Entrada de Carlos Tavares ressuscita privatização da Azores Airlines
Secretário Regional das Finanças diz ao ECO que o agrupamento que concorre à privatização tem agora "nomes à prova de bala". Governo vai mandatar SATA para avançar com negociações finais.
O processo de privatização da Azores Airlines tinha saído da rota, mas esta quarta-feira sofreu uma reviravolta inesperada, que poderá levar a que tenha, afinal, uma aterragem segura. Com a entrada no agrupamento candidato a comprar a companhia aérea do gestor Carlos Tavares, antigo CEO do gigante automóvel Stellantis, e o aumento do valor a pagar, o Governo Regional dos Açores vai dar instruções à SATA para avançar para as negociações finais. Os sindicatos dividem-se entre o otimismo e a preocupação.
“A estratégia negocial do Governo resultou e o consórcio aumentou o valor do ativo. Para melhor preparação do projeto pelo consórcio, foram apresentados mais dois nomes, um deles Carlos Tavares, que é se calhar o melhor gestor português em todo o mundo, o que credibiliza a proposta e complementa a valorização do ativo”, afirmou Duarte Freitas, secretário regional das Finanças, Planeamento e Administração Pública, em declarações ao ECO.
O jornal Açoriano Oriental noticiou na quarta-feira que Carlos Tavares e Paulo Pereira da Silva – um empresário ligado ao turismo e ao agroalimentar na zona do Douro (Quinta da Pacheca) e detentor de uma cadeia de supermercados com presença em várias cidades francesas – se tinham juntado ao agrupamento candidato à aquisição da Azores Airlines, a companhia que faz as ligações aéreas internacionais e com o continente, passando a deter 49%.

Os outros 51% ficam com a Newtour/MS Aviation, o único consórcio admitido pelo júri, embora com críticas à sua falta de “força financeira” para assegurar a sustentabilidade da companhia aérea. Circunstância a que se juntaram “possíveis falhas de idoneidade”, referenciadas pela então administração da SATA ao Governo regional.
Dúvidas que parecem agora desfeitas. “O consórcio apresentou nomes à prova de bala, como o engenheiro Carlos Tavares, que aporta conhecimento e credibilidade“, diz Duarte Freitas.
Decisivo foi também o aumento do preço que o agrupamento oferece por 76% da Azores Airlines, que inicialmente era de cinco milhões de euros, depois passou para seis milhões e agora está em 15,2 milhões. “A questão número um era a valorização do ativo”, diz o secretário regional das Finanças, sublinhando a vitória negocial conseguida com “a quase triplicação do valor”.
Haverá amanhã (quinta-feira) uma deliberação do Conselho do Governo dando instrução ao Conselho de Administração da SATA Holding para que, face à valorização do ativo pretendida, se entre na fase de negociações finais.
Ultrapassada estas questões o processo vai avançar. “Haverá amanhã (quinta-feira) uma deliberação do Conselho do Governo dando instrução ao Conselho de Administração da SATA Holding para que, face à valorização do ativo pretendida, se entre na fase de negociações finais“, diz ao ECO Duarte Freitas. “Quem vai liderar esta fase das negociações é o júri presidido pelo economista Augusto Mateus”, acrescenta.
À terceira será de vez?
A entrada de Carlos Tavares em cena desbloqueou um processo que tem sido bastante atribulado. Depois de duas tentativas falhadas em 2018 e 2020, o Governo Regional liderado por José Bolieiro avançou com novo processo em 2023, cumprindo uma das exigências do plano de reestruturação acordado com a Comissão Europeia em junho de 2022, no âmbito da ajuda estatal de 453,25 milhões de euros concedida durante a pandemia.
Ao concurso público internacional concorreram dois agrupamentos. Um deles, o Atlantic Consortium, foi desqualificado. Foi selecionado o outro, que junta a Newtour, um grupo 100% português dono das agências de viagens Bestravel ou do operador Soltrópico, e a MS Aviation, detida pela Bestfly, uma companhia aérea angolana. O presidente do júri, Augusto Mateus, manifestou, no entanto, reservas sobre a capacidade financeira do consórcio e os sindicatos foram também muito críticos.
