Polémica do fecho de balcões marca primeiros 100 dias de Paulo Macedo

  • ECO e Lusa
  • 9 Maio 2017

Os primeiros 100 dias da nova administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD), liderada por Paulo Macedo, ficam marcados pela polémica relativa ao encerramento de agências em vários pontos do país.

Foi no início de dezembro do ano passado que o Governo confirmou oficialmente que tinha convidado Paulo Macedo para presidente executivo da CGD e Rui Vilar para ‘chairman’ (presidente não executivo) e que ambos tinham respondido positivamente. Contudo, só a 1 de fevereiro é que a nova equipa de gestão assumiu funções, depois de o Banco Central Europeu (BCE) ter dado a necessária ‘luz verde’.

Depois da passagem curta, mas conturbada, de António Domingues pela CGD, os oito membros da nova administração – que só conta com uma mulher – finalmente arregaçaram mangas para colocar em prática o plano de reestruturação acordado com Bruxelas ainda pela anterior equipa, e que tinha como ponto central uma forte recapitalização do banco estatal (em torno de cinco mil milhões de euros).

Assim que entraram no banco, os novos presidentes escreveram uma carta aos trabalhadores na qual consideram que a recapitalização e reestruturação é uma “oportunidade” que não pode falhar e que dificilmente voltará a acontecer.

Apenas dois dias depois, a 3 de fevereiro, Paulo Macedo falou com os jornalistas no âmbito de uma visita à agência da CGD nas Amoreiras, em Lisboa, considerando o plano de reestruturação do banco “bastante robusto” e garantindo a disponibilidade da sua equipa para o executar.

Paulo Macedo na visita à agência da CGD nas Amoreiras.Paula Nunes/ECO

Já no final de fevereiro, começaram a surgir os primeiros ruídos relacionados com o encerramento de agências previsto no plano de negócios acordado com a Comissão Europeia e que permitiu que a injeção de capital público no banco não fosse considerada como ajuda de Estado.

Paulo Macedo e Rui Vilar ‘dão a cara’ pelos resultados de 2016 da CGD (exercício em que o banco teve José de Matos, primeiro, e depois António Domingues como presidentes executivos), a 10 de março. E revelaram que o banco público teve um prejuízo histórico de 1,9 mil milhões de euros no ano passado, no sexto ano consecutivo de prejuízos para o líder do mercado bancário português.

Na ocasião, os gestores avançaram que a CGD vai cortar 2.200 postos de trabalho, através de pré-reformas e rescisões amigáveis, e fechar mais de metade dos balcões até 2020, no âmbito do acordado com Bruxelas.

CGD, Paulo Macedo, Maria João Carioca, Rui Vilar na apresentação de resultados da Caixa.Paula Nunes/ECO

Antes deste anúncio, já a nova administração tinha sido contestada publicamente, sobretudo pelo poder político local, devido aos encerramentos de balcões já feitos ou previstos.

Na altura, já se destacavam os casos de Almeida, no distrito da Guarda, Marvão, no Alto Alentejo, freguesia do Teixoso, na Covilhã, Santa Margarida, concelho de Constância, e Golegã, ambas no distrito de Santarém.

Mas Paulo Macedo assinalou aquando da divulgação das contas que o banco não conseguirá regressar aos lucros se mantiver a atividade sem alterações e que não pode manter presença em todas localidades em que outros bancos não veem viabilidade económica: “Ninguém peça à CGD para ficar em todos os sítios onde os outros bancos não querem ficar. Se isso acontecesse, então a Caixa não saía dos seis anos de prejuízos que teve”, afirmou.

Ninguém peça à CGD para ficar em todos os sítios onde os outros bancos não querem ficar. Se isso acontecesse, então a Caixa não saía dos seis anos de prejuízos que teve.

Paulo Macedo

Presidente executivo da CGD

Além da contestação interna, também pela voz dos sindicatos devido à forte redução de pessoal anunciada, também surgiram críticas de fora do país, depois de ter sido anunciado pelo banco que será dada “prioridade” à saída de Espanha e da África do Sul.

