Apoios à classe média, benefícios fiscais e financiamento barato: os apelos do setor para a eficiência energética

Abranger a classe média, créditos fiscais e financiar a taxa zero são algumas das sugestões do setor para os apoios à eficiência.

Em 2025, abre-se um novo capítulo nos apoios estatais destinados à eficiência energética, que serão mais focados em famílias vulneráveis e deverão ser lançados durante o primeiro trimestre. As associações do setor, empresas e representantes dos consumidores apelam a uma maior abrangência e sugerem incentivos fiscais e financiamento mais barato.

São dois os novos programas que irão estrear no próximo ano: o E-Lar e o Bairros+Sustentáveis, ambos focados em famílias vulneráveis. E há um outro, lançado pelo anterior Governo, que “vai a prolongamento”: o Programa Apoio a Edifícios Mais Sustentáveis.

A Associação Nacional de Fabricantes de Janelas Eficientes (ANFAGE) pede programas que abranjam toda a população, que permitam que o IVA — Imposto sobre o Valor Acrescentado a aplicar à instalação de janelas eficientes seja reduzido à taxa de 6% — como no caso dos ares condicionados e painéis solares — e que se introduzam benefícios fiscais em sede de IRS — Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares para os valores investidos na melhoria da qualidade térmica das habitações.

Consideramos que uma parte significativa da população portuguesa, embora não se enquadre nos critérios de pobreza económica, continua a ser fortemente afetada pela pobreza energética.

Mariana Ludovino

Porta-voz da Deco Proteste

“Consideramos que uma parte significativa da população portuguesa, embora não se enquadre nos critérios de pobreza económica, continua a ser fortemente afetada pela pobreza energética“, sublinha a porta-voz da Deco Proteste Mariana Ludovino, que defende “a necessidade de programas de financiamento mais previsíveis, contínuos e inclusivos”. “Casas frias no inverno e bastante quentes no verão, continuará a ser o denominador comum da maioria das habitações em Portugal” acusa, alinhada, a ANFAGE.

Tendo em conta a realidade da pobreza energética em Portugal, muito devido à má qualidade da construção, “devem ser criados programas dirigidos à classe média“, reforça, por seu lado, a Coopérnico, aferindo que estes indivíduos não têm disponibilidade para fazer obras de renovação para melhorar a eficiência energética sem o auxílio de apoios. Isto, sem deixar de apoiar as famílias vulneráveis.

Manuel Pina, diretor geral da energética Otovo em Portugal, assinala em jeito de crítica que modelos de subscrição de painéis solares, que podem ajudar a mitigar as dificuldades em avançar com um investimento inicial, foram excluídos dos incentivos públicos até ao momento.

Numa voz dissonante, apesar de reconhecer o “grave” problema de pobreza energética em Portugal, Sofia Barbosa, diretora de Assuntos Regulatórios da Greenvolt, entende que a instalação de painéis fotovoltaicos “usualmente não necessitam de apoios públicos”. Projetos de partilha de energia (autoconsumo coletivo) oferecem às famílias a possibilidade de consumir energia renovável mais barata sem fazer qualquer investimento, relembra a empresa, que comercializa estas soluções. No entanto, mesmo para a Greenvolt, existe uma exceção: “se quisermos integrar baterias nos projetos de energia renovável (…) então os apoios são necessários”, refere.

Novos programas com lacunas

A ANFAGE considera que o programa E-Lar “não é compreensível”, já que “nada tem que ver com a melhoria do conforto térmico das habitações“, uma vez que refere unicamente à compra de eletrodomésticos mais eficientes. “A colocação de aparelhos de ar condicionado só vai fazer aumentar a dependência e fatura energéticas, sem resolver o problema da má construção”, acusam os fabricantes de janelas.

A Coopérnico deixa também alguns reparos aos novos planos. A energética vê o E-Lar como “pouco ambicioso” por se dirigir apenas à substituição de eletrodomésticos. Na mesma linha, a Greenvolt vê como relevante incluir neste programa medidas de reabilitação das casas, como insulação térmica das fachadas e substituição de janelas por outras mais eficientes.

