Novas variantes e vacinas “bivalentes”. Estas são as “incógnitas” da Covid para os próximos meses

No dia da reunião do Infarmed, peritos ouvidos pelo ECO alertam que há ainda "incógnitas" para os próximos meses, como o impacto de subvariantes da Ómicron e a efetividade das vacinas "bivalentes".

Governo, partidos e especialistas voltam a reunir-se esta sexta-feira no auditório do Infarmed para avaliarem a situação epidemiológica da Covid-19 em Portugal, numa altura em que os internamentos aumentam de forma ligeira. Especialistas ouvidos pelo ECO avisam que há ainda “várias incógnitas” para os próximos meses, nomeadamente o impacto do surgimento de novas subvariantes da Ómicron, bem como a efetividade das vacinas “bivalentes” que estão a ser administradas. Além disso, criticam o fim do isolamento obrigatório para os infetados.

“Neste momento não sabemos qual é o número de casos que temos exatamente em Portugal“, assinala Manuel Carmo Gomes, epidemiologista e professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, notando, que, com o fim do estado de alerta, a linha de de Saúde 24 deixou de prescrever testes à Covid, pelo que os dados oficiais apenas se reportam a testes feitos em contexto hospitalar ou das “pessoas que se deram ao trabalho de obter receita médica” para se testarem.

Portugal está atualmente com uma média de 756 novos casos por dia, na média a sete dias. Mas, perante esta mudança de abordagem, o especialista alerta que os números reais poderão ser três vezes superiores. A “bússola” para acompanhar a evolução da Covid passou, por isso, a ser “essencialmente” o número de internamentos e óbitos.

A tendência dos hospitais tem sido de um aumento suave, mas persistente do número de pessoas internadas com Covid“, afirma Manuel Carmo Gomes, acrescentado que esta subida começou a verificar-se “a meio de outubro”. Atualmente, Portugal tem 543 pessoas internadas em enfermaria geral, sendo que há 15 dias os valores rondavam os 500 e durante setembro e outubro estavam abaixo dos 400. “Isto diz-nos que a circulação do vírus está a aumentar como seria de esperar com a chegada do inverno“, sinaliza, Manuel Carmo Gomes, ao ECO.

Já no que toca aos internados em cuidados de unidades intensivos (UCI), os números “têm estado relativamente estáveis, embora com uma tendência ligeiríssima para subir”. Atualmente, há 35 pessoas internadas nestas unidades, ao passo que em outubro não passava dos 30. Comparando estes dados com há um ano, o aumento de pessoas internadas em enfermaria geral é notório, dado que a 9 de novembro de 2021 havia 318 internadas, das quais 62 em UCI.

Também os óbitos associados à doença “estiveram muito estáveis durante cerca de dois meses”, com ” 5 a 6 óbitos por dia” e nos últimos 15 dias houve um pequeno aumento, com Portugal a chegar aos 8 óbitos por dia, mas os últimos dados aparentam uma reversão desta tendência, com os dados atuais a apontarem para os 6 óbitos por dia.

Da BQ.1 à efetividade das vacinas “bivalentes”

A reunião desta sexta-feira no Infarmed será, portanto, para fazer um “ponto de situação” da evolução da Covid em Portugal, não sendo esperadas novas medidas de contenção, tal como havia sinalizado o ministro da Saúde e reforçou a secretária de Estado da Promoção da Saúde, em entrevista ao Público. Os especialistas ouvidos pelo ECO referem que o atual contexto epidémico e até jurídico não permite a imposição de medidas “mais duras”, dado que não existe uma “sobrecarga” nos hospitais, mas avisam que há ainda várias “incógnitas”, como o surgimento de novas subvariantes da Ómicron, bem como a efetividade das vacinas “bivalentes” que estão administradas, para dar mais certezas sobre a evolução da doença.

Em Portugal, à semelhança do resto da Europa, tem estado a aumentar a prevalência de subvariantes da Ómicron que tem capacidade de fugir aos anticorpos”, adianta Manuel Carmo Gomes, dando como exemplo a BQ.1, que em França “já ultrapassou os 50% dos novos casos”, ainda que os dados preliminares não apontem para que cause doença mais grave. Já nos EUA, “B.Q.1.1 está a subir depressa, mas também não há sinal ainda de que esteja a causar maiores hospitalizações”, afirma o epidemiologista.

