Ataque de Costa reforça processo de investidores contra Banco de Portugal
Grandes investidores, como a Pimco e a BlackRock, que perderam dinheiro com a dívida do BES conseguiram um argumento de peso para o processo legal que moveram contra o Banco de Portugal.
No meio da conferência de imprensa da semana passada para anunciar a venda do Novo Banco, a frase de António Costa passou relativamente despercebida.
A conferência ia a meio quando o primeiro-ministro é confrontado com uma pergunta de um jornalista sobre o que aconteceria se os credores seniores do Novo Banco recusassem trocar a dívida que detêm por outra menos vantajosa? E se essa operação não poderia assustar ainda mais os investidores que em 2015 já tinham perdido dinheiro com dívida do Novo Banco.
Recorde-se que, em dezembro de 2015, o Banco de Portugal decidiu alterar o perímetro dos ativos e responsabilidades do BES e do Novo Banco, tendo na altura transferido para o BES cinco instrumentos de dívida sénior avaliados em 2,2 mil milhões de euros que estavam originalmente no balanço do Novo Banco.
Esta foi a resposta de António Costa na conferência de imprensa: “Foi precisamente tendo em conta essa experiência que nunca animámos qualquer solução que passasse por uma ação não voluntária por parte dos obrigacionistas. Acho que é manifesto hoje que se há algo que penaliza os custos da República, os custos do sistema financeiro, é o facto de os investidores internacionais terem recebido particularmente mal a decisão do Banco de Portugal de, unilateralmente e de uma forma discricionária, ter imposto sacrifícios a certos obrigacionistas em dezembro de 2015”.
As palavras “discricionária”, “unilateralmente” e “sacrifícios” foram recebidas com bastante satisfação em Nova Iorque, onde responsáveis dos gigantes como a Pimco e a BlackRock preparam um processo legal contra o Banco de Portugal por causa das perdas que sofreram com dívida do BES.
Palavras de Costa chegaram a Nova Iorque
Ao ECO, um responsável que representa esse grupo de investidores, que está a processar o Banco de Portugal (e que também avançou com um processo legal para travar a venda do Novo Banco), mostrou-se satisfeito com as palavras do primeiro-ministro que vêm dar mais força às suas reivindicações legais.
“A nossa posição é legal e não misturamos a política. No entanto, a posição do primeiro-ministro agrada-nos. Revela que, tal como sempre pensámos, as autoridades portuguesas seguem estritamente as regras internacionais e que podemos contar com elas para que se corrijam erros cometidos em momentos e por entidades que, numa situação de stress, não avaliaram corretamente o impacto das suas decisões”, disse o responsável ao ECO.
O mesmo grupo de grandes investidores refere ainda que quer “encorajar as autoridades portuguesas a procurar uma conclusão atempada e construtiva para este tema, para o benefício de todos, a começar pelos contribuintes portugueses”.
Ameaças, umas mais veladas que outras
Foi no dia 22 de março que este grupo de grandes investidores, liderados pela Pimco e BlackRock, anunciou que ia “intentar procedimentos legais contra o Banco de Portugal numa tentativa de recuperar as perdas dos seus clientes”.
Esta foi a justificação apresentada: “A 29 de dezembro de 2015, o Banco de Portugal levou a cabo um ato ilegal e discriminatório ao transferir cinco séries de títulos no total de 2,2 mil milhões de euros do Novo Banco para a massa falida do Banco Espírito Santo”. Numa nota da Pimco e da BlackRock enviada à imprensa lia-se ainda que “outras 38 séries de títulos classificadas simultaneamente com os títulos transferidos foram deixadas intactas no Novo Banco. Esta ação arbitrária e injustificada provocou perdas em torno de 1,5 mil milhões de euros para os investidores de retalho e pensionistas que confiaram as suas poupanças a instituições que investiram, em seu nome, em títulos que o Banco de Portugal escolheu de forma desigual”.
Mais tarde, no dia em que Caixa Geral de Depósitos escolheu para fazer uma emissão de dívida subordinada, as duas gestoras — Pimco e BlackRock — fizeram questão de dizer ao Finantial Times que não iriam participar na emissão do banco público português, uma ausência e uma ameaça que certamente terão contribuído para que o banco liderado por Paulo Macedo pagasse uma taxa elevada, de 10,75%.
No início da semana, após o anúncio do acordo para a venda do Novo Banco aos norte-americanos da Lone Star, a BlackRock, que é um dos maiores investidores de dívida pública portuguesa, veio dizer que, em conjunto com um grupo de investidores, vai avançar com um processo para travar a venda do banco.
“Vários membros do grupo vão procurar uma injunção para bloquear a venda do Novo Banco durante a semana que começa a 3 de abril de 2017. As regras que governam o processo de venda são discriminatórias e violam as leis europeias e portuguesas”, acrescenta a gestora de ativos.
Não é de hoje que António Costa critica o Banco de Portugal
Para tentar evitar que estes grandes investidores deixem de comprar dívida pública portuguesa e ativos nacionais é que o ministro das Finanças está a tentar chegar a um acordo amigável. A Bloomberg chegou a mencionar a possibilidade de um acordo em que pudessem reaver 600 milhões de euros (dos 2,2 mil milhões investidos), mas, ao Expresso, este grupo já tinha dito que não aceitaria tal proposta, visto que essa verba é apenas o valor que lhes é legalmente devido. Recorde-se que as regras de resolução preveem que nenhum credor perca com este mecanismo mais do que perderia num cenário de liquidação do banco. Dai a possibilidade desses investidores puderem legalmente recuperar os tais 600 milhões.
Não é de hoje que o Governo critica o Banco de Portugal pela decisão tomada e pelo impacto que terá tido e estará a ter nos juros da dívida pública. A 15 de Janeiro de 2016, num debate quinzenal no Parlamento, António Costa já tinha sido bastante crítico em relação à posição do Banco de Portugal: “Qualquer credor ou investidor que ouviu em agosto de 2014 o Banco e Portugal e o Governo definirem um perímetro de confiança e de sacrifício ficou então a confiar que estaria a salvo. Esse credor ou investidor nunca pensaria que dois anos depois as contas estariam em revisão e que aquilo que julgava estar protegido afinal não estava e que era de novo chamado ao sacrifício. Se acha que isso foi um bom contributo para a confiança, pois está enganado, porque foi um péssimo contributo“.
A diferença é que nessa altura esse grupo de grandes investidores que se dizem lesados, como a Pimco e a BlackRock, ainda não tinham tinham processado do Banco de Portugal.
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