mercer, que vê salários a abrandar em 2025.
O número de saídas voluntárias de trabalhadores das empresas para as quais trabalham está em queda. O mercado de trabalho português tem, neste momento, menos ofertas de emprego disponíveis do que há um ano, o que ajuda a explicar essa trajetória. Mas esse não é o único motivo. As empresas estão hoje “mais focadas em investir” no seu talento, adianta ao ECO a empresa de recursos humanos Mercer. E isso tem melhorado a retenção de trabalhadores.
Na edição deste ano do estudo “Total Compensation”, a Mercer indica que o indicador de turnover voluntário — que diz respeito às saídas voluntárias de trabalhadores das organizações — está situado em 8,6%, o que corresponde a um recuo de dois pontos percentuais face ao ano anterior.
De notar que, nos anos pandémicos, este indicador também registou decréscimos (o que pode ser explicado pela instabilidade que se vivia na altura), mas em 2023 o panorama inverteu-se, tendo as saídas voluntárias superado mesmo os níveis anteriores à Covid-19 (10,6% em 2023 contra 10% em 2019).
Agora em 2024 o cenário volta a mudar, verificando-se um novo decréscimo. “Tipicamente a movimentação no mercado de trabalho (refletida pela rotatividade) tende a estar relacionada com a existência de mais ou menos oportunidades, assim como com a necessidade de mais ou menos estabilidade por parte dos colaboradores”, explica Marta Dias, rewards leader da Mercer Portugal, em declarações ao ECO.
Basta olhar para os dados mais recentes do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). No final de julho, havia 12.178 ofertas de emprego por satisfazer, menos 26,5% do que há um ano e menos 5,9% do que no mês anterior.
Podem existir vários fatores que determinam uma menor rotatividade, entre os quais um menor dinamismo do mercado de recrutamento (menos ofertas), mas também eventualmente alguma instabilidade política.
Mas esse não é o único motivo para a tendência decrescente das saídas voluntárias, aponta a referida especialista. “Podem existir vários fatores que determinam uma menor rotatividade, entre os quais um menor dinamismo do mercado de recrutamento (menos ofertas), mas também eventualmente alguma instabilidade política, que pode conduzir a uma menor predisposição ao risco por parte dos colaboradores“, sublinha Marta Dias, numa altura em que ainda nem é possível perceber se o PSD conseguirá ver a sua proposta de Orçamento do Estado para 2025 viabilizada.
Por outro lado, a responsável reconhece que as organizações estão “cada vez mais focadas em investir nas suas pessoas e nas condições que lhes proporciona“, o que “é natural” que tenha impacto na retenção de talento, resultando num menor nível de rotatividade voluntária, diz.
E questionada especificamente quanto às estratégias de fidelização de trabalhadores que as empresas têm adotado, Marta Dias realça que há iniciativas com vários focos, mas destaca que os salários têm crescido (em média, 6% este ano, pelas contas da Mercer). Além disso, têm ganhado terreno os prémios que “procuram reconhecer a performance e talento”, identifica a mesma.
“Complementarmente, cerca de um terço das empresas opta também por mecanismos de remuneração variável de longo prazo. Estes, sim, cada vez mais focadas em reforçar permanência e retenção. Finalmente, os benefícios têm ganhado cada vez mais espaço e mais diversidade”, acrescenta Marta Dias.
34% ainda não decidiram se vão despedir ou aumentar equipas
O estudo “Total Compensation”, que tem por base as respostas de 612 empresas com quase 200 mil trabalhadores, revela também “alguma cautela” dos empregadores nas intenções de contratação para o próximo ano.
Cerca de 38% querem manter o mesmo número de trabalhadores, menos um ponto percentual do que há um ano. Ainda assim, 28% querem aumentar as suas equipas (mais um ponto percentual do que há um ano) e 34% ainda não decidiram se pretendem aumentar ou reduzir o número de trabalhadores em 2025.
Em comparação com o ano passado, também o número de empresas indecisas é maior (verifica-se um aumento de um ponto percentual), mas Marta Dias desvaloriza esse agravamento, explicando que está “sobretudo relacionado com o momento da recolha de dados” (no final do primeiro semestre).
Já quanto às empresas que pretendem contratar, a especialista avança que ainda se sentirá escassez de trabalhadores em alguns setores e para alguns perfis no próximo ano. “Não é só um tema de perfis especializados em áreas como as Tecnologias da Informação, que talvez seja mais comummente conhecido, mas é também um tema de perfis mais técnicos (como manutenção, mecânica, eletrónica, e eletricidade) ou de perfis mais operacionais, por exemplo nas áreas da hotelaria”, assinala.
Salários vão abrandar (ligeiramente)
De olhos postos em 2025, as empresas já adiantam que vão subir os salários menos do que este ano, mas, ainda assim, o poder de compra dos trabalhadores portugueses pode sair reforçado.
O estudo da Mercer indica que o incremento médio deverá ser de 3,8%, o que representa um ligeiro abrandamento (de 0,6 pontos percentuais) face aos aumentos efetivamente registados em 2024. Marta Dias atribui essa desaceleração ao próprio abrandamento dos preços.
“Recuando alguns anos, e em cenários de baixa inflação (por exemplo, 2018 ou 2019), tipicamente em Portugal as percentagens de incrementos salariais médias definidas pelas organizações rondavam os 2% ou 2,5%. Nos últimos 2 a 3 anos, decorrente do aumento significativo da inflação, e consequente aumento do custo de vida, as organizações encontraram a necessidade de rever os seus orçamentos para aumentos salariais e caminhámos para valores a rondar os 4%. Agora, à medida que a inflação vai estabilizando, as organizações também vão estabilizando e ajustando as suas perspetivas de incrementos salariais (daí este ligeiro decréscimo perspetivado para 2025)”, argumenta.
Mantendo-se ambas as previsões, a taxa de inflação para 2025 será inferior aos incrementos salariais, oferecendo aos colaboradores um aumento real do seu poder de compra.
Ou seja, trata-se de um “ajuste natural após um período de taxas de inflação” históricas, sendo que, mantendo-se as atuais previsões, os aumentos serão, ainda assim, superiores à trajetória dos preços. “O que oferece aos colaboradores um aumento real do seu poder de compra“, destaca Marta Dias.
Já quanto aos benefícios extra salário, os mais comuns, neste momento, são o seguro de saúde (94% das empresas inquiridas) e o subsídio de refeição (90%), aponta a mesma especialista.
“Há, no entanto, benefícios que têm vindo a ganhar espaço e que acreditamos refletem o investimento das organizações em ir de encontro às preferências e necessidades dos colaboradores, é o caso da oferta de dias adicionais de férias, que é prática para 61% das empresas participantes no estudo, assim como os benefícios flexíveis que são oferecidos por 30% das empresas”, remata a rewards leader.
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