Nesse sentido, Manuel Carmo Gomes sublinha que “os sinais são de algum otimismo“, mas realça que estes devem ser olhados com “muita precaução”, dado que “ainda não há um domínio completo” destas subvariantes em vários países da Europa. Em Portugal, a variante B.A.5 continua a ser dominante, com uma prevalência de 92,5% dos casos, dos quais a BQ.1 tem uma prevalência de 42,5% e a BQ.1.1 27,5%, de acordo com o último relatório do INSA, divulgado na quarta-feira.

O professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa considera, por isso, que as próximas “duas a três semanas” serão decisivas para perceber o impacto destas subvariantes na subida dos casos, internamentos e óbitos. Outra das incógnitas é a eficácia das novas vacinas “bivalentes” (que têm uma componente da Ómicron e outra do vírus original), que estão administradas nesta campanha sazonal contra a Covid e gripe, nomeadamente aos mais idosos.

Já Bernardo Gomes, a par de mais dados sobre o impacto nestas novas subvariantes, espera ainda que desta reunião saia “uma reflexão” sobre consequências que a Covid tem a longo prazo. “Em termos de impacto não tem sido muito discutido, mas até pode estar ligado com alguns dos fenómenos que estamos a assistir, nomeadamente o maior número de infeções por outro tipo de agentes”, sublinha o médico de Saúde Pública e investigador do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), ao ECO.

Por outro lado, Gustavo Tato Borges, presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública (ANMSP), admite que “poderá surgir uma mudança no limiar dos critérios” de avaliação da pandemia, nomeadamente para “níveis pequenos”. A verificar-se, o especialista seria a favor dado que considera que isso permitiria agir de forma mais rápida em caso de agravamento da situação epidemiológica.

“Se esperarmos por atingir os níveis de alerta que estão definidos agora e que estavam reportados a uma altura em que mediamos a incidência, vamos estar 2 a 4 semanas atrasados na resposta à pandemia“, diz Gustavo Tato Borges, ao ECO, acrescentando que esta revisão evitaria “situações de elevado stress ou de elevada mortalidade que possam vir a surgir”.

Ao mesmo tempo, Manuel Carmo Gomes antecipa que poderá ainda surgir um “anúncio de um programa nacional de vigilância das doenças respiratórias”, que inclua não só a Covid e gripe, mas todos vírus respiratórios, como os outros coronavírus, rinovírus e vírus sincicial.

Peritos lamentam fim do isolamento obrigatório

Paralelamente, os especialistas ouvidos pelo ECO esperam ainda que seja feito o reforço das habituais recomendações para conter a propagação da doença, nomeadamente ao nível do uso de máscara em ambientes fechados, como os transportes públicos, a importância da ventilação dos espaços, bem como da manutenção do distanciamento físico e evitar ir sair de casa com sintomas. “Há margem para esgotar instrumentos que não estão a ser completamente usados, nomeadamente na questão da mobilização voluntária e da informação”, aponta Bernardo Gomes, defendendo que estes instrumentos devem ser usados ao “máximo, antes que voltemos à ponderação de obrigatoriedades”.

Com o fim do estado de alerta, o isolamento deixou de ser obrigatório para os infetados e, a par com o fim da obrigatoriedade das máscaras nos transportes públicos, esta é também uma das críticas deixadas pelos peritos ouvidos pelo ECO. “Acabámos por retirar um incentivo para que as pessoas se resguardem e deixem de infetar outros”, aponta Bernardo Gomes, lamentando ainda o fim das baixas por Covid.

Nesse sentido, o especialista insta o Governo a “rever os moldes” das baixas, nomeadamente da Covid e gripe, para salvaguardar a habitual época sazonal de doenças respiratórias, uma vez que os cidadãos continuam “a precisar de mecanismos burocráticos para certificar a baixa em termos profissionais”. Para Bernardo Gomes deve ser ponderada a possibilidade de “ter um molde de baixa de um dia ou dois dias de baixa remunerada” associada a esta altura do ano.

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