“Agressividade” da decisão do 5G é “superior” à de outros mercados, considera Alexandre Fonseca
Deliberação do Estado expulsa empresas como a chinesa Huawei das redes 5G. Co-CEO do grupo Altice diz que é "evidente" que Portugal está a ser mais agressivo do que outros países europeus.
A recente deliberação que impede as operadoras portuguesas de usarem tecnologia chinesa nas redes 5G está a ser analisada pela Altice Portugal, mas o co-CEO do grupo Altice a nível internacional já tirou uma primeira conclusão: “parece” ser mais agressiva do que a de outros países europeus.
“Aquilo que posso dizer é que, de uma primeira leitura, me ressalta evidente que o nível de agressividade desta medida é superior àquilo que me parece – volto a dizer, parece – ser noutros mercados”, afirmou Alexandre Fonseca, à margem da cerimónia do sétimo aniversário da Altice Labs em Aveiro.
No entanto, o antigo líder da unidade portuguesa da Altice rejeitou ir mais além do que isto. “Não tenho os dados. Tenho a minha leitura, mas é uma leitura que eu vou guardar até que a equipa portuguesa faça a respetiva análise, para fazer essa análise comparativa”, disse.
Segundo o gestor português, “é um tema muito recente” que “a equipa portuguesa está a analisar”. “A equipa portuguesa irá fazer a sua análise em termos financeiros, operacionais, técnicos, jurídicos e regulatórios. Irá submeter ao grupo para nós analisarmos, em conjunto, quais serão os impactos e as medidas que teremos de tomar”, ressalvou, acrescentando que, “até lá, ao nível do grupo”, não serão feitos mais comentários.
Ainda assim, admitiu: “Obviamente que tudo o que possa ter impacto nas operações dos nossos países [enquanto grupo Altice] nos preocupa. Mas não queria estar a falar sobre um tema que ainda está única e exclusivamente na esfera nacional.”
De seguida, novamente sobre este tema, Alexandre Fonseca citou a política que foi seguida em França ao nível das orientações europeias para a segurança das redes 5G, nas quais se insere a decisão tomada na semana passada em Portugal: “Em França estamos em plena fase de substituição, mas França selecionou as oito maiores cidades francesas [para aplicar restrições] e alguns pontos estratégicos do ponto de vista militar ou de infraestruturas críticas. E, nesses pontos, foi um processo negocial.”
“O que me parece muito razoável, que aconteceu em França, foi o diálogo. O Estado e os operadores negociaram, discutiram e chegaram a alguns consensos e ausência de outros. Mas houve essa discussão. Em Portugal, vai depender da fase de análise”, concluiu.
Na mesma cerimónia em Aveiro, a atual CEO da Altice Portugal, Ana Figueiredo, também citou o caso francês e considerou que a deliberação portuguesa é “bastante abrangente” e afirmou que a empresa está em “fase de entendimento” para perceber quais as reais implicações da medida. A Altice Portugal usa equipamentos de fornecedores chineses nas partes periféricas da sua rede 5G.
“Neste momento, o que procuramos é entender e, obviamente, analisar. Estamos a analisar e tomaremos as decisões estratégicas e operacionais que acharmos mais convenientes. Adicionalmente, a Altice Portugal vai cumprir com todos os requisitos legais que forem impostos”, afirmou a gestora. Ainda não há estimativa de quanto poderá custar a substituição dos equipamentos considerados de alto risco.
Na semana passada, a Comissão de Avaliação de Segurança, inserida no Conselho Superior de Segurança do Ciberespaço, deliberou excluir das redes 5G em Portugal equipamentos ou serviços de fornecedores ou prestadores considerados de “alto risco”. Para este efeito, define critérios, incluindo todos aqueles que estejam sedeados fora da União Europeia, da NATO ou da OCDE.
A decisão abrange as partes core e não-core das redes de quinta geração e vai levar a que as operadoras tenham de substituir todos os equipamentos de marcas como a Huawei. O ECO noticiou esta quinta-feira que o prazo será de até cinco anos.
