Credores do Novo Banco estão há 40 dias à espera de proposta

Sem um acordo com os obrigacionistas, a venda do Novo Banco cai por terra. Quase 40 dias depois da 'venda' ao Lone Star, os credores estão desconfortáveis, e desconfiados, porque não sabem de nada.

Nos últimos dias de março o Lone Star fechava o acordo para a compra do Novo Banco. No dia 31, uma sexta-feira ao final da tarde, António Costa e Mário Centeno falavam à imprensa para oficializar a venda do Novo Banco ao fundo norte-americano: “É uma solução equilibrada: a que melhor protege os contribuintes, a economia e a estabilidade do sistema financeiro”, assegurava então o primeiro-ministro à frente das câmaras das televisões, com Mário Centeno a seu lado.

O problema é que a venda e a “solução equilibrada” estão assentes num pressuposto que o Governo não sabe se vai acontecer. Além das necessárias autorizações por parte do Banco Central Europeu e da Direção Geral da Concorrência, — que não deverão levantar grandes obstáculos — a efetivação da venda está dependente de os credores do Novo Banco aceitarem uma troca de obrigações “voluntária” que permita ao Novo Banco ir “buscar” uma almofada adicional de capital de 500 milhões de euros. Credores com o peso da Pimco e da BlackRock, dois fundos essenciais no processo de decisão de todos os outros obrigacionistas.

Ao que o ECO conseguiu apurar junto de um grupo de credores institucionais, que detém uma grande fatia das obrigações seniores do Novo Banco, até à data ainda não receberam nenhum tipo de abordagem oficial, nem do Fundo de Resolução, nem do Novo Banco, nem do Banco de Portugal e muito menos do Governo.

Ou seja, desde o final de março até hoje, nem um único contacto oficial ou oficioso foi feito para tentar testar uma solução que se falhar deita por terra toda a operação de venda do Novo Banco. E as obrigações desses investidores continuam naturalmente suspensas e indisponíveis para serem negociadas em mercado.

Deste grupo de credores com que o ECO falou fazem parte obrigacionistas que perderam muito dinheiro quando o Banco de Portugal decidiu transferir 2,2 mil milhões de obrigações do Novo Banco para a esfera de ativos do falido BES. E que por causa disso intentaram uma ação nos tribunais portugueses para tentar travar a venda do Novo Banco. O supervisor, tal como o ECO noticiou, já veio invocar o “interesse público” para que a venda não seja bloqueada.

“Gato escaldado tem medo de água fria”

Traduzido para português, é mais ou menos este o sentimento deste grupo de investidores que olha com desconfiança para a proposta que ainda não chegou, mas que vai implicar perdas adicionais para as carteiras desses gestores de 500 milhões de euros. Seja pela via de um corte do valor nominal, da alteração dos juros ou da mudança de prazos do serviço da dívida.

Este grupo não se cansa de lembrar as palavras do próprio António Costa que criticou publicamente o Banco de Portugal por causa de decisão de transferir dívida Novo Banco para o balanço do falido BES.

Acho que é manifesto hoje que se há algo que penaliza os custos da República, os custos do sistema financeiro, é o facto de os investidores internacionais terem recebido particularmente mal a decisão do Banco de Portugal de, unilateralmente e de uma forma discricionária, ter imposto sacrifícios a certos obrigacionistas em dezembro de 2015.

António Costa

Uma decisão que afastou alguns deste investidores da emissão de dívida subordinada que a Caixa fez em março ou da venda de dívida soberana. Com o BCE presente no mercado todos os dias a comprar divida pública, estas ausências passam relativamente despercebidas. O problema poderá surgir quando terminar o ‘quantitative easing’ do BCE, prometido para dezembro, e regressar o ‘business as usual’.

Três cenários se os fundos rejeitarem a troca “voluntária”

Caso este grupo decida recusar a operação de Liability Management Exercise que lhe será proposta pelo Fundo de Resolução e pelo Banco de Portugal, a venda do Novo Banco ao Lone Star será abortada e aqui abrem-se pelo menos três cenários possíveis:

  1. É encontrada uma solução alternativa amigável, uma hipótese que naturalmente mais agrada a estes fundos, embora ainda não seja claro qual possa ser.
  2. A operação de troca de dívida deixa de ser voluntária e passa a obrigatória, o que seria uma ação temerária por parte do Governo que poderia hostilizar ainda mais investidores que também são tradicionalmente compradores de divida pública nacional. Este último cenário, noticiado pelo ECO na semana passada, na prática representaria um ‘bail in’ forçado da instituição liderada por António Ramalho.
  3. O banco vai para liquidação, já que que se a venda for abortada, o relógio de Bruxelas e da DGComp voltam a contar e a hipótese remota de desfazer os ativos do banco volta a estar em cima da mesa. Antes do anúncio da venda do Novo Banco ao Lone Star, o prazo para evitar a liquidação era 3 de agosto, uma data que foi congelada por Bruxelas depois da notícia do acordo para a alienação.


Se ninguém acredita na possibilidade de liquidação, pelo menos por iniciativa própria das autoridades portuguesas, a via da resolução também é vista pelos maiores credores como sendo muito remota já que as “leis de resolução impõem perdas para os acionistas — neste caso o Fundo de Resolução — e, em situações extremas, aos próprios depositantes” com mais de 100 mil euros.

Este grupo de credores do Novo Banco tem a faca e o queijo na mão, mas também sabe que em última instância será sempre o Governo e as autoridades portuguesas a decidirem a fatia que lhes será cortada.

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