“Embuste”, “tentativa de esconder a verdade”, “falicioso”. Oposição ataca novo relatório da CPI
A oposição desferiu um forte ataque à segunda versão do relatório da CPI à TAP, enumerando várias omissões no documento. "Nada foi escondido. Nada foi branqueado", respondeu a relatora.
O debate sobre o relatório da comissão parlamentar de inquérito (CPI) à TAP está a ser marcado por duras “críticas, com a oposição a apontar as omissões do documento e a repetir as acusações de branqueamento e favorecimento do Governo. PSD e Iniciativa Liberal vão votar contra. Bloco de Esquerda e PCP também atacaram o trabalho da relatora, a deputada socialista Ana Paula Bernardo. PS arrisca-se a aprovar sozinho o relatório.
Pedro Filipe Soares foi o primeiro a falar e não poupou o documento apresentado pela relatora da CPI, Ana Paula Bernardo, dizendo que a cumprimenta pelo esforço feito mas não pelo conteúdo do documento. “Infelizmente este relatório não assume com as suas descrições e conclusões os resultados das audições. Há um conjunto alargadíssimo de audições que foram vistas por todo o país, em que os deputados passaram horas nelas, tivemos pessoas a vir a esta CPI vir prestar declarações, e no final destes trabalhos são omitidas essas declarações, omitidos esses trabalhos e riscados da memória futura”. “Como podemos chegar ao fim e dizer que há audições que não contam“, atirou.
O deputado do Bloco de Esquerda apontou como exemplos os acontecimentos no Ministério das Infraestrutruras, que não constam das conclusões, ou a reunião preparatória da ex-CEO com João Galamba e um deputado socialista antes de uma audição no Parlamento. “É incompreensível que a relatora apresente um relatório que é um embuste nesta vertente”, disse Pedro Filipe Soares. “O PS está a tentar limpar completamente a imagem do Governo com este relatório da CPI. Este relatório não serve para virar a página da má consciência do PS, serve para apurar factos”.
“Os acontecimentos no Ministério das Finanças não estão no relatório por não serem graves mas por se entenderem que têm sedes próprias onde devem ser apuradas responsabilidades e retiradas consequências politicas e legais”, afirmou
O PS está a tentar limpar completamente a imagem do Governo com este relatório da CPI. Este relatório não serve para virar a página da má consciência do PS, serve para apurar factos.
Bruno Dias, do PCP, criticou o relatório por “apontar para o caminho da privatização futura, enquanto se retrata e descreve com profundidade as consequências das privatizações passadas”, assinalando que a CPI permitiu fazer a “anatomia de um crime que foi a privatização da TAP”.
Para o deputado comunista, o documento faz um “branqueamento sobre as consequências para o futuro” de uma venda da companhia aérea e “está construído e orientado no sentido de justificar e defender uma privatização da TAP que está a ser preparada“.
Filipe Melo, do Chega, também foi duro nas palavras. “Eu não me vou referir à senhora deputada mas ao relatório. Não acredito que a senhora deputada se reveja neste relatório. Isto não é um relatório de uma comissão parlamentar de inquérito à tutela pública da gestão da TAP entre 2020 e 2022. Isto é um relatório do PS, não desta comissão. Este relatório de criterioso tem muito pouco, de falacioso tem muito”, afirmou.
Isto é um relatório do PS, não desta comissão. Este relatório de criterioso tem muito pouco, de falacioso tem muito.
Para o deputado o relatório “visa proteger os membros do Governo com responsabilidades na companhia, nomeadamente o ministro das Finanças e o ministro das Infraestruturas”, criticando ainda o facto de o documento abordar mais o período da privatização de 2015, protagonizada pelo Governo PSD-CDS, do que do período de 2020 a 2022.
Filipe Melo afirmou que são inúmeros os casos de ingerência política e deu como exemplo a reunião do ex-secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, com a ex-CEO da TAP antes da resposta da companhia ao Governo sobre a indemnização a Alexandra Reis. Criticou também a ausência de conclusões sobre a responsabilidade do administrador financeiro no comunicado à CMVM com a renúncia da ex-administradora.
Ana Paula Bernardo retorquiu que os antigos administradores “Antonoaldo Neves, Rafael Quintas, Christine Ourmières-Widener, Humberto Pedrosa, José Weber Gameiro e Ramiro Sequeira referiram não ter existido pressão política”.
“Este relatório envergonha-nos. Este relatório não espelha o que aqui foi dito. Há muita coisa em falta, muitas conclusões mal tiradas e muitas verdades que aqui foram ditas e que por conveniência não estão”, reiterou o deputado do Chega.