A comunidade portuguesa na África do Sul manifestou a sua preocupação, considerando que revela o interesse de Portugal somente nas remessas dos emigrantes.

Mas, internamente, o ‘barulho’ foi ainda maior, uma vez que, além das estruturas representativas dos trabalhadores, também a oposição (PSD e CDS) condenou publicamente o fecho de agências da CGD.

Passos Coelho (líder do PSD) considerou o fecho de balcões um “cinismo atroz” do PS, BE e PCP.

Assunção Cristas (líder do CDS), por seu turno, defendeu que os critérios para a reestruturação da CGD “não podem ser iguais ao da banca privada”, sublinhando que o partido quer uma CGD 100% pública e que a entidade “tem de fazer o que os outros bancos não fazem”.

Face à crescente contestação das populações das localidades afetadas, a CGD veio alertar no final de março para que o não cumprimento do plano estratégico negociado com a Comissão Europeia, como contrapartida da recapitalização, teria “implicações muito graves”.

Mais tarde, Paulo Macedo, ouvido pelos deputados da Comissão de Orçamento e Finanças, na Assembleia da República, em 12 de abril, avançou que a CGD pediu autorização ao Banco de Portugal para ter um serviço móvel de balcões, com carrinhas que vão a zonas rurais e com populações envelhecidas prestar serviços bancários.

 

No meio de tudo isto, no parlamento, decorrem as duas comissões de inquérito sobre a CGD, que aumentam ainda mais o volume de ruído em torno do banco público.

Aqui ficam algumas das frases mais emblemática que marcaram os primeiros cem dias de mandato de Paulo Macedo:

“Parece-me um plano [de recapitalização] bastante robusto, um plano que já foi aprovado, submetido, divulgado e partilhado com diversos stakeholders [interessados] e, nesse sentido, estamos confiantes de que é um bom plano para a Caixa [Geral de Depósitos].”

Paulo Macedo, presidente da Comissão Executiva da Caixa Geral de Depósitos — 3-2-2017

“Nós trabalhamos em horizontes de quatro anos. A nossa visão da gestão é estrutural, não é para um mês ou dois.”

Paulo Macedo — 3-2-2017

“O que se passa é que a Caixa não será nem um novo BES nem um novo Banif porque já não é tutelada por V. Exas [PSD e CDS-PP] mas por um Governo que não esconde os problemas financeiros do setor bancário.”

António Costa, primeiro-ministro — 8-2-2017

“[A atual administração da Caixa Geral de Depósitos assume] o compromisso (…) de retomar plenamente o seu lugar de instituição de referência [no sistema financeiro português].”

Rui Vilar, presidente do Conselho de Administração da CGD — 2-3-2017

“[A polémica em torno da gestão de António Domingues foi um] acidente de percurso. Uma coisa é a espuma dos dias, é o combate político, outra coisa é a realidade e o bom senso com que as pessoas avaliam a luta política e a sabem distinguir dos interesses fundamentais do país.”

Rui Vilar — 2-3-2017

“Estou muito confiante em relação a essa instituição [Caixa Geral de Depósitos], como em relação a todas as instituições financeiras. Portanto, estou muito confiante naquilo que é o próximo passo de recapitalização dessa instituição financeira.”

Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República — 6-3-2017

“A Caixa Geral de Depósitos [CGD] é o banco líder em Portugal e vai manter-se assim. A CGD está num processo de solidez, de recapitalização, mas também está num processo de reestruturação, para apoiar melhor as empresas, para apoiar melhor os particulares.”

Paulo Macedo — 7-3-2017

“O plano de negócios apresentado por Portugal prevê uma transformação estrutural da CGD e permitirá ao banco tornar-se rentável a longo prazo. A nossa apreciação revelou que o Estado português, enquanto acionista único da CGD, investe nas mesmas condições que um proprietário privado estaria disposto a aceitar. Por conseguinte, a recapitalização pelo Estado não constitui um novo auxílio estatal.”

