Revisão Constitucional do PSD vai aproveitar ideias de Rui Rio ou de Passos Coelho?
O PSD reúne esta quinta-feira o seu Conselho Nacional para discutir, além da situação política nacional, um projeto de revisão constitucional. Montenegro já se mostrou disponível para dialogar com PS.
O PSD reúne esta quinta-feira o seu Conselho Nacional, em Lisboa, com a “análise da situação política” e o “projeto de revisão constitucional” na agenda da reunião. Com apenas 24 horas para entregar esse mesmo projeto, já que o prazo termina a 11 de novembro.
E a questão que desde logo se coloca é se Luís Montenegro irá propor uma revisão mais cirúrgica do texto constitucional ou uma mais alargada.
As dúvidas recaem sobre se a proposta do PSD vai aproveitar, ou não, alguns dos pontos da proposta alargada de revisão da Constituição de Rui Rio, o antecessor de Luís Montenegro na liderança dos social-democratas. Ou se, uma vez que já fez saber que vai dialogar com o PS nesta matéria, vai querer apenas incluir os pontos que os socialistas querem alterar no texto fundamental. Ou seja: alterações relativamente aos metadados e a questões relacionadas com possíveis novos confinamentos.
A anterior direção do PSD apresentou publicamente um projeto de revisão da Constituição em setembro do ano passado, mas que que não chegou a ser entregue no Parlamento devido à dissolução da Assembleia da República e à campanha interna para a presidência do partido. E logo nessa altura Luís Montenegro fez saber que não concordava que Rui Rio entregasse o seu projeto de revisão constitucional.
Certo é que o ECO sabe que esse trabalho de casa feito por Rio e o seu núcleo próximo não será desaproveitado no seu todo já que o trabalho do grupo nomeado por Montenegro, feito em articulação com a Comissão Política Nacional, apesar de ser um projeto novo, fez uso dos projetos anteriores existentes no PSD. Mas em causa poderá estar não só o projeto de Rui Rio como o projeto elaborado em 2010, sob a liderança de Passos Coelho, em que se pretendia alterar um terço da lei fundamental. Mas a dissolução do Parlamento em 2011 interrompeu os trabalhos desta comissão parlamentar.
O atual grupo de trabalho é liderado por Miguel Poiares Maduro, ex-ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, com a tutela da Comunicação Social, do Desenvolvimento Regional e das Autarquias Locais de Pedro Passos Coelho e que na liderança interna do partido esteve ao lado de Jorge Moreira da Silva. Deste grupo sairá apenas uma sugestão de proposta e não um texto definitivo.
Mas a verdade é que alguns sinais já foram dados. Marcelo Rebelo de Sousa já disse que “o Presidente da República não risca nada em revisões constitucionais, mas é bom ter tudo certinho se houver mais pandemias” e, na segunda-feira, Luís Montenegro já fez saber estar “totalmente disponível” para “acertar e concertar” com o PS a viabilização de “algumas” alterações à Constituição, depois de terminar o prazo para apresentação de projetos, na sexta-feira.
Na quarta-feira, o PSD avançou que, com o seu projeto de revisão constitucional, pretende uma “modernização dos direitos fundamentais”, o reforço da autonomia regional e “afinamentos à organização política”, indicou o vice-presidente António Leitão Amaro, sem adiantar propostas concretas.
Em declarações aos jornalistas no final de uma reunião com os deputados do partido, Leitão Amaro afirmou que o PSD está a fazer um “caminho de preparação para um projeto de revisão constitucional que, sendo realista, é diferenciador, quer contribuir e ajudar para tornar o país melhor, essencialmente procurando avançar em três domínios, três orientações”.
“Uma que tem que ver com o reforço, a modernização dos direitos fundamentais em várias dimensões, desde a dimensão ambiental, intergeracional e do serviço às pessoas”, afirmou. De acordo com António Leitão Amaro, o projeto do PSD vai ter também “uma dimensão de reforço da autonomia regional e de preocupação com a coesão territorial”. “Em terceiro lugar, naquela lógica de pôr a pessoa no centro das políticas públicas e da organização, fazer afinamentos à organização política e a alguns elementos de organização do Estado”, adiantou.
