Bruxelas admite divergências mas espera lei de trabalho nas plataformas até final do ano
"Não é porque a UE está a preparar uma diretiva que os Estados-membros não podem adotar medidas nacionais", diz Nicolas Schmit sobre leis nacionais para regular trabalho das plataformas digitais.
O comissário europeu do Emprego admite divergências na União Europeia sobre o estatuto dos trabalhadores das plataformas digitais, como motoristas da Uber ou estafetas da Glovo, mas espera a nova lei comunitária em vigor até final do ano.
Em entrevista à agência Lusa em Bruxelas, o comissário europeu do Emprego e Direitos Sociais, Nicolas Schmit, explica que “a questão principal é, obviamente, sobre o estatuto daqueles que estão a fazer o trabalho, porque muitos dos que fazem este trabalho são considerados freelancers e autónomos e, embora não o sejam, […] não obtêm qualquer verdadeiro direito social”.
“Pode haver também freelancers ou trabalhadores independentes neste negócio, mas depois têm de ser verdadeiros trabalhadores independentes e […] não seguir o que a plataforma diz sobre como se comportam e por aí em diante e, portanto, este é o problema que temos de resolver até ao final deste ano”, acrescenta o responsável.
Para Nicolas Schmit, ter a legislação europeia em vigor até ao final de 2023 seria “o melhor cenário”, embora o responsável ressalve que “o calendário é o fim do [mandato do] Parlamento Europeu”, dadas as eleições europeias em maio de 2024.
Em causa está a proposta da Comissão Europeia, apresentada há dois anos, para uma legislação comunitária sobre direitos dos trabalhadores, que está desde então a ser negociada pelo Parlamento Europeu e Conselho (Estados-membros). Uma vez adotada, os Estados-membros terão mais dois anos para a transpor para a respetiva legislação nacional.
A expectativa do comissário europeu da tutela é que os Estados-membros cheguem a uma “orientação geral em junho”, para depois aí se intensificarem as negociações com os eurodeputados.
Questionado sobre as iniciativas de países como Portugal, para regular a situação dos trabalhadores destas plataformas digitais, Nicolas Schmit aponta que “não é porque a UE está a preparar uma diretiva que os Estados-membros não podem adotar medidas nacionais”.
“Encorajo-os a fazê-lo”, embora depois “tenha de se ver até que ponto as medidas nacionais são compatíveis com a diretiva europeia”, adianta à Lusa.
Em Portugal, no âmbito da Agenda do Trabalho Digno, proposta pelo Governo e promulgada pelo Presidente da República em março passado, prevê-se, no caso das plataformas digitais, a presunção de laboralidade entre o trabalhador e a plataforma, que à partida será feita diretamente com as empresas, como a Uber, a Bolt ou a Glovo, e não com intermediários, embora deixando para os tribunais a decisão final sobre a vinculação.
A nova legislação portuguesa determina que os trabalhadores das plataformas digitais são considerados trabalhadores por conta de outrem, tendo direitos como qualquer trabalhador.
Paralelamente, em dezembro de 2021, a Comissão Europeia apresentou uma série de propostas para melhorar as condições dos trabalhadores das plataformas digitais, visando que milhões de europeus possam beneficiar de direitos laborais e benefícios sociais que atualmente não lhes são reconhecidos.
Estima-se que existam mais de 28 milhões de cidadãos na União Europeia a trabalhar em plataformas digitais em diferentes setores, número que equivale ao dos trabalhadores da indústria transformadora (29 milhões) e que poderá atingir os 43 milhões em 2025.
A grande maioria destes trabalhadores são independentes, mas pelo menos 5,5 milhões têm erradamente este estatuto, situação que o executivo comunitário quer inverter, combatendo o falso trabalho por conta própria para que estes trabalhadores, entre os quais motoristas e estafetas, tenham proteção laboral.
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