Será destruir os seus talentos, um dos maiores talentos de Portugal?

  • Gonçalo Pinto Ferreira
  • 27 Novembro 2023

O fim do regime de RNH coloca, assim, sob um enorme ponto de interrogação o futuro da captação destes talentos. Continuarão a vir para Portugal? Não será o apelo de outros países mais forte?

Por esta altura, e desde já há algumas semanas, todos os caminhos vão dar à proposta de orçamento do estado para 2024. Já muito foi dito e escrito sobre o assunto, das virtudes identificadas por uns, às fragilidades apontadas por outros. Como muitos sublinham, no geral esta será, porventura, uma das propostas com menos surpresas (o que não significa necessariamente que seja satisfatória para todos). Há, porém, uma estrondosa exceção: o surpreendente e inesperado fim do regime dos Residentes Não-habituais (RNH).

O regime do RNH, iniciado em 2009, é aplicável a qualquer cidadão (nacional ou estrangeiro) que se torne fiscalmente residente em Portugal, não o tendo sido nos cinco anos anteriores. Se é certo que os beneficiários deste regime têm acesso a condições de fiscalidade mais favoráveis, também parece ser evidente o contributo dessas pessoas para a movimentação da economia portuguesa e até, entenda-se, para a receita do Estado, pois também os RNH pagam vários impostos em Portugal.

Sem desvalorizar a relevância das questões económicas e de fiscalidade, e os significativos impactos que esta medida terá nesse âmbito, o que me traz aqui hoje são as consequências de tal decisão num ativo intangível importantíssimo: o talento.

Enquadrados pelas prioridades para o exercício orçamental de 2024 e alinhados pelas conversações em sede de concertação social, identifica-se como um dos pilares laborais a atração e fixação de talento jovem. Reforça-se, assim, a atração e fixação de talento como um marco e prioridade para o presente e futuro.

Aqui chegados, parece não existirem dúvidas de que o regime do RNH contribuiu, ao longo da sua vigência, para trazer para Portugal capital humano altamente qualificado e sofisticado. Não escamoteamos que uma fiscalidade favorável terá servido de incentivo, no entanto contribuíram com o seu talento, experiência e know-how para o desenvolvimento do país.

O fim do regime de RNH coloca, assim, sob um enorme ponto de interrogação o futuro da captação destes talentos. Continuarão a vir para Portugal? Não será o apelo de outros países mais forte?

Bem sabemos que o Governo propõe medidas focadas na atração e retenção de talento. O IRS Jovem e o regime de incentivo fiscal à investigação científica e inovação são exemplos disso. Também o