O que levou ao maior colapso de um banco americano desde a crise de 2008
Corrida aos depósitos levou ao colapso do Silicon Valley Bank. Revisão em baixa da classificação da dívida pela Moody's precipitou acontecimentos.
A meio da semana passada, o SVB Financial Group recebeu uma chamada da Moody’s Investors Service a dar conta de que a agência se preparava para baixar a classificação da dívida do banco, relata a Reuters. Foi o início do processo que levaria ao maior colapso de um banco deste a crise financeira de 2008.
A subida dos juros promovida pela Reserva Federal está a provocar uma queda no preço das obrigações, que se movimentam em sentido contrário às taxas. Uma tendência que se ampliou na terça-feira, quando o presidente do banco central veio admitir a possibilidade de voltar a acelerar a subida dos juros para travar a inflação. Depois das declarações, a taxa dos títulos do Tesouro americano a dois anos superaram os 5% pela primeira vez desde 2007.
A queda do valor das obrigações, onde o SVB tinha parte da sua tesouraria, levou a Moody’s a ligar aos executivos do banco. A agência de rating ia avançar com a revisão em baixa do rating. Preocupados que a decisão da agência abalasse a confiança dos investidores e dos clientes, contactaram o Goldman Sachs para encontrar uma saída, relata a Reuters.
O plano desenhado passava por vender obrigações com rentabilidades baixas, trocando-os por outros com juros mais elevados. Só que a venda de 21 mil milhões de dólares em ativos gerava uma perda de 1,8 mil milhões, que tinha de ser coberta com um aumento de capital. Para isso, o SVB avançaria com a venda de 2,25 mil milhões de dólares em novas ações, dos quais 500 milhões seriam comprados pela capital de risco General Atlantic.
Na quarta-feira, a venda da carteira de obrigações avançou e a Moody’s baixou a classificação do banco em um nível. Idealmente o aumento de capital seria concluído antes da reabertura do mercado na quinta-feira, mas o tempo para montar a operação era demasiado curto. O valor das ações afundou 60% nesse dia.
Em vez de sossegar os investidores e clientes, o plano assustou-os. Começaram a surgir notícias de que os fundos de capital de risco (venture capital) estavam a pedir às startups que levantassem o dinheiro que tinham no SVB, receando o encerramento do banco. A CNBC relata que gestoras como a norte-americana Pear VC ou a inglesa Hoxton Ventures endereçaram o apelo às empresas na sua carteira de investimentos, juntando-se a grandes players do setor como o Union Square Ventures e o Founders Fund. O que mostra a importância que a instituição financeira, criada no início da década de 80, tinha no meio. Aquele último fundo, gerido por um dos mais importantes investidores de Silicon Valley, Peter Thiel, tirou todo o dinheiro antes de o banco ser encerrado, segundo a Bloomberg.
A General Atlantic e outros investidores desistiram de investir no aumento de capital. A corrida aos depósitos precipitou a intervenção dos reguladores da Califórnia, que determinaram o encerramento do SVB, que passou a estar sob controlo da Federal Deposit Insurance Corporation, a agência que garante a segurança dos depósitos.
O banco liderado por Greg Becker era o 16.º maior dos EUA em valor dos ativos: 209 mil milhões de dólares, no final de 2022. Tinha 175,4 mil milhões de dólares em depósitos. O colapso ecoou através dos mercados acionistas globais, provocando perdas generalizadas nas bolsas, com o setor financeiro a ser o mais penalizado. Na Ásia, o índice japonês Nikkei 225 tombou 1,67% e em Hong Kong o Hang Seng perdeu 3%. O dia foi também de perdas na Europa, com o índice Stoxx 600 a cair 1,35%. Em Wall Street, o S&P500 tombou 1,45% e o Nasdaq 1,76%.
Janet Yellen garante que setor está resiliente
A notícia avivou os receios de que o aperto monetário que a Reserva Federal tem em curso para travar a inflação provoque uma deterioração das condições financeiras da banca, pondo em causa outras instituições. O site MarketWatch identifica este sábado uma lista de 20 bancos com maior risco de incorrerem em perdas não contabilizadas, como os 1,8 mil milhões que o SVB teve de assumir.
A secretária de Estado do Tesouro, Janet Yellen, reuniu com reguladores do setor na sexta-feira, emitindo depois um comunicado a afirma que “o sistema bancário continua resiliente e que os reguladores têm ferramentas eficazes para lidar com este tipo de situação”. As exigências de capital são mais elevadas do que na crise de 2008 e os bancos são alvo de testes de stress regulares. Antes, na Câmara de Representantes, afirmara que o Tesouro estava a monitorizar um conjunto pequeno bancos.
Além do SVB, também o Silvergate, um banco focado em criptomoedas, anunciou a liquidação na sexta-feira, devido ao levantamento massivo do dinheiro pelos clientes. As ondas de choque da queda do banco de Silicon Valley atingiram este sábado a USD Coin, uma criptomoeda indexada ao dólar (stablecoin), que tinha 3,3 mil milhões de dólares no SVB. A moeda digital, que é suposto valer sempre um dólar, chegou a cotar abaixo dos 87 cêntimos, recuperando depois para os 95 cêntimos.
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