Competitividade das PME em causa por falhas nos objetivos sustentáveis da ONU

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável ligados ao trabalho digno e igualdade de género preocupam 53% das PME que admitem terem dificuldades em identificar medidas a implementar neste campo.

A maioria das pequenas e médias empresas em Portugal (53%), identificam os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 5 e 8, ligados à igualdade de género e ao trabalho digno, respetivamente, como preocupações. No entanto, admitem terem dificuldades em identificar medidas efetivas que estejam a implementar neste campo, referindo-se maioritariamente a soluções como a flexibilidade no trabalho.

A conclusão surge de um estudo divulgado, esta segunda-feira, pelo ISCTE, e conduzido no âmbito do programa europeu Catalyst, onde revelam que cerca de 28% das PME portuguesas que participaram no inquérito desconhecem os conceitos básicos relativos aos ODS das Nações Unidas e à sustentabilidade dos modelos de negócio.

Já aquelas que estão familiarizadas com os ODS, desconhecem a forma de os incorporar nos modelos de negócio. Esta realidade, indica o estudo, põe em causa a competitividade e produtividade das empresas, a médio e longo prazo.

Os problemas de competitividade e produtividade das PME portuguesas terão tendência a agravar-se porque os modelos de negócio não estão a ser transformados tendo em vista os desafios da sustentabilidade“, refere ao ECO/Capital Verde, Florinda Matos, investigadora e docente do ISCTE e coordenadora portuguesa do projeto europeu CATALYST. “A maioria das PME portuguesas não têm consciência do valor acrescentado que a sustentabilidade pode trazer para os seus negócios”.

Segundo o inquérito, a maior parte das PME a nível nacional limita a sua estratégia “verde” na adoção de práticas de sustentabilidade ambiental, nomeadamente, através de investimentos em eficiência energética ou na reciclagem de produtos e matérias-primas. Para estas empresas, a sustentabilidade só é considerada quando não acarreta um aumento de custos porque a maioria dos seus clientes não estão dispostos a pagar mais por produtos e/ou serviços sustentáveis.

Para a investigadora, a fraca aposta numa estratégia virada, também, para práticas ligadas à sustentabilidade social e de governança não se deve à falta de conhecimento, mas sim pela falta de resultados “imediatos” à semelhança do que acontece em medidas com impacto ambiental e que, por vezes, resultam numa redução de custos, nomeadamente, a nível da energia.

“As empresas já ouviram falar de outros aspetos da sustentabilidade, mas como isso não tem impacto no imediato, não desenvolveram adequadamente conhecimentos na área” explica Florinda Matos, acrescentando que a falta de recursos financeiros e de planos estratégicos a longo prazo também são motivos que comprometem a falta de práticas sociais e de governança — dois pilares dos critérios ESG que a investigadora considera estarem “esquecidos”.

“Lembro que estes tópicos, apesar de não serem novos, ganharam destaque na nossa economia nos anos mais recentes e, especialmente, com os bancos ou outras grandes empresas a terem que mostrar que estão a fazer algo pelo ESG”, refere.

Nesse sentido, o ODS 7, ligado às energias renováveis, aparece como uma terceira preocupação para as PME no estudo do ISCTE, em parte, por causa dos “custos brutais na fatura energética” que podem “pôr em causa a viabilidade económica” daquelas empresas.

Já o ODS 9, relacionado com a inovação, também integra a lista de preocupações para estas organizações, principalmente por permitir o acesso a fundos públicos, nomeadamente o Programa de Recuperação e Resiliência e o Portugal 2030, iniciativas cujo foco é a produção de produtos ou serviços de valor acrescentado e a inovação. “As PME portuguesas não são maioritariamente inovadoras, mas precisam de inovação para sobreviver“, considera a docente.

Para colmatar estas falhas, que ameaçam a sobrevivência do tecido médio empresarial, o estudo do ISCTE recomenda que sejam desenvolvidos programas de qualificação empresarial que ensinem, internamente, a importância de incorporar a sustentabilidade nos modelos de negócio.

Se, no futuro, as PME com melhores desempenhos de sustentabilidade forem privilegiadas – por exemplo no acesso vantajoso a financiamentos públicos – certamente ficarão mais disponíveis para estas formações. A formação deve ser feita à medida da necessidade e do tempo das PME e não pacotes de formação formatada como tem sido vendida ao longo do tempo”, defende Florinda Matos, recomendando o recurso às tecnologias e plataformas online, como o e-learning.

Uma vez que os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável integram a Agenda para 2030, da Organização das Nações Unidas, existe a pressão adicional de serem cumpridas metas e apresentados resultados. Para a responsável, “certamente vamos chegar a 20230 e fazer o balanço, concluindo que muito do que estava previsto não foi concretizado“. No entanto, diz, “o pior é não fazermos nada”.

“As PME portuguesas são muito resilientes: se assim não fossem, muitas teriam morrido há muito tempo. Se sentirem a pressão financeira sobre os aspetos da sustentabilidade, vão reagir e ainda podemos vir a concretizar muita coisa”, defende.

O estudo do ISCTE, para o qual foram inquiridas cerca de 100 pequenas e médias empresas, foi realizado no âmbito do Projeto Europeu Erasmus + CATALYST. Ao todo, foram recolhidos dados de 470 PME de cinco Estados-membros. Os resultados finais do inquérito deverão ser divulgados em janeiro de 2023.

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