Em cinco meses, pré-avisos de greve já representam 70% do total do ano passado. Luta “vai continuar”, diz CGTP
O ambiente de contestação social tem vindo a crescer, sendo que até maio foram entregues mais de 750 pré-avisos de greve. Entretanto, só no setor público já se registaram mais 100 até junho.
A contestação social tem vindo a aumentar este ano, sendo que até maio foram entregues mais de 750 pré-avisos de greve. Quer isto dizer que em apenas cinco meses houve o correspondente a 70% do total de convocatórias de greve no ano de 2022, de acordo com os dados da Direção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT). A este número ainda vão acrescer mais de 100 pré-avisos no mês seguinte, apenas do lado público. CGTP avisa que “vai continuar a luta”, enquanto UGT destaca importância da negociação coletiva e está de olho no Orçamento do Estado.
Têm-se registado greves em setores como a educação (professores e não docentes), saúde (médicos e enfermeiros), transportes (com greves da CP mas também nos aeroportos, como na Portway), funcionários judiciais e também em empresas como a Matutano e a Nobre.
“O que está a acontecer é o que já tem vindo a acontecer e acentuar-se já há muito tempo: com a brutal degradação das condições de vida, com o aumento do custo de vida e continuação de opções que nos prendem à precariedade, desinvestimento nos serviços públicos, trabalhadores, reformados e pensionistas a sentir que as condições de vida estão a piorar, dificuldades a aumentar, injustiças e desigualdades, é natural a intensificação da ação reivindicativa e a organização e mobilização dos trabalhadores em todos os setores, privado e público“, nota ao ECO a secretária-geral da CGTP, Isabel Camarinha.
Do lado da UGT, o secretário executivo Carlos Alves aponta ao ECO que “há fatores diversos que podem justificar aumento da conflitualidade”, sendo que em alguns setores como a educação há “questões por resolver”. Existem também “fatores externos como estratégias sindicais”, diz, sem se comprometer em análises a estas questões.
Os dados da DGERT já disponíveis, até maio, mostram que foram entregues, no total do ano, 752 pré-avisos, quase o dobro face ao mesmo período do ano passado, quando foram apenas 452. Comparando com o total do ano de 2022, os pré-avisos entregues em cinco meses correspondem a mais de dois terços do total do ano passado.
Foram mais as greves anunciadas fora do Setor Empresarial do Estado, até maio, ainda que a diferença entre os dois setores tenha sido menor do que no ano passado.
Olhando apenas para abril, 70% dos avisos prévios de greve foram na Administração Pública e Defesa e Segurança Social Obrigatória. Seguiu-se o setor das atividades de saúde humana e apoio social, com 7%. Já em maio, continua a estar a Administração Pública no topo, mas surgem em segundo lugar os transportes e armazenagem, numa altura marcada por greves na CP e também no Metropolitano de Lisboa, ainda que esta última tenha sido desconvocada.
Existem ainda alguns dados disponíveis mais atualizados na DGAEP, ainda que digam apenas respeito ao Estado. Nessa página, é possível verificar cerca de 560 pré-avisos de greve em 2023, dos quais 221 em maio e junho e sete em julho. Quer isto dizer que aos 752 entregues até maio ainda é necessário acrescentar, do lado do setor público, mais de 100 novas convocatórias.
A maioria diz respeito a greves no setor da educação, sendo que várias estruturas sindicalistas representativas dos docentes têm avançado para paralisações e manifestações nos últimos tempos, inclusivamente às avaliações. Além disso, também tem sido um “verão quente” no que diz respeito às greves na saúde, particularmente entre os sindicatos dos médicos, que têm demonstrado desagrado pelo processo negocial que se tem desenrolado com o Governo.
Há já greves anunciadas para este mês e a CGTP antecipa também que a contestação não vai parar, mesmo no verão. “Vamos continuar a luta, continuando a ação de exigência e reivindicação”, nota Isabel Camarinha, ao ECO. “É um caminho que vamos continuar a prosseguir, nos meses de verão há muitos setores onde as empresas fecham mas vai continuar a existir muita luta porque os trabalhadores não baixam os braços”, assegura a sindicalista.
Após o período de férias, está já marcada uma ação nacional de defesa do SNS para setembro, bem como outra ação nacional no dia 16 desse mês cujos contornos serão definidos mais à frente, antecipa.
Apesar destas exigências, a secretária-geral da CGTP destaca também que já foram obtidos alguns resultados com a luta, como “aumentos salariais de 100 euros e alteração de vínculo, melhoria de condições de trabalho num conjunto de empresas”.
Já a UGT salienta que estão “a notar, em virtude do acordo assinado o ano passado, algum impulso à negociação coletiva, no privado e público”, além de terem existido “aumentos salariais”. “Os resultados do acordo sentem-se nos valores dos salários, gostávamos que fosse mais longe, mas os valores negociados estão em linha com as perspetivas do acordo”, admite, ao ECO, o secretário executivo da UGT.
Carlos Alves sinaliza também que no secretariado nacional, na semana passada, “não deixou de dar recados para alguns setores, nomeadamente a importância de algumas negociações para o privado”, mas também “apontar para a necessidade do setor da banca estar aberto à negociação com valores mais em linha com o acordo”. Deixa ainda o “recado ao Estado empregador no sentido de em setores como a educação não deixar alongar a instabilidade”.
Existem ainda questões relativas ao Orçamento do Estado, apesar da política reivindicativa apenas ser apresentada em setembro. “Há questões que levantamos já, sendo que o acordo assinado em 2022 tem efeitos plurianuais”, pelo que no documento apresentado pelas Finanças tem de se “efetivar o acordo”, nomeadamente no que diz respeito ao aumento do salário mínimo, a revisão das taxas de IRS e benefícios fiscais.
Considerações que surgem quando o ano já vai a meio e as greves continuam, sendo que um dos dias de destaque na contestação foi 28 de junho, quando a CGTP promoveu um dia de ação nacional de luta com centenas de greves, manifestações, concentrações e plenários em todo o país para reivindicar aumentos salariais, tanto no público como no privado. Isabel Camarinha faz um “balanço de que houve muitos milhares de trabalhadores em luta no 28 de junho a exigir a resposta necessária e também para o desenvolvimento do país, que não se desenvolve se mantivermos este rumo”, nomeadamente de “desigualdade e injustiça”.
É também de salientar a contestação entre os funcionários judiciais, cujas greves já causaram mais adiamentos de atos processuais e diligências do que no período da pandemia.
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