Ex-acionista da TAP pede que o deixem de usar como “arma de arremesso político”
David Neeleman lembra que durante os seus 5 anos na companhia, "a TAP não precisou de um euro do Estado Português e a sua dívida financeira deixou de ser garantia pelo Estado".
O ex-acionista da TAP David Neeleman lançou esta segunda-feira o “repto” ao Governo para que o deixe de usar e à transportadora como “arma de arremesso político” e se concentre em recuperar o investimento dos contribuintes na empresa. Na semana passada, o ministro das Infraestruturas esteve no parlamento a ser ouvido sobre o eventual futuro processo de privatização da TAP, audição na qual foram trocadas várias acusações, sobretudo com o PSD, e abordada a anterior gestão privada da companhia.
Numa reação escrita em resposta a um pedido da Lusa, o ex-acionista privado da TAP diz não poder deixar de “lançar um repto ao ministro Pedro Nuno Santos e ao atual Governo”: “Por favor, deixem de utilizar a minha pessoa e a TAP como arma de arremesso político e concentrem os vossos esforços em recuperar o enorme investimento que, entretanto, os contribuintes portugueses foram forçados a fazer na companhia“.
O consórcio Atlântico Gateway – composto pelos acionistas Neeleman e o empresário português Humberto Pedrosa – venceu a privatização da TAP, levada a cabo pelo Governo do PSD/CDS-PP, operação que foi parcialmente revertida em 2015 com o Governo PS. “Todo o processo de privatização e a posterior reconfiguração acionista foram amplamente escrutinadas por dois governos de Portugal, Parpública, Tribunal de Contas, Autoridade da Concorrência, Autoridade Nacional de Aviação Civil, entre outras entidades”, sublinha o empresário da aviação.
Na audição no parlamento, o ministro Pedro Nuno Santos evocou, nomeadamente, a privatização levada a cabo pelo Governo do PSD/CDS-PP na qual a TAP foi vendida por 10 milhões de euros a “um acionista que endividou ainda mais a empresa”, disse. Em resposta ao deputado do PSD Paulo Rios de Oliveira, que referiu uma injeção de 270 milhões de euros feita pelo antigo acionista privado na empresa, o ministro das Infraestruturas disse que a injeção foi de 224 milhões e que o PSD ainda não explicou se “houve efetivamente uma capitalização, ou se houve um endividamento ainda maior”.
Paulo Rios de Oliveira acusou, nomeadamente, o Governo de não ter dito aos contribuintes que os 3.200 milhões de euros injetados na TAP eram “a fundo perdido”. Neeleman argumenta, na mesma nota à Lusa, que quando o consórcio Atlantic Gateway, detido pelo empresário americano e pelo português Humberto Pedrosa em 50-50, venceu a privatização da TAP no final de 2015, “a empresa estava completamente descapitalizada e em risco de não conseguir pagar salários” e que “nessa altura, pelas regras europeias, o Estado Português estava impedido de colocar mais um euro na TAP”.
Por isso, contesta as declarações de Pedro Nuno Santos: “Ao contrário do que o ministro refere, não é verdade que o Estado Português não tivesse até então financiado a TAP, pois toda a dívida da empresa até a privatização era garantida a 100% pelo Estado e só dessa forma a TAP tinha capacidade de obter financiamento bancário”. Sobre o endividamento, explica que aquando a entrada do consórcio privado na TAP a dívida “ascendia a cerca de 11x EBITDAR”, sublinhando que, durante os cinco anos na companhia, “a TAP não precisou de um euro do Estado Português e a sua dívida financeira deixou de ser garantia pelo Estado, tendo passado para menos de metade do que representava no período pré-privatização, em 5x o seu EBITDAR”.
“O nosso Plano Estratégico para a TAP era muito claro, transparente e foi apresentado, explicado e aprovado por todos os intervenientes no processo de privatização – Estado incluído –, tanto na fase de negociações e preparação da privatização, como aquando da reorganização acionista levada a cabo pelo novo Governo de então. Todos os objetivos do Plano Estratégico foram cumpridos até ao momento em que uma pandemia global imobilizou o setor da aviação mundial”, afirma ainda o empresário.
Mas antes, diz, a TAP “apresentava uma liquidez sólida de cerca de 500 milhões de euros (muito acima dos níveis pré-privatização)”, tendo aumentado em 18% o número de colaboradores, crescido em 54% o número de passageiros ao ano, o volume de negócios cresceu 39%, o número de voos subiu 21%, e adicionou mais 13 destinos novos – “seis deles no ‘supercompetitivo’ mercado dos Estados Unidos”, refere ainda Neeleman.
Neeleman diz lamentar desde a sua saída da TAP que “muitos bons quadros abandonaram a companhia”, que o “alinhamento com os trabalhadores desapareceu” e que, até ao final deste ano, o Estado “terá injetado quase quatro mil milhões de euros” na companhia.
“Nos meus diversos projetos na indústria da aviação, sempre cumpri as minhas obrigações e sempre atuei de forma honesta e transparente. Tive muita pena que o atual Governo tivesse optado pela solução de ‘impor’ a minha saída sob ameaça da nacionalização da TAP. Não é verdade que era a única solução e que cabia aos ‘privados’ capitalizar a companhia, como facilmente se conclui olhando para as congéneres europeias da aviação. Na verdade, não foi assim em nenhuma companhia aérea no mundo. Nenhuma empresa estava preparada para resistir à pandemia”, acrescenta.
Neeleman acrescenta que os acionistas privados das companhias áreas “foram apoiados no contexto da pandemia e estas não foram intervencionadas pelos respetivos Estados. A sua gestão manteve-se sempre privada”, ao contrário do que aconteceu com a TAP. David Neeleman considera que “a TAP é uma grande empresa que deve ser privada como todas as companhias áreas de bandeira europeias e mundiais”, operação que “merecem os trabalhadores, merecem os seus clientes, merecem as comunidades portuguesas, merece Portugal”.
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