Bruno Aragão, coordenado do PS, apontou o que chamou as “crenças” expressas sobre o que se passou nas audições. “Um relatório tem natureza e conteúdo factual e não político. O respeito pelas pessoas e pelas audições é centramo-nos nas repostas das pessoas e não nas perguntas. E dou um exemplo, que aqui já foi citado. A presença de Hugo Mendes na reunião que preparou o documento que a TAP vai enviar a pedido do Governo. Podemos ter uma crença sobre isso. É à liberdade de cada um. O que não pode acontecer é ser ouvida a resposta e a ignoremos. A resposta foi ‘estive presente nessa reunião’. Redigiu, disse alguma coisa de como deveria ser esse texto? ‘Não’. O que deve estar no relatório é não. Isto é só um pequeno exemplo”.
Paulo Moniz, do PSD, caracterizou a intervenção do deputado socialista “na linha de minimizar e branquear com exemplos soltos o que foram cinco meses de audições”. Não terá havido uma CPI tão seguida pelos meios telemáticos. Qualquer relatório que queira branquear e desresponsabilizar o Governo não vai ter efeito”, afirmou.
O PSD não pode ser convivente com esta tentativa de esconder a verdade. Por isso vota contra.
“O que se retira de cinco meses de trabalho são recomendações de oportunidade para o Governo cumprir a Lei. O Governo já tem de cumprir a lei”, sublinhou, apontando como exemplo os contratos de gestão dos antigos gestores. “Este relatório é o melhor relatório para o senhor primeiro-ministro. Pode ir a férias e a banhos descansadíssimo. O rolo compressor da maioria funcionou bem”.
“O PSD não pode ser convivente com esta tentativa de esconder a verdade. Por isso vota contra”, concluiu Paulo Moniz.
Bernardo Blanco respondeu ao exemplo dado por Bruno Aragão, afirmando que Hugo Mendes nas suas respostas admitiu que deu uma orientação sobre a resposta da TAP ao Governo, que foi acolhida. O deputado da Iniciativa Liberal contestou a ausência de algumas declarações do relatório: “O depoimento de David Neeleman é ignorado no relatório todo. O senhor recebeu largas dezenas de perguntas”.
A Iniciativa Liberal “não apresenta propostas por um motivo simples. Não podemos compactuar com este relatório. Apresentar propostas de alteração seria compactuar com este relatório. Há muitas coisas que foram ditas e ouvidas e que não estão aqui”, disse, considerando que falta um “capítulo inteiro” sobre os desacatos de 26 de abril no Ministério das Infraestruturas e a intervenção do SIS.
“Tivemos a confirmação do ministro Pedro Nuno Santos e de outros ex-governantes de que os 55 milhões [pagos a David Neeleman para sair da TAP em 2020] só aconteceram porque em 2017 o Governo mudou o acordo parassocial e isso não está claro no relatório”, assinalou também Bernardo Blanco.
“Grande parte ou a maioria das respostas dadas nas audições foram ignoradas. Vamos votar contra este relatório”, conclui Bernardo Blanco.
Na quarta-feira foi distribuída aos deputados uma nova versão do relatório com alterações propostas pelo PS, Chega, Bloco e PCP. Foram acolhidas total ou parcialmente 48 propostas de alteração de um total de 165, incluindo todas as do PS.
Nada foi escondido, nada foi branqueado.
“A apreciação destas propostas e a decisão da sua inclusão ou não resultou apenas da minha responsabilidade ao contrário do que foi dito lá fora”, garantiu a relatora, a deputada socialista Ana Paula Bernardo. “Nada foi escondido, nada foi branqueado”, atirou na apresentação inicial do relatório.
A comissão parlamentar de inquérito (CPI) à TAP termina esta quinta-feira, 141 dias depois de ter tomado posse em fevereiro, tempo em que ouviu presencialmente e por escrito 56 personalidades e recolheu um imenso manancial de documentação.
Ao longo de cinco meses escalpelizou-se a privatização da TAP em 2015 e ficaram-se a saber detalhes sobre a forma como a empresa foi capitalizada usando os “Fundos Airbus” ou a situação limite em que se encontrava a tesouraria da companhia.
Ficou também a conhecer-se melhor os contornos da compra do negócio da manutenção e engenharia da Varig no Brasil, essencial para alguns, ruinoso para a maioria, os salários, bónus e outras regalias dadas aos administradores, os casos de ingerência política e, claro, os temas mais polémicos, da saída de Alexandra Reis aos desacatos no Ministério das Infraestruturas, já conhecidos como o “Galambagate”.
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