Patrões temem que desemprego “volte a ser um problema sério”

Subida da taxa de desemprego e dos inscritos nos centros do IEFP, onde estão a chegar menos ofertas de trabalho, eleva preocupação dos empresários quanto ao regresso da turbulência na área do emprego.

A taxa de desemprego em Portugal está no nível mais elevado do último ano e meio (6,7%), com o INE a estimar um total de 347,6 mil desempregados no final do ano passado. O número de inscritos nos centros de emprego está a aumentar há cinco meses consecutivos e já ultrapassa as 307 mil pessoas, indicam os dados do IEFP. As más notícias no que toca ao emprego parecem estar de volta, elevando a preocupação dos líderes empresariais ouvidos pelo ECO quanto ao eventual regresso a um passado turbulento em matéria laboral.

“A resiliência do mercado de trabalho foi um aspeto determinante para ultrapassarmos o impacto da Covid-19. Contudo, temos hoje sinais de que a travagem da economia que estamos a sofrer, desde o início da guerra na Ucrânia, se está a refletir no emprego. (…) Não se trata apenas de um arrefecimento na contratação, temos já uma perda efetiva de postos de trabalho. Se a tendência persistir, o desemprego voltará a ser um problema sério”, dramatiza António Saraiva, presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal.

Depois de o país ter atingido um máximo histórico no emprego e um valor mínimo no desemprego, desde fevereiro foram perdidos, em termos líquidos, 28 mil empregos, 20 mil dos quais em novembro e dezembro. O número de desempregados aumentou em mais de 45 mil – e 31 mil deles nos dois últimos meses de 2022. Indicadores que levam o chamado “patrão dos patrões”, que em abril deve ser substituído por Armindo Monteiro, a redobrar os alertas deixados na última carta enviada aos empresários portugueses.

Embora ressalve que ainda é cedo para perceber a sustentação desta tendência, também Luís Miguel Ribeiro, presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP) reconhece que “não será de negligenciar que as empresas têm sofrido choques sucessivos nos últimos anos – prejuízos da pandemia, mais agravamento de custos com a guerra, em particular os relativos à energia, a que se soma agora o agravamento dos juros –, com potencial impacto no mercado de trabalho, sobretudo nas empresas mais frágeis”.

Há sinais, por parte das empresas, de um arrefecimento na contratação, que pode fazer subir o número de desempregados no país? “A incerteza é elevada relativamente à evolução da economia em 2023. Um contexto internacional adverso e um mercado interno em retração, face à perda do poder de compra, são sempre sinais muito preocupantes para as empresas”, responde o dirigente da associação empresarial sediada em Leça da Palmeira, no concelho de Matosinhos.

A política monetária mais restritiva, com consequente subida da taxa de juro e dificuldades de acesso ao crédito, a desaceleração económica dos principais parceiros comerciais e o abrandamento do PIB terão de ter efeito e influência na taxa de desemprego.

José Eduardo Carvalho

Presidente da Associação Industrial Portuguesa (AIP)

“A política monetária mais restritiva, com a consequente subida da taxa de juro e dificuldades de acesso ao crédito; a desaceleração económica dos principais parceiros comerciais; e o abrandamento do crescimento do PIB terão de ter efeito e influência na taxa de desemprego”, corrobora o líder da lisboeta AIP – Associação Industrial Portuguesa. José Eduardo Carvalho cita os “números preocupantes” de um estudo recente, que estimava que 13% das empresas nacionais, o equivalente a 63 mil sociedades comerciais que entregam IES, esperam ter “grandes dificuldades para enfrentar uma conjuntura económica adversa”.

Menos vagas nos centros de emprego

As estimativas divulgadas na terça-feira pelo INE são ajustadas de sazonalidade, isto é, descontam o habitual aumento do desemprego durante o inverno. Já os dados administrativos do IEFP, divulgados na semana passada, mostravam que, entre as 307.005 pessoas registadas nos centros de emprego no final do ano passado, 55% eram mulheres e 60% estavam sem emprego há menos de um ano (o peso relativo aumentou dez pontos percentuais face a dezembro de 2021). Mais de metade só estudou até ao 9º ano ou não tem nenhum nível de instrução.

Por outro lado, as ofertas de emprego nos serviços do IEFP espalhados pelo país estão a encolher. No final de dezembro havia 11.431 vagas por satisfazer, uma diminuição anual (-4.510; -28,3%) e face ao mês anterior (-4 503; -28,3%) das ofertas em ficheiro, concentradas na região de Lisboa e Vale do Tejo (45% do total).

Também as 5.506 colocações realizadas no último mês do ano – mais de quatro em cada dez no Norte do país – significaram uma quebra de 14% em relação a novembro e de 12,2% face ao mesmo mês do ano anterior.

Mais. Além de terem ficado menos vagas por preencher e de terem sido feitas menos colocações, o IEFP está nesta altura também a receber menos ofertas de emprego. No mês em análise surgiram “apenas” 6.786 novas oportunidades para os desempregados, 22,5% abaixo do registo de novembro e 25,2% inferior ao do mês homólogo de 2021. O número de ofertas recebidas caiu pelo terceiro mês consecutivo. E nos últimos sete meses em análise, desde maio, só num deles (setembro) é que aumentaram.

Muitos mercados de trabalho, “conforme profissões, setores e regiões”

Este cenário de degradação no mercado de trabalho começa a acentuar-se numa fase em que muitas indústrias, da construção ao turismo, mantêm as reclamações sobre a escassez de mão-de-obra. Sobretudo a qualificada, mas também, em vários setores, a indiferenciada no que toca às qualificações.

Luís Miguel Ribeiro, líder da AEP, contextualiza que “não há um mercado de trabalho, mas muitos, conforme as profissões, os setores e as regiões” e mostra-se apreensivo quanto ao “elevado desajustamento entre as necessidades das empresas e os perfis de competências disponíveis no mercado”.

Luis Miguel Ribeiro, presidente da AEP, em entrevista ao ECO - 13SET22
Luís Miguel Ribeiro, presidente da AEPRicardo Castelo/ECO

José Eduardo Carvalho (AIP) descreve igualmente a carência de mão-de-obra como “um dos fatores que neste momento condiciona a atividade empresarial, mas que não é fácil de resolver”, aconselhando o Ministério do Trabalho e dos Negócios Estrangeiros a envolverem-se neste processo e a “manifestar uma atitude colaborante”. “Aliás, o Governo, as empresas e as associações empresariais deviam já estar, em conjunto, a definir planos e medidas para mitigar os efeitos deste problema”, acrescenta o mesmo responsável.

António Saraiva sabe que muitas empresas se confrontam ainda com falta de mão-de-obra adequada às suas necessidades e, “evidentemente, que a solução não será deixar que a deterioração da atividade económica se agrave e se estenda ao mercado do trabalho”.

Nem, ressalva o presidente da CIP, nas alterações à legislação laboral que estão a ser preparadas no Parlamento e que, “em vez de melhorarem o enquadramento da atividade, irão dificultar a gestão das empresas e penalizar a sua competitividade”. Aproximar a oferta e a procura no mercado de trabalho, conclui, passa pelo incentivo à formação e requalificação dos recursos humanos para “dar resposta célere e com qualidade às novas necessidades de competências”.

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