Numa visão mais favorável, a Greenvolt entende que o E-Lar pode contribuir para mitigar a pobreza energética, ao permitir a substituição de eletrodomésticos e assim gerar uma poupança na fatura de energia, ao mesmo tempo que possibilitam um consumo de energia que forneça um maior conforto térmico. O problema pode estar, por outro lado, nos resíduos criados com os equipamentos descartados.

Já o programa áreas urbanas sustentáveis foca-se apenas em bairros sociais e históricos, deixando de fora populações vulneráveis residentes noutros territórios, sublinha a Coopérnico.

Olhando aos programas anteriores, a Deco Proteste declara-se preocupada com a extinção do Programa de Apoio a Edifícios Mais Sustentáveis (PAE+S) “sem uma alternativa clara”. A ANFAGE considera o este programa um “sucesso”, pelo que defende que exista uma continuidade, e que seja melhorada a execução e reforçado o montante total.

A Coopérnico concorda que os programas anteriores tinham “aspetos muito positivos”, mas aponta “problemas na implementação” e “enormes atrasos”. A Otovo ecoa que “um dos maiores problemas” foi “o tempo que as candidaturas aos anteriores incentivos do Governo demoraram a ser avaliadas”, e sublinha que devem ser evitados requisitos processuais de difícil compreensão, que travam as candidaturas.

"Há um risco manifesto de descredibilização das medidas caso os apoios não sejam concedidos com celeridade.”

Sofia Barbosa

Diretora de Assuntos Regulatórios da Greenvolt

De forma a resolver os entraves mais burocráticos, a ANFAGE apela à melhoria do funcionamento da plataforma do Fundo Ambiental que se destina às candidaturas. “A maior parte das pessoas que contactaram a ANFAJE, considera-a pouco intuitiva, de resposta lenta e de difícil interpretação”. E refere a necessidade de melhoria do serviço de atendimento do E-Balcão.

Há um risco manifesto de descredibilização das medidas caso os apoios não sejam concedidos com celeridade“, alerta a Greenvolt. Por outro, a atraso na atribuição dos subsídios tem um outro efeito pernicioso que é a interrupção de projetos que poderiam seguir em frente sem os subsídios e que são adiados, entende a mesma empresa.

Lá fora, financiamento a taxa zero e créditos fiscais

A Otovo, que tem operações em 13 mercados do Velho Continente, afirma que os casos de maior sucesso de apoios à eficiência energética, a nível europeu, são o italiano e o espanhol. Em Itália, os incentivos cobriam 100% do investimento dos clientes e o reembolso era feito através de créditos em IRS. Em Espanha, apesar de não cobrirem a totalidade do investimento, os incentivos permitiam às famílias escolherem o modelo de aquisição, podendo optar pela subscrição, podendo assim beneficiar do apoio sob a forma de desconto no preço final a pagar, quer seja através da mensalidade ou de pagamento único. Desta forma, o cliente não necessitava ter o valor inicial para investir.

Já a ANFAGE destaca o caso de França, onde o programa Eco-Pret financiava estes investimentos, através da banca comercial com aval do Estado francês, com taxa de juro de 0% e com IVA reduzido. Na Alemanha, o Banco de Fomento público (KFW) financiou as melhorias na eficiência energética a taxas de juro próximas de 0%, que acumulavam com condições variáveis consoante os estados federais.

A Greenvolt espera ainda ver o setor público a dar o exemplo, seguindo as diretivas da União Europeia. A partir de final de 2026, no que se refere a edifícios públicos e de serviços, terá que ser a assegurada a instalação de energia solar de forma faseada nos edifícios novos e existentes. No caso de projetos de partilha de energia, o setor público será obrigado a alocar 10% da energia partilhada a famílias vulneráveis. “Para Portugal, este será um aspeto importante a considerar”, balança a diretora de Assuntos Regulatórios da Greenvolt.

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