Exclusivo Novos indicadores de qualidade do correio “são cumpríveis”, admite CEO dos CTT
João Bento muda o discurso sobre as metas de qualidade do correio, dizendo-se "confiante" de que os CTT conseguirão este ano cumprir as regras traçadas pelo Estado.
O presidente executivo dos CTT CTT 0,85% está “razoavelmente confiante” de que, em 2025, a empresa conseguirá quebrar um ciclo de sucessivos incumprimentos dos indicadores de qualidade do serviço postal universal.
Com a entrada em vigor este ano das novas metas de desempenho, que anteriormente eram definidas pela Anacom e agora são da competência do Governo, João Bento revela, em entrevista à edição de fevereiro do ECO magazine, nas bancas esta semana, que uma das “prioridades este ano em termos de operações é conseguir entregar os indicadores de qualidade”.
De acordo com o líder dos Correios, os novos indicadores de qualidade são “muito difíceis de cumprir”. Esta declaração representa uma evolução no discurso do gestor, na medida em que considerou, em declarações passadas, que os objetivos anteriores eram “impossíveis” de cumprir.
Por serem “muito difíceis” e não “impossíveis” de cumprir, “significa que são cumpríveis”, reconhece o gestor. “Portanto, é o nosso dever tentar cumpri-los e tudo faremos para tentar cumpri-los”, afirmou João Bento, dizendo-se “muito empenhado” nisso e “razoavelmente confiante”.
A lei postal determina que os CTT, enquanto concessionários do serviço público do correio, têm de cumprir objetivos de qualidade definidos pelo Governo, sob proposta da Anacom. Anteriormente, esses indicadores eram decididos diretamente pelo regulador das comunicações, sendo que os indicadores de 2021 se mantiveram em vigor ainda no ano de 2024, contra o que era a expectativa da própria empresa quando, há três anos, assinou com o Estado o novo contrato de concessão.
Ora, a atual administração dos CTT sempre foi muito crítica dessas metas de qualidade, registando sucessivos incumprimentos por margens expressivas. Analisando apenas o período da nova concessão, em 2022 a empresa falhou todos os 22 indicadores, com desvios de até 18,3 pontos percentuais, e em 2023 conseguiu cumprir um, mas falhou uma das metas por mais de 21 pontos percentuais.
Estes indicadores regulamentam vários aspetos técnicos do correio, desde o tempo máximo de entrega das cartas ao tempo de espera nas lojas. Por isso, têm impacto na qualidade do serviço prestado aos utilizadores e contratado pelo Estado português.
Uma das nossas prioridades este ano em termos de operações é conseguir entregar os indicadores de qualidade. Os indicadores de qualidade agora são muito difíceis de cumprir. Mas, sendo muito difíceis de cumprir, quer dizer que são cumpríveis. Portanto, é o nosso dever tentar cumpri-los e tudo faremos para tentar cumpri-los.
“Proposta que foi feita pela Anacom é uma proposta ilegal”
Em outubro de 2023, a Anacom, ainda sob a presidência anterior, de João Cadete de Matos, que estava em vias de abandonar o cargo, propôs o que disse ser uma “significativa simplificação” dos indicadores. A proposta foi bastante mal recebida pela empresa postal.
“Tive ocasião de o dizer publicamente e de lhe dizer a ele [João Cadete de Matos]: a proposta que foi feita é uma proposta ilegal, na medida em que contrariava a lei. A lei diz que os indicadores têm de ser fixados em linha com a média dos indicadores da União Europeia e aqueles indicadores eram uma vergonha, porque usavam a média ou a mediana como mais convinha e os dois países que foram usados como referência foram Malta e Luxemburgo. Luxemburgo é mais pequeno que a cidade de Coimbra e Malta é mais pequena que o distrito de Coimbra. Ficámos, apesar de tudo, tal como não gostaria, muito marcados por essa proposta”, comenta agora João Bento nesta entrevista ao ECO magazine.
Em setembro de 2024, o atual Governo, sob a tutela do ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, decidiu aprovar os atuais indicadores, acompanhando a estrutura proposta pelo regulador, mas aligeirando os parâmetros (“Eu percebo o embaraço político”, diz o líder dos CTT). São esses os indicadores que a empresa postal terá de cumprir e que irá fazer por cumprir.
Os Correios têm ainda outro incentivo ao cumprimento este ano. Nos termos do novo contrato de concessão, até à aprovação de novos indicadores de qualidade, os CTT deixariam de estar obrigados a compensar os utilizadores com cortes nos preços do correio, ficando sujeitos, em alternativa, a obrigações de investimento.
Passados dois anos do incumprimento dos indicadores de 2022, ainda não se conhece que investimentos os CTT terão de realizar para melhorar o serviço postal. Como o ECO revelou recentemente, a empresa enviou ao Governo a sua proposta de plano de investimentos no início de dezembro e o Ministério das Infraestruturas solicitou mais esclarecimentos. É um assunto ainda pendente de decisão. Em simultâneo, o Estado já se prepara também para exigir compensação pelas falhas de 2023, mas ainda por via de investimentos (“Eu acho que os montantes ainda não fazem muito sentido”, refere o CEO).
Todavia, o Estado, enquanto concedente, não tem nenhuma garantia de que esses investimentos não estivessem já planeados pela empresa. Aliás, no início de 2022, João Bento admitiu perante um analista numa apresentação de resultados trimestrais que havia investimentos que a empresa podia tornar “elegíveis” para efeitos do cumprimento destas obrigações.
Instado agora pelo ECO magazine a esclarecer que garantia têm os utilizadores do serviço postal universal de que esses investimentos não estariam já planeados, João Bento responde: “Mas não há nenhum inconveniente em que estivessem previstos.” E acrescenta: “Comprar a Cacesa é um investimento enorme, mas melhora zero o serviço público universal. Comprar máquinas de processamento de correio é um investimento também muito grande e que melhora a prestação do serviço.”
O responsável diz ainda que “sem qualquer dúvida” que a expansão da rede de lockers dos CTT — os cacifos que permitem receber encomendas, negócio que fica fora do escopo do serviço universal — poderia ser tornada elegível para essas obrigações de investimento, quando questionado sobre essa hipótese.
E porquê? “Hoje, se for ali à Braamcamp ou à Avenida de Roma, naqueles lockers novos que estão na rua onde dantes havia um marco de correio, consegue enviar cartas, consegue enviar encomendas, consegue fazer qualquer coisa, a uma hora em que não há estações de correio abertas. Isso é uma melhoria para o público? É uma melhoria para o público”, aponta o gestor.
Em contrapartida, a compensação pelos cortes nos preços era um mecanismo “punitivo” e isso “prejudicava ainda mais o próprio serviço postal universal”, que é financiado pelos próprios utilizadores, argumenta João Bento. A propósito, com o começo de fevereiro, entra em vigor um novo preçário com aumentos médios de preços de 6,9%, quase o triplo da inflação, pela aplicação de uma fórmula decidida entre a empresa, a Anacom e a Direção-Geral do Consumidor.
Evolução das ações dos CTT em Lisboa:
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Novos indicadores de qualidade do correio “são cumpríveis”, admite CEO dos CTT
{{ noCommentsLabel }}