Regulação europeia em silos “não faz sentido”
Enquanto CEO da Altice Portugal, cargo que desempenhou até abril de 2022, Alexandre Fonseca foi o gestor que mais criticou publicamente a regulação da atual administração da Anacom, liderada por João Cadete de Matos, sobretudo durante o processo do leilão de frequência do 5G. O mandato de Cadete de Matos termina em meados de agosto.
Questionado sobre o que espera do futuro da regulação em Portugal, o gestor retorquiu que “a regulação europeia tem de se aproximar de uma regulação muito mais dialogante, muito mais eficiente e, acima de tudo, muito mais conhecedora e próxima do mercado”.
Mais ainda, o atual co-CEO do grupo Altice a nível internacional disse entender que é necessário a União Europeia se assumir “de uma vez por todas com uma regulação única”. “Não podemos continuar a gerir a Europa como pequenas quintas ou pequenos silos, totalmente independentes, porque isso tem um impacto em operadores como nós, que são operadores multinacionais”, disse o gestor português.
“Tenho de olhar hoje para a regulação em Portugal, que é diferente da regulação em França, que é diferente da regulação em Israel, e isto não faz sentido. Se queremos usar a Europa como bloco económico e social único, a regulação – e aí, diga-se, a lei da concorrência – tem de ser vista numa perspetiva integrada”, atirou.
Alexandre Fonseca sem ambições políticas
Sobretudo desde que deixou a liderança da Altice Portugal, Alexandre Fonseca tem apresentado propostas de reformas que entende serem necessárias fazer no país. Ainda esta quinta-feira, num discurso no aniversário da Altice Labs, criticou a tomada de “decisões erráticas” que “inibem” o investimento, bem como a decisão de acabar com as Parcerias Público-Privadas (PPP) na Saúde, e disse que o atual Código do Trabalho “não funciona”.
Esta quinta-feira, à margem do evento, o ECO perguntou a Alexandre Fonseca se tem ambições políticas. A resposta é “não”.
“Gosto muito de política. Sempre acompanhei desde muito jovem a política. Respeito muito quem dedica a sua vida à causa pública, porque em Portugal, de facto, ser político também não é fácil, seja qual for o quadrante ideológico. E respeito muito os políticos. Mas sou gestor. Gosto muito daquilo que faço e é esse o caminho em que quero continuar”, detalhou.
Ainda assim, e instado a explicar sobre a que “decisões erráticas” se referia no discurso, Alexandre Fonseca insistiu nas mudanças que considera que seriam benéficas para Portugal.
“Quando olho para Portugal, aquilo que vejo, e tenho pena enquanto português, é que a rentabilidade dos capitais que colocamos é inferior às outras operações do grupo. Ou seja, se quisermos de forma muito simples para que toda a gente perceba, por cada euro que eu invisto em Portugal, a rentabilidade que eu tiro desse euro é mais baixa do que em França, EUA, Israel. É isso que o acionista do grupo tem de estar preocupado. E essa rentabilidade não é por culpa da equipa de gestão portuguesa. É porque existem condições estruturais que não o permitem”, disse.
Depois, foi mais além: “As decisões que não têm sido tomadas por exemplo na área laboral e na área fiscal penalizam as empresas. Eu defendo uma maior flexibilidade no mercado de trabalho. E não estamos a falar de salários mais baixos, isso é demagogia. Estamos a falar de criar mecanismos que incentivem a flexibilidade do mercado de trabalho, a meritocracia e premiar o desempenho de quem trabalha e de quem é produtivo. São estas as transformações de que o mercado necessita.”
Por fim, o gestor voltou a apelar a “transformações fiscais”. “Não podemos dar-nos ao luxo, de forma direta ou indireta – não podemos só contar com impostos diretos, temos de contar com os indiretos – de ter uma das cargas fiscais mais altas da Europa.”
(Notícia atualizada pela última vez às 16h31)
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
“Agressividade” da decisão do 5G é “superior” à de outros mercados, considera Alexandre Fonseca
{{ noCommentsLabel }}