Symington “perde dinheiro” com vinhos no Alentejo e na Rússia

Quinta da Fonte Souto (sub-região de Portalegre) ainda dá prejuízos à maior proprietária do Douro. Dona das marcas Graham’s ou Altano perde quatro milhões na Rússia e nos custos de engarrafamento.

Cinco anos depois de comprar a Quinta da Fonte Souto, no Alentejo, uma operação fechada no primeiro semestre de 2017 que incluiu as vinhas e uma adega, mas deixou de fora as marcas (Altas Quintas) e os stocks de vinho, o presidente da Symington Family Estates, que detém as casas de Porto Graham’s, Cockburn’s, Dow’s e Warre’s, e vários projetos no Douro (Quinta do Vesúvio, Quinta do Ataíde, Altano, Prats & Symington – Chryseia), desabafa que “em termos financeiros, isto é um projeto que perde dinheiro todos os anos”.

“Tivemos de investir em praticamente tudo, desde os edifícios, na vinha, na rega, e estabelecer uma marca não é nada fácil. Ou temos muita sorte ou investimos muito dinheiro. (…) A maior parte do vinho alentejano vende-se a quatro euros por garrafa ao consumidor e o nosso vinho de entrada sai a nove euros. Mesmo assim não estamos a ganhar dinheiro”, reconhece Rupert Symington, em entrevista ao ECO.

Rupert Symington , CEO do grupo SymingtonRicardo Castelo/ECO

O gestor confessa mesmo a “surpresa” que teve ao chegar à sub-região de Portalegre, pois “achava que se criava uva nessa terra a metade do preço do Douro”. “É ligeiramente mais económico, mas não muito. São solos bastante inférteis. Tem muita água, o que é uma vantagem, mas as condições não são muito diferentes do Douro em termos de rendimento por videira. Portanto, o vinho saiu bastante mais caro do que eu estava a pensar”, completa.

Sem detalhar os valores, o líder do grupo criado em 1882, que fechou o ano passado com um volume de negócios de 105 milhões de euros, diz que “as vendas já cresceram, mas ainda estão muito aquém do necessário para rentabilizar o projeto” no Alto Alentejo. Mesmo assim, contextualiza, “isto é o negócio do vinho: são muitos anos para criar um ativo e há muitos produtores que nunca fazem lucros, vivem das mais-valias que fazem nas marcas”.

As condições não são muito diferentes do Douro em termos de rendimento por videira. O vinho saiu bastante mais caro do que eu estava a pensar. As vendas já cresceram, mas ainda estão muito aquém do necessário para rentabilizar o projeto.

Rupert Symington

CEO da Symington Family Estates

Questionado sobre a aparente falta de entusiasmo com este negócio, o membro da quarta geração da família de origem britânica e portuguesa que fundou a empresa – na qual ingressou em 1992 e de que se tornou presidente executivo em janeiro de 2019, sucedendo ao primo Paul –, garantiu estar comprometido. Embora reconheça que o modelo de expansão que “faz mais sentido” é o de parcerias com produtores já estabelecidos e com experiência nessa região. “Porque gerir um projeto à distância, como fizemos no Alentejo, custa muito em termos de tempo e de dinheiro. E às vezes há soluções muito mais económicas”, conclui.

Foi o que acabou por acontecer no final de julho. Naquilo que designou como um “feliz encontro de vontades” com o grupo TMG e Michael de Mello, acionistas da Caves Transmontanas, avançou para a compra da empresa de Alijó que produz o conhecido espumante Vértice. Através de um aumento de capital passa a deter uma participação de 50%, “o que permitirá criar o suporte financeiro necessário para promover a expansão do negócio e o investimento em ativos”. É também mais uma marca para a Portfolio Vinhos, a distribuidora da família em Portugal – tem outras duas no Reino Unido e nos EUA.

Rússia desaparece e custos aparecem

Além do Alentejo, outra geografia em que o maior proprietário de vinhas no Douro (26 quintas com um total de 2.420 hectares) vai perder dinheiro é na Rússia, que já gerava receitas superiores a dois milhões de euros. E para onde deixou de enviar caixas de vinho logo após o início da guerra na Ucrânia, por uma “questão ética”. “É uma pena. Depois de termos trabalhado dez anos a construir um mercado saudável na Rússia e com clientes fiéis, agora, por uma situação política que ninguém quer – nem o consumidor nem nós – temos de abdicar de exportar para lá”, lamenta Rupert Symington.

Quanto aos efeitos indiretos do conflito militar no leste europeu, com o custo das caixas de cartão a subirem 20% e os fornecedores de garrafas a aplicarem sobretaxas de 45% nas faturas, o presidente é rápido a fazer as contas. Os materiais secos pesam um terço nos custos de engarrafamento. Um aumento de 20% nos materiais representa +7%. Engarrafar uma caixa de vinho passa de 9 para quase 10 euros. Em dois milhões de caixas são dois milhões de euros que desaparecem. Parte dos custos já começaram a ser passados aos clientes. “Vivemos quase 15 anos de inflação zero. Não deve ser surpresa nenhuma os preços subirem”, sublinha.

É uma pena perdermos a Rússia. Depois de termos trabalhado dez anos a construir um mercado saudável e com clientes fiéis, por uma situação política que ninguém quer – nem o consumidor nem nós – temos de abdicar de exportar para lá.

Rupert Symington

CEO da Symington Family Estates

No ano passado, em que o enoturismo ainda esteve fechado em algumas fases e havia restrições nas viagens por causa da pandemia, o grupo sediado em Vila Nova de Gaia cresceu 5% e ultrapassou, pela primeira vez, os 100 milhões de euros de faturação. Holanda, França, Bélgica, EUA e Inglaterra compraram não só mais garrafas de vinho do Porto, mas também as referências mais caras. A marca mais valiosa é a Graham’s e a Cockburn’s a maior em volume. Acrescentando a Dow’s, este trio assegurou 70% das vendas em 2021.

No Douro continua a avançar a construção da nova adega no Vale da Vilariça, em que tem à volta de 200 hectares de vinha biológica, com capacidade para 500 mil litros por ano e direcionada para os vinhos premium feitos a partir das uvas dessa zona, a sul de Mirandela. A obra vai custar bem mais do que os sete milhões de euros inicialmente orçamentados e, nas palavras do CEO, é “uma aposta nas credenciais ‘verdes’ da Symington, para a próxima geração” e será o “cartão-de-visita da família em termos de sustentabilidade”.

Na área do enoturismo, o grupo explora as caves da Graham’s e da Cockburn’s, tem visitas à Quinta do Bonfim e à Quinta da Fonte Souto, e experiências VIP na Quinta do Vesúvio. Além do restaurante Vinum, em Vila Nova de Gaia, que deverá vir a ter uma réplica no Douro. Para já, só tem alojamento particular. “Eventualmente, podemos considerar abrir um hotel no Douro, mas nas condições atuais em termos de mão-de-obra é um bocadinho arriscado. Temos muitos edifícios e localizações junto ao rio Douro”, perspetiva Rupert Symington.

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