PCP quer investigação sobre prestação de serviços da TAP à Atlantic Gateway
Neeleman e Pedrosa receberam o salário de administradores da TAP através de uma prestação de serviços. PCP quer incluir envio da informação para o Ministério Público no relatório da CPI.
O PCP apresentou uma proposta de informação para o Ministério Público sobre a existência de salários de ex-administradores da TAP pagos através de contratos de prestação de serviços, no âmbito das alterações que o partido quer ver incluídas no relatório final da comissão parlamentar de inquérito (CPI). Em causa estão as remunerações pagas a David Neeleman, Humberto Pedrosa e David Pedrosa.
“Apresentamos uma proposta de Informação a remeter para o Ministério Público, dando conta que a Comissão de Inquérito encontrou evidência de que um conjunto de administradores da TAP, durante os anos de 2017, 2018 e 2019, tinham os seus salários pagos através de uma prestação de serviços paga à Atlantic Gateway em vez de receberem os mesmos através da TAP, fazendo com que a TAP fugisse ao pagamento da taxa de 23% para a Segurança Social, e que os mesmos fugissem ao pagamento da taxa de 11% para a Segurança Social“, afirmou Bruno Dias, o coordenador pelo PCP na CPI à TAP, durante uma conferência de imprensa realizada esta segunda-feira no Parlamento.
A Atlantic Gateway, o acionista privado que comprou 61% da TAP em 2015, recebeu verbas da TAP no âmbito de um contrato de prestação de serviços, que na prática servia para pagar a alguns administradores, como avançou o ECO em primeira mão.
Bruno Dias apontou o que considera serem os vários elementos recolhidos pela CPI:
- A informação da Segurança Social que Humberto Pedrosa, David Pedrosa e David Neeleman não têm quaisquer salários da TAP declarado junto da Segurança Social;
- A informação da Segurança Social de que em 2020 a TAP já declarou, dos dois primeiros, os respetivos salários à segurança social;
- As decisões da Comissão de Vencimentos determinando o valor dos salários para 2017, 2018, 2019 e 2020;
- O contrato de prestação de serviços assinado com David Pedrosa, tanto pela TAP como pela Gateway, pelo qual será pago pela TAP um total de 4,3 milhões de euros à Atlantic Gateway;
- A notícia do ECO de 23 de fevereiro de 2023, que inclui declarações de Humberto Pedrosa como as seguintes: «O que é normal é ter salário. Ali optou-se por ser através de um débito por prestação de serviços da Atlantic Gateway, penso que por ser mais favorável para a TAP».
Outro tema focado por Bruno Dias foram os Fundos Airbus, usados por David Neeleman para capitalizar a TAP na privatização de 2015. O PCP defende uma redação alternativa em que se diga que “a operação lesou economicamente a TAP, gerando benefícios injustificados a David Neeleman e exigindo a devida avaliação em sede criminal face às legítimas suspeitas que hoje suscita“.
Defende também a responsabilização de Pedro Marques, a antigo ministro das Infraestruturas. “Propomos que na conclusão sobre esta matéria se acrescente que o Governo PS, nomeadamente o ex-ministro Pedro Marques, admitiu ter sabido dos Fundos Airbus em fevereiro de 2016, mas não deu conhecimento dessa informação ao restante governo, ao seu sucessor na pasta das Infraestruturas e ao Tribunal de Contas, no contraditório à Auditoria publicada em 2018″.
Outro alvo é o negócio da Manutenção e Engenharia Brasil, comprada em 2006 e que deixou um buraco nas contas da transportadora. “Impõe-se por isso uma rigorosa investigação às causas deste negócio, às razões por que se tardou tantos anos a acabar com ele, e quem ganhou os mil milhões de euros que a TAP perdeu com a ME Brasil”, defendeu. “Entretanto, há documentos e informações solicitados pela CPI que nunca foram respondidos pela TAP e podem ajudar a perceber melhor este processo”, acrescentou.
O PCP voltou a aproveitar o relatório para criticar o processo de reprivatização lançado pelo Governo. “Na CPI ficou evidente que as sucessivas tentativas de privatização tiveram consequências dramáticas para a TAP (…). A conclusão e recomendação que se coloca hoje como incontornável é a de que o Governo não persiga como único objetivo para a TAP a sua privatização, e comece a preocupar-se com ajudar a TAP a crescer e a cumprir as suas missões estratégicas: coesão nacional, ligação à diáspora, desenvolvimento económico, ligações de Portugal ao mundo”, disse Bruno Dias.
O partido apresentou 46 propostas de alteração ao relatório preliminar da CPI, com as quais o PCP pretende “resolver omissões graves, inverdades e falsidades que resultam da leitura do documento”. “Se as propostas do PCP forem todas aprovadas podem contar com o PCP para aprovar o relatório, mas há um longo caminho entre o atual e o que ele devia ser”, adiantou. “O nosso empenhamento é que o relatório seja bom. Neste momento o relatório é mau. Temos até quinta-feira para resolver esse problema”.
A deputada socialista Ana Paula Bernardo, relatora da comissão parlamentar de inquérito à TAP, apresentou na quarta-feira passada o relatório preliminar com as conclusões. O documento foi muito contestado pelos restantes partidos, por ilibar de responsabilidades antigos e atuais membros do Governo.
O PSD e a Iniciativa Liberal anunciaram no mesmo dia que iriam votar contra o documento e que não iriam apresentar propostas de alteração. O presidente dos social-democratas considerou o relatório “tendencioso” e “faccioso”, considerando que branqueia “toda a ação dos membros do Governo”. O partido vai apresentar amanhã à tarde um conjunto de conclusões próprias.
“Não participamos em farsas. Não faremos qualquer proposta de alteração”, anunciou também o líder da Iniciativa Liberal, Rui Rocha. “Este relatório foi escrito pelo Governo e enviado para o grupo parlamentar do PS ontem à noite”, afirmou André Ventura, do Chega. Já o PCP considerou o relatório preliminar “um texto desenvolvido para tentar justificar a privatização da TAP”, que o Governo já pôs em marcha.
A apresentação e discussão da versão final está agendada para dia 13. Segue-se a apreciação do documento no plenário da Assembleia da República, prevista para dia 19.
A comissão parlamentar de inquérito para “avaliar o exercício da tutela política da gestão da TAP” foi proposta pelo Bloco de Esquerda e aprovada pelo Parlamento no início de fevereiro com as abstenções de PS e PCP e o voto a favor dos restantes partidos. Nasceu da polémica sobre a indemnização paga a Alexandra Reis para deixar a administração executiva da TAP, mas abordou também a privatização de 2015, a recompra de parte do capital pelo Estado em 2017, a compra da participação de David Neeleman em 2020, o plano de reestruturação aprovado em 2021 ou a demissão da antiga CEO.
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