Exclusivo Mercado de carbono. Já há interessados em avançar este ano

“São intenções que depois terão de ser inscritas nas regras do mercado voluntário de carbono”, indicou o ministro.

Está lançada a discussão sobre o mercado voluntário de carbono português, através do qual o Governo pretende promover a compensação de emissões carbónicas ao mesmo tempo que se renova a floresta. E o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, já conta três entidades interessadas em avançar com projetos neste âmbito, ainda este ano.

“Uma das entidades [interessadas] estava refletida no debate. Há pelo menos mais duas entidades que nos identificaram projetos concretos. Estamos convencidos que alguns desses projetos vão arrancar já este ano”, indicou Duarte Cordeiro, à margem de uma conferência na qual foi apresentado o plano para estes mercados, e que incluiu um debate no qual participaram representantes de entidades como as corticeiras, a cimenteira Secil ou o fundo LAND (Life and Nature Development). “São intenções que depois terão de ser inscritas nas regras do mercado voluntário de carbono”, completou.

O diploma que lança um mercado voluntário de carbono em Portugal está em consulta pública, até ao dia 10 de abril. Nele, encontram-se as bases para iniciar este mercado em que o país pretende ser pioneiro. “O que o Governo pretende fazer é criar uma regulação que crie confiança. Que nos dê a certeza que os projetos florestais que capturam carbono são credíveis e que quem quer comprar esses créditos, que resultam da captura [de carbono pela floresta], têm um certificado que permite garantir a credibilidade”, explicou o ministro.

Ao permitir que as empresas comprem estes créditos, que são gerados pelo investimento na floresta que captura o carbono, e com eles compensarem as próprias emissões, cria-se também “um rendimento económico ao produtor florestal”. Este rendimento resultará do entendimento entre os privados, e tem o benefício de ser de curto-prazo, o que ajuda a contrabalançar a realidade de muitos projetos florestais, que só têm rendimento após uma ou duas décadas, indicou ainda o ministro. “Acho que vão haver oportunidades para todos, pequenos e grandes proprietários. Queremos combater o abandono de todas as terras que não têm culturas produtivas e por isso são um risco de incêndio”, concluiu.

Alguns dos projetos que já estão na calha, de entidades que vão entrar neste mercado, estender-se-ão por um universo de 100 mil hectares. O ministro diz-se “feliz” se do mercado voluntário de carbono resultasse a intervenção em meio milhão de hectares da floresta portuguesa. “Mas tudo o que consigamos mobilizar por esta via já é positivo”, finalizou.

O novo mercado

Um mercado de carbono consiste na criação de créditos ou licenças que são pagos pelas empresas de forma a compensar as respetivas emissões poluentes. Ao comprar as licenças, no caso de um mercado voluntário, as empresas em causa estão no fundo a financiar projetos de captura de carbono ou de mitigação, que anulem o efeito nocivo das emissões de que são responsáveis, ou pelo menos parte dele. Ou, avança também o diploma, as empresas podem financiar estes projetos apenas como contribuição a favor da ação climática, sem terem de servir para a compensação das suas emissões.

O Governo quer dar prioridade a projetos de sequestro de carbono com soluções de base natural, nomeadamente florestação e reflorestação.

Um crédito de carbono corresponderá a uma tonelada de carbono equivalente, que seja reduzida ou sequestrada. Serão gerados após a validação e verificação por entidades independentes e qualificadas para tal. São ainda transacionáveis e rastreáveis, através de uma plataforma, e válidos por tempo indeterminado. E há uma distinção para os créditos que tenham associados benefícios ao nível da biodiversidade, que seão identificados como “créditos de carbono +”. Os créditos podem ser gerados antes do sequestro (créditos de carbono futuros) ou após algum sequestro (créditos de carbono verificados).

Da responsabilidade das autoridades nacionais está a regulação do mercado, o desenvolvimento e gestão da plataforma de registo e o acompanhamento e desenvolvimento do mercado. Mas os projetos serão desenvolvidos por promotores, que farão a sua monitorização e reporte. Farão ainda parte os organismos de certificação e, finalmente, os utilizadores, que investem na compensação de emissões.

Muito por afinar

Durante a manhã, os vários intervenientes no debate foram chamando, contudo, a atenção para questões em torno do mercado de carbono que têm de ser resolvidas para que este seja uma solução efetiva para a descarbonização.

Uma palavra que foi repetida até à exaustão foi “credibilidade”. O presidente da Associação Portuguesa do Ambiente (APA), Nuno Lacasta, indicou que “é central garantir que as emissões que são objeto de compensação não são objeto de duplicação ou triplicação do financiamento”, acumulando com apoios públicos, por exemplo. Outra situação a evitar será “gerar um crédito de carbono de uma floresta que dois anos depois arde. Não pode ser”.

Mais tarde, Pedro Martins Barata, da Carbon Credit Quality Initiative, apontou que é necessário reforçar a credibilidade do lado da procura – que as empresas que querem usar estes créditos devem ter compromissos credíveis e realistas – e também da oferta, evitando-se “problemas graves de sobrequantificaçao de benefícios ambientais”.

Espera-se que o mercado voluntário para compensação seja um complemento, e não um substituto, em relação à redução de emissões de carbono. Portugal tem de assegurar o sequestro de entre 10 a 13 milhões de toneladas de emissões até 2050, para conseguir corresponde às metas de neutralidade carbónica com as quais se comprometeu.

A “adicionalidade” das soluções também foi amplamente debatida. Francisco Ferreira defendeu que tem de se assegurar que os projetos de sequestro representam um esforço adicional relativamente ao que já existe, e não considerar uma parcela de floresta já existente e, investindo algum montante na mesma, alegar que se estão a compensar emissões. Para compensar, é necessário plantar mais floresta, disse.

Angela Lucas, do fundo LAND, sublinhou contudo que os esforços de manutenção da floresta são importantes e que há que assegurar que não se torna economicamente mais vantajoso, no limite, “deitar abaixo e replantar”.

Por fim, a desejável sintonia com a legislação que está a ser preparada, no mesmo âmbito, a nível europeu, foi um ponto que mereceu concordância de todas as partes.

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