Margrethe Vestager, comissária da Concorrência — 10-3-2017

“Que fique claro, há aqui um agravamento drástico dos resultados [da Caixa Geral de Depósitos] e esse agravamento deve ser explicado a todos os portugueses.”

Duarte Pacheco, deputado do PSD — 10-3-2017

“Eu diria desagravados (…) Os prejuízos [da Caixa Geral de Depósitos] não são três mil milhões, são 1.900 milhões, o que significa que os portugueses terão de entrar com menos dinheiro e que a recapitalização feita pelo Estado será ligeiramente abaixo daquilo que estava previsto.”

Marcelo Rebelo de Sousa — 10-3-2017

“Em 2016 temos um conjunto de imparidades que foram feitas de mais de 3.000 milhões de euros que deram origem ao prejuízo de 1.859 milhões de euros no exercício. É um resultado que, em termos estruturais, é positivo, porque revela que os clientes quiseram continuar com a CGD em 2016.”

Paulo Macedo — 10-3-2017

“Na CGD entendemos que as questões dos órgãos de soberania são questões dos órgãos de soberania. Agora, se me perguntar se é normal um banco ser todos os dias referido por questões que não têm a ver com o serviço aos clientes e à sua atividade, claro que eu respondo que não.”

Paulo Macedo — 10-3-2017

“Ninguém peça à Caixa Geral de Depósitos (CGD) para ficar em todos os sítios onde os outros bancos não querem ficar. Se isso acontecesse, então a Caixa não saía dos seis anos de prejuízos que teve.”

Paulo Macedo — 10-3-2017

“A recapitalização da CGD é um passo importante na afirmação desta instituição enquanto banco público. É condição necessária mas não suficiente para assegurar as suas funções. O papel que deve desempenhar não deve ser diminuído por um qualquer plano de negócios imposto a partir de Bruxelas ou Frankfurt, que reduza a sua intervenção e abra espaço à banca privatizada.”

Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP — 11-3-2017

“No meu tempo ele [CGD] era público e essas agências existiam por que é que agora têm de encerrar, agora que o banco tem de ser defendido como um banco público apoiado por comunistas, bloquistas e socialistas, isto é de um cinismo atroz, um cinismo atroz.”

Pedro Passos Coelho, presidente do PSD — 18-3-2017

“Se há um banco 100% público é para poder fazer diferente do que outros bancos fazem. Se for para fazer exatamente igual, nomeadamente a presença em território português então não faria sentido estar a defender a caixa 100% pública.”

Assunção Cristas, presidente do CDS-PP — 20-3-2017

“O plano de reestruturação da CGD garante a presença da Caixa em todo o país, em todos os concelhos. Mas, o Estado ser acionista da Caixa não significa que o Governo se deva meter na vida do dia-a-dia da CGD. Temos uma administração que deve exercer as suas funções com independência, com autonomia – e o Governo tem toda a confiança na Caixa para assegurar a boa gestão.”

António Costa — 20-3-2017

“A dimensão espacial é seguramente uma dimensão relevante, e estou completamente seguro que todos os portugueses vão ter acesso a serviços bancários também através da CGD.”

Mário Centeno — 20-3-2017

“Tenho a convicção de que se chegará a uma solução que permitirá reduzir a presença da instituição [CGD] no país, mas mantê-la presente em todo o território português em termos concelhios.”

Marcelo Rebelo de Sousa — 20-3-2017

“Não me parece bem começar uma casa pelo telhado. O que devia ser feito era uma restruturação que implicasse primeiro ir aos locais averiguar as necessidades, ao nível da informática e métodos de organização do trabalho, e fortalecer estes aspetos, e não ao contrário: começar por fazer uma reestruturação por redução de custos e agências.”

Jorge Canadelo, coordenador da Comissão dos Trabalhadores da CGD — 21-3-2017

“É dele [António Costa] a decisão de fazer uma emissão obrigacionista perpétua em que vai pagar quase 11% de juros para que isto não tenha impacto no défice e para que o Governo possa dizer que a operação foi um sucesso, mas a culpa tem de ser minha, não é dele, que tomou a decisão.”