Umas declarações que surgem depois do Observador ter avançado que o PS vai apresentar um projeto de revisão constitucional para consolidar e alargar “direitos fundamentais”, além das questões já analisadas com o PSD sobre a lei de emergência sanitária e acesso a metadados na investigação criminal. Membros da direção dos socialistas referiram que o trabalho interno em torno da revisão constitucional começou “há algum tempo” e os princípios base do futuro projeto serão apresentados na reunião da Comissão Política Nacional do PS, esta quinta-feira. “Não iremos pelo caminho de uma revisão constitucional cirúrgica, limitada a uma ou duas questões. Há caminho para termos uma Constituição da República mais progressista, consolidando e alargando o catálogo de direitos fundamentais, sobretudo no domínio social”, declarou um dirigente do PS.
“É muito difícil antecipar o conteúdo do projeto de revisão constitucional que o PSD vai apresentar no Parlamento, pois o mesmo está no segredo dos deuses”, explica Jane Kirkby, consultora do escritório de advogados Antas da Cunha ECIJA. “A discussão não será fácil, na medida em que alguns deputados têm vindo a revelar descontentamento pela forma como Luís Montenegro tem dirigido o assunto internamente”. E acrescenta: “A única coisa que se sabe é que, ao contrário do projeto preconizado pela direção de Rui Rio, que consubstanciava uma revisão muito alargada da Constituição, com a alteração de quase metade dos artigos e a eliminação de outros tantos, as alterações desta direção serão mais cirúrgicas. É possível que Luís Montenegro vá repescar algumas das alterações propostas pelo PSD de Passos Coelho no projeto de revisão constitucional de julho de 2010, e mesmo algumas propostas pelo PSD de Rui Rio, no projeto de julho de 2021, sendo cause certo o aumento do mandato presidencial de cinco para seis anos e da legislatura de quatro para cinco sessões legislativas e o alargamento dos poderes do Presidente da República”.
A advogada concluiu ainda sublinhando que “a Constituição, tal como se encontra hoje redigida, não constitui propriamente um obstáculo ou bloqueio ao desenvolvimento económico. Isto porque, não só a jurisprudência do Tribunal Constitucional, quando chamada a decidir, tem sido sábia na procura de soluções flexíveis e atualistas na interpretação da lei fundamental, como o legislador e a jurisprudência tem assumido com naturalidade que alguns artigos caíram em desuso. Exemplo disso foi a forma como, durante a pandemia, o legislador conseguiu, sem fugir à Constituição, resolver através da lei ordinária as imposições que o estado de sítio e estado de emergência ditavam. Não existe, assim, uma urgência em provocar uma revisão constitucional. Importa sim, lançar um debate sobre o tema, com serenidade, não só na Assembleia da República, mas junto da sociedade civil”.
E o que queria Rui Rio na ‘sua’ revisão constitucional?
Um dos pontos passava pela redução do número de deputados de 230 para 215, segundo avançou o semanário Expresso na segunda-feira, mas também o alargamento das legislaturas de quatro para cinco anos e dos mandatos do Presidente da República, com poderes reforçados, de cinco para seis anos, e limitação de mandatos para todos os cargos políticos, incluindo deputados.
O projeto propunha como direitos e deveres fundamentais “a consagração da possibilidade de estado de emergência especificamente por razões de saúde pública, com duração a fixar por lei” e a possibilidade de confinamento de pessoa infetada com grave doença contagiosa, “se necessária por razões de saúde pública” e “em condições a determinar por lei”, incluindo a possibilidade de confirmação por autoridade judicial.
No campo da Justiça, Rui Rio pretendia reduzir de 48 para 24 horas do tempo máximo de detenção sem ter sido presente a juiz, a redução do prazo para decisão de habeas corpus de oito para cinco dias, e a equiparação da prisão domiciliária à prisão preventiva.
Outra das possibilidades previstas era a de o Presidente da República presidir a reuniões do Conselho Superior da Magistratura ou do Conselho Superior do Ministério Público e a alteração da composição do Conselho Superior da Magistratura, com maioria de membros não magistrados. Bem como a alteração da composição do Conselho Superior do Ministério Público, com maioria de membros não magistrados do Ministério Público e a designação de membros também pelo Presidente da República e pelo Procurador-Geral da República.
Admitia igualmente a coincidência de referendos com eleições e eliminava a participação mínima de metade dos eleitores recenseados para efeito vinculativo do referendo.
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