Estado arrecadou 1.123 milhões com contribuição reprovada pelo Constitucional
Uma recente decisão do Tribunal Constitucional obriga o Estado tenha de devolver parte da Contribuição Extraordinária do Setor Energético a algumas das visadas.
A Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético (CESE), criada em 2014, foi largamente contestada pelas empresas visadas, incluindo na justiça. Uma decisão do Tribunal Constitucional conhecida a semana passada veio permitir que as empresas do subsetor do gás natural — que inclui concessionárias das atividades de transporte, distribuição ou armazenamento subterrâneo — possam pedir a devolução de valores que lhes foram cobrados no âmbito desta taxa.
De acordo com os especialistas consultados pelo ECO/Capital Verde, os valores arrecadados pelo Estado com a Contribuição Extraordinária do Setor Energético não são publicados discriminando entidades ou setores, pelo que não são conhecidos para já os valores que estão em causa com esta decisão. No entanto, um levantamento feito pela KPMG para o ECO/Capital Verde indica que, nos dez anos entre 2014 e 2024, o Estado terá amealhado um total de 1.123 milhões de euros com esta contribuição, de acordo com os documentos da Síntese de Execução Orçamental.
No caso da REN, as empresas concessionárias do gás — REN Gasodutos, REN Portgás e REN Armazenagem — pagaram um total de 95,7 milhões de euros desde 2014 no âmbito da CESE. É este o valor para o qual a empresa aponta quando questionada acerca de quanto espera reaver na sequência da última decisão do tribunal constitucional.
A REN interpôs um processo por ano e por concessionária em relação à CESE, sendo que a empresa não é apenas afetada no que diz respeito à atividade relativa ao gás natural, mas também à eletricidade. Desde 2014, entrou com 44 processos. No total, incluindo os ativos que tem no setor de eletricidade, a REN já suportou relativamente a esta contribuição o montante de 291,9 milhões de euros, desde esse ano e até 2024. “A REN sempre acreditou que lhe ia ser dada razão quanto à CESE. Esperamos que os restantes processos tenham o mesmo resultado deste“, afirma a empresa, em resposta ao ECO/Capital Verde.
95,7 milhões de euros
Valor pago em CESE pelas empresas concessionárias do gás desde 2014
Esta segunda-feira, numa chamada com analistas na sequência da apresentação de resultados, a co-CEO da Galp, Maria João Carioca, considerou “positiva” e “adjuvante” a última decisão do Tribunal constitucional acerca da CESE. Contudo, conta que os impactos financeiros desta decisão sejam “muito limitados” para a Galp, assumindo que a decisão diz apenas respeito ao ano de 2019 e à atividade de distribuição de gás. A Galp, pelo menos até 2023, dizia nunca ter pago a CESE, acumulando provisões de quase 500 milhões de euros.
As interpretações dos advogados quanto ao horizonte temporal a que a decisão diz respeito, contudo, divergem. Filipe de Vasconcelos Fernandes, Professor na Faculdade de Direito de Lisboa e Senior Counsel na Vieira de Almeida (VdA), considera que a decisão do tribunal se aplica aos exercícios de 2019 em diante. Já Joana Lobato Heitor, sócia do Departamento Fiscal da MFA Legal e Catarina Gomes Correia, associada sénior do mesmo departamento, acreditam que a decisão está circunscrita aos valores do ano de 2019. Independente da interpretação, os especialistas reúnem acordo quanto ao resultado: as empresas visadas têm direito a reaver os montantes pagos no âmbito da contribuição.
Embora o Tribunal Constitucional já se tenha pronunciado várias vezes em relação à CESE, fê-lo sobretudo em relação a casos concretos, através de acórdãos. Estes decretaram inconstitucionalidade relativamente a casos dos diferentes subsetores, desde a eletricidade e produtos petrolíferos até ao gás natural. Contudo, esta última decisão relativa ao subsetor do gás distingue-se por ter força obrigatória geral, ditando que qualquer caso equivalente que chegue ao tribunal deverá ser decidido no mesmo sentido. Ao mesmo tempo, exige que a norma inconstitucional deve ser retirada da lei.
A Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético foi criada em 2014, na sequência do pedido de assistência financeira de Portugal e da intervenção da troika, com o objetivo de financiar um fundo para a sustentabilidade do setor energético e repartir o esforço de ajustamento orçamental com as empresas de maior capacidade contributiva. O Estado previa, na altura, arrecadar 150 milhões de euros por ano, em 2014 e 2015. Contudo, a taxa foi-se mantendo até aos dias de hoje, com o protesto das energéticas.
A EDP, que não é afetada pela mais recente decisão mas que é uma das grandes contribuidoras, deixou de pagar em 2023, ano em que devia 49,3 milhões de euros, e voltou a fazê-lo em 2024, ano em que o custo equivalia a 47,7 milhões de euros. O grupo EDP, entre 2014 e 2022, pagou mais de 558 milhões de euros de CESE.
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