Perante o resvalar do processo, a CEO da SATA, Teresa Gonçalves (que sucedeu ao atual CEO da TAP), apresenta a demissão, tal como o administrador financeiro. A 2 de maio de 2024, o Governo Regional delibera o cancelamento do concurso, com o argumento de que uma nova avaliação da Azores Airlines (cujos resultados financeiros estavam a melhorar), feita pela Caixa BI, avaliava a companhia em 20 milhões de euros, em vez dos seis milhões iniciais. Em reação, o agrupamento opta pela contestação judicial.
Perante a necessidade de avançar com a privatização, o diálogo com o agrupamento Newtour/MS Aviation é reatado ainda em 2024 e o processo ganha nova vida com a chegada de Carlos Tavares, que poderá meter um pé na aviação, talvez de olho num ‘prémio’ maior, a privatização da TAP, em que já disse estar interessado.
A dívida fica na SATA Holding. É uma herança de todos os açoreanos que os Governos socialistas nos deixaram.
Duarte Freitas assegura que já não existe qualquer litigância. O Governo regional também não espera uma nova subida do preço: “Nesta fase não é razoável. O Governo já conseguiu quase triplicar o valor e que a credibilidade fosse afirmada”. O processo é também facilitado pelo facto de a Azores Airlines ser vendida sem dívida, de cerca de 400 milhões de euros, que fica na SATA Holding. “Para salvar a companhia é preciso vender a Azores Airlines e assumir o buraco. É uma herança de todos os açorianos que os governos socialistas nos deixaram“, diz o secretário regional das Finanças.
Tavares, um “trunfo” que não sossega totalmente os sindicatos
Ricardo Penarróias, presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC), que já foi muito crítico do consórcio, considera que depois de ter sido chumbado pelo Governo regional, com a entrada de Carlos Tavares “foi à oral e subiu a nota para positiva”.
“É sacar um trunfo. Este novo elemento no consórcio visa mostrar maior capacidade e um esforço para colmatar as dúvidas que foram levantadas”, avalia Ricardo Penarróias. “Esperamos que as alterações no consórcio sejam positivas e vão ao encontro do que o júri pretende, mas que vá também ao encontro das necessidades dos trabalhadores, nomeadamente dos tripulantes”, acrescenta.

“Aparentemente é bom. Tudo o que seja para garantir a sustentabilidade do grupo SATA é bom”, salienta Saraiva de Almeida, vice-presidente do Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil, sublinhando que “o Grupo SATA é um dos maiores empregadores e tem um grande impacto na economia da região”.
Sobre Carlos Tavares, diz não ter dúvidas que tenha capacidade para gerir, mas, tendo em conta que vem do setor automóvel, aconselha que se rodeie de pessoas conhecedoras da indústria de aviação. “Há três pilares muito sólidos que os compradores têm de ter: idoneidade financeira, idoneidade técnica e idoneidade laboral”, sintetiza.
Ricardo Penarróias sublinha que a maior preocupação do SNPVAC “é o caderno de encargos da privatização, que não dá grande segurança aos trabalhadores ao limitar a alguns anos a obrigatoriedade de manter o hub e os postos de trabalho”. Pede também mais informação: “Qual o objetivo financeiro e operacional deste consórcio para a empresa. Para podermos dar uma opinião temos de saber qual o projeto para os trabalhadores da SATA”.
A falta de informação leva Paulo Duarte, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos, a preferir esperar para se pronunciar sobre a entrada do “D. Sebastião da aviação” nacional no consórcio, mas manifesta uma “grande preocupação com a situação da SATA”. Apesar do crescimento das receitas, o grupo teve prejuízos de 43,6 milhões entre janeiro e setembro de 2024, dos quais 34,9 milhões resultam da Azores Airlines.
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