Plataformas de streaming devem apostar em estratégia híbrida de recomendação de conteúdos
Estudo evidencia a necessidade de as plataformas de streaming estarem atentas às novas tendências dos utilizadores e de os seus algoritmos não apostarem apenas na análise de comportamentos passados.
As falhas na classificação através de inteligência artificial (IA) podem impactar negativamente os consumidores, sendo que recomendações e sugestões em plataformas de streaming que não vão ao encontro do pretendido pelos utilizadores podem levar a resultados adversos, como arrependimento e insatisfação com o prestador de serviços.
As conclusões são do estudo “Misaligned AI andItsImpactonConsumerIdentity”, conduzido pelos investigadores Diego Costa Pinto (Nova IMS), Ana Rita Gonçalves (IPAM Porto), Héctor Gonzalez-Jimenez (ESCP Business School), Marlon Dalmoro (Federal University of Rio Grande do Sul) e Anna S. Mattila (Pennsylvania State University). O estudo inclui dados de utilizadores da Netflix e do Spotify em Portugal, Reino Unido e Estados Unidos, e utilizou técnicas de neuromarketing.
Ao analisar o papel da IA na personalização de conteúdos, o estudo demonstrou que quando as sugestões e recomendações das plataformas não vão ao encontro do sentido de identidade e dos desejos dos consumidores, tal tem implicações concretas, como a mudança de plataforma, o abandono temporário da mesma, ou, em casos mais extremos (e raros), o cancelamento de subscrições.
Estas falhas acontecem porque as plataformas e as suas recomendações baseadas em IA se focam demasiado no passado e histórico do utilizador. “A plataforma não consegue perceber mudanças momentâneas no padrão de comportamentos. Claro que a médio prazo, a plataforma adapta-se. Mas ela baseia as suas decisões em comportamentos passados e o consumidor está sempre a mudar as suas necessidades e expectativas. E quando há um gap entre as novas expectativas do consumidor e o que a plataforma oferece, é aí que está o problema“, refere Diego Costa Pinto.
Para fazer face a esta realidade, a recomendação do investigador é de que estas plataformas apostem numa estratégia híbrida. “Apesar de boa parte do conteúdo que o utilizador quer consumir poder ser previsto tendo em conta os seus comportamentos passados, é preciso estar atento às trending topics que a pessoa vai querer no futuro”, explica ao +M.
“Tem de ser adaptativo. É esse o grande segredo. É estar atento a essas micro tendências do consumidor, algo que é super difícil de fazer. É importante não colocar todo o peso do algoritmo em comportamentos passados, mas olhar para as tendências mais recentes do consumidor para conseguir propor coisas novas“, acrescenta.
Ou seja, as plataformas e os seus algoritmos têm de ir testando a sugestão de conteúdos junto dos consumidores. Imaginando que um utilizador ouviu apenas e esporadicamente uma música de um determinado artista, a plataforma pode depois testar e, em vez de apenas colocar essa música desse artista, colocar também mais uma outra. Se essa ação for bem acolhida, pode ir depois acrescentando mais, ou, se não, voltar atrás, exemplifica o investigador.
“Essa predição tem de ser feita de forma adaptativa. O conhecimento que se tem do consumidor, de comportamentos passados, não vai necessariamente ajudar a prever o que o consumidor vai querer no futuro. Esse é o grande desafio. Às vezes os algoritmos colocam bastante peso no passado, conseguindo prever 80% do que o consumidor gosta de ouvir, mas os 20% que não consegue e que são uma nova tendência de mudança que o consumidor está a fazer poderão vir a ser os conteúdos que mais tarde mais vão ser consumidos”, explica.
Segundo Diego Costa Pinto, outro problema identificado que leva a reações negativas por parte dos utilizadores prende-se com a insistência das plataformas em sugerirem, constantemente, determinados conteúdos. Ou seja, quando fazem um “push comercial” para tentar “impingir” constantemente um conteúdo ao consumidor, sendo que este “muitas vezes percebe que aquilo é empurrado e que não tem sentido para si”.
Outra das conclusões é que a faixa etária está bastante relacionada com a forma como os consumidores são afetados pelas falhas nas classificações feitas por IA. A Geração Y (entre os 30 e 39 anos) é a mais suscetível a ter sensações negativas em cenários de falha de IA, segundo dados avançados por Diego Costa Pinto, sendo 45,5% mais afetada do que os consumidores da Geração Z (18-29) e 18,9% mais afetada do que os da Geração X (mais de 40 anos).
Estes resultados, segundo Diego Costa Pinto, podem ser explicados pelo “contexto tecnológico em que cada geração cresceu e pela familiaridade com serviços de streaming e algoritmos de IA“.
Ou seja, enquanto a Geração Z “já nasceu na era do streaming”, tendo “expectativas mais realistas” em relação às capacidades e limitações dos algoritmos de IA — o que os torna “mais resilientes emocionalmente perante falhas” –, a Geração Y “transitou da era da televisão linear para o streaming e tende a ter expectativas mais elevadas em relação a estas plataformas”.
Mesmo por “terem testemunhado uma evolução tecnológica significativa”, estes consumidores “esperam que os algoritmos de IA compreendam melhor as suas preferências, o que amplifica o impacto emocional de uma falha”.
Já no que diz respeito aos consumidores de faixas etárias mais velhas, como os da Geração X, embora estes tenham adotado os serviços de streaming de forma mais tardia, “a sua menor familiaridade com as capacidades dos algoritmos pode resultar em expectativas mais moderadas, reduzindo o impacto emocional de uma falha”, entende Diego Costa Pinto.
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