A 150 km de Lisboa, a fábrica da Mitsubishi Fuso, detida pela Daimler, produz camiões ligeiros desde 1964. Com 500 operários, orgulha-se de usar a força dos braços e vai ter modelo elétrico em 2023.
“Este foi chão que já deu uvas…e vai continuar a dar”. Uma videira à entrada de uma fábrica de automóveis é coisa rara de se ver, mas pode ter todo o sentido. Estamos no Tramagal, no concelho de Abrantes, na fábrica da Mitsubishi Fuso Europa. É nesta unidade que são produzidos os camiões ligeiros Canter desde 1980.
Em 2022, a unidade produtiva está a preparar-se para a próxima fase, com mudanças de topo. O alemão Arne Barden veio do Japão para assumie a liderança da fábrica, depois da saída de Jorge Rosa. O português esteve à frente dos destinos da Mitsubishi Fuso Europa durante 16 anos e foi homenageado com a simbólica videira à entrada da fábrica.
Ainda não entrámos dentro das instalações e há mais uma mudança: foram compradas trotinetas elétricas e bicicletas para os cerca de 500 operários se deslocarem pela linha de montagem “de maneira mais eficiente”, refere ao ECO o gestor alemão. A intenção é ganhar oito minutos por viagem — em vez de 10 minutos a pé, bastam dois minutos num veículo partilhado.
Olhando um pouco mais para cima, o topo dos pavilhões ganhou painéis solares nos últimos anos, contribuindo, de forma decisiva, para que a unidade produtiva se tornasse neutra em emissões. O impacto só não é mais expressivo porque ainda não dá para exportar os camiões ligeiros pela linha do comboio, que fica mesmo em frente às instalações e que tem uma estação a menos de 10 minutos a pé.
A fábrica está exatamente no mesmo terreno desde 1964, embora muita coisa tenha mudado. Há quase 60 anos, as instalações foram criadas por um consórcio luso-francês, entre a metalúrgica local Duarte Ferreira e os franceses da Berliet (atual Renault Trucks). Na cantina da fábrica, ainda há fotografias desse tempo.
Logo na inauguração da fábrica houve a primeira de várias visitas de Estado, com a presença do então Presidente da República, Américo Thomaz. A última presença de um Presidente português foi em 2017. Marcelo Rebelo de Sousa assinalou o início da produção, em série limitada, da primeira geração da eCanter.
Em 1964, fabricavam-se camiões para transportar os militares portugueses em Angola, Moçambique e Guiné, em plena Guerra Colonial. Depois de 1974, os camiões continuaram a ser produzidos mas apenas para fins domésticos.
A história da videira não conta esses tempos. Salta para 1980, ano em que a Mitsubishi comprou a fábrica e começaram a ser produzidos, apenas para Portugal, os camiões Canter e Fuso, e os jipes L200, L300 e Pajero. Em 1996 começou a exportação. E Tramagal concentrou-se na produção dos camiões Canter. Em 2005, a Daimler comprou este negócio à Mitsubishi — apesar de a denominação da fábrica se ter mantido.
Preparação para o futuro elétrico
Dentro da fábrica, ainda se nota pouco o automatismo que pode ser encontrado noutras linhas de montagem, sobretudo na produção de veículos ligeiros. No Tramagal, os camiões são produzidos com muito trabalho braçal, no aperto do parafusos e na colocação das peças nos sítios certos. Veem-se muitas calhas e muitas máquinas, tudo com supervisão humana.
Aqui não estamos distraídos: não há investigação e desenvolvimento, não há área de vendas, nem há coisas engraçadas. Somos excelentes no fabrico de veículos. Ponto final.
Este ano vão ser produzidas 12 mil unidades, o maior número de sempre em quase 60 anos de fábrica. Praticamente todos os camiões são fabricados com motor a gasóleo porque a primeira geração da eCanter apenas foi produzida em série muito restrita.
Mas as coisas vão começar a mudar em 2023: há uma zona marcada a azul onde se pode ver a próxima geração da eCanter, que será produzida em série e que irá ocupar cada vez mais espaço na linha de montagem. O fabrico de uma unidade elétrica implica maiores cuidados na colocação de algumas peças.
O que se mantém no Tramagal é o propósito “muito claro e específico [de] fabricar camiões para o mercado europeu“, segundo Arne Barden, CEO da Mitsubishi Fuso Truck Europe.
“Fazemos isso com toda a atenção e muito perto da perfeição. Aqui não estamos distraídos: não há investigação e desenvolvimento, não há área de vendas, nem há coisas engraçadas. Somos excelentes no fabrico de veículos. Ponto final.” É do chão do Tramagal que os camiões vão continuar a sair para toda a Europa e países como Marrocos, Austrália e Nova Zelândia.
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No Tramagal, há chão que dá cada vez mais camiões
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