Pedro Passos Coelho — 23-03-2017

“Conclui-se hoje a segunda fase do processo de recapitalização da CGD, com a subscrição e realização do aumento de capital em dinheiro pelo Estado Português, no montante de 2.500 milhões de euros.”

Comunicado do Ministério das Finanças — 30-3-2017

“A Caixa Geral de Depósitos não precisava de um aumento de capital desta ordem [2.500 milhões de euros]. A recapitalização da Caixa é um manifesto exagero e mostra a forma leviana como o Governo trata o dinheiro dos contribuintes.”

Maria Luís Albuquerque, vice-presidente do PSD — 31-3-2017

“Se houver uma decisão de aumentar o défice [por causa da recapitalização da CGD], seja em 2016 seja em 2017, pode fazer ultrapassar os 3% e, nessa altura, [o encerramento do Procedimento por Défices Excessivos] fica em causa outra vez.”

Teodora Cardoso, presidente do Conselho de Finanças Públicas — 31-3-2017

“É um assunto que está em aberto, o impacto que esta recapitalização possa ter nas contas públicas.”

Mário Centeno — 31-3-2017

“O que os senhores jornalistas deviam gostar de saber é: há um plano ou não há? Há. Há vontade de o executar ou não? Há. Há uma monitorização ou não? É bom ter que prestar contas trimestralmente. Vai haver desvios ou não? Vai haver de certeza. Vamos conseguir depois em termos globais, ou não, atingir? É para isso que todos temos que trabalhar.”

Paulo Macedo — 10-4-2017

“Serão cerca de 200 reformas antecipadas e 200 acordos por pré-reforma e o número adicional de rescisões por mútuo acordo.”

Paulo Macedo — 12-4-2017

“A Caixa contratará pessoas: o que está previsto é a entrada de cerca de 100 efetivos por ano ao longo do período do plano de negócios [até 2020]. Esses efetivos irão suprimir competências que a Caixa não tem.”

Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto e das Finanças — 26-4-2017

“Estou a acompanhar de perto o que se passa e estou naturalmente a compreender o estado de espírito que ali existe [com o protesto da população de Almeida contra o encerramento do balcão local da Caixa Geral de Depósitos.”

Marcelo Rebelo de Sousa — 28-4-2017

“Vamos dar um dia à administração da CGD no sentido de perceber que a nossa união está forte, que as nossas razões são muitas, que a nossa situação é única, que é uma discriminação.”

Alberto Morgado, vice-presidente da Câmara Municipal de Almeida — 2-5-2017

“Ontem [terça-feira] o país assistiu a um ato que empobrece a democracia. Quando uma administração da Caixa, um banco público, se recusa a receber um eleito, um autarca eleito por um povo de Almeida com um argumento de que não podem recebê-lo porque estava o povo concentrado na agência que a CGD quer encerrar, queria pedir à administração da Caixa que peça desculpa ao presidente da câmara de Almeida e, nele, a todos os autarcas.”

Álvaro Amaro, presidente dos Autarcas Social Democratas — 3-5-2017

“A ocupação da agência bancária, promovida e mantida com o apoio dos responsáveis autárquicos, em inequívoca violação da lei, comprometeu irremediavelmente o ambiente para a concretização do encontro, que se consideraria reposto, se, e logo que, cessasse a ocupação.”

Comunicado da administração da CGD — 3-5-2017

“O presidente da câmara [António Baptista Ribeiro] e o executivo estão disponíveis para dialogar, simplesmente com as condições mínimas exigíveis. Quais são? São todos os serviços assegurados na sede do concelho, em Almeida, incluindo o serviço de tesouraria”,

Alberto Morgado, vice-presidente da câmara de Almeida — 4-5-2017

“Acusam-nos de querermos a privatização da Caixa, mas lembro que tivemos quatro anos e meio no governo e não tomámos uma única iniciativa para o fazer. Dizerem que queremos quando tivemos oportunidade e não o fizemos parece um bocadinho abusivo.”

Maria Luís Albuquerque, ex-ministra das Finanças — 7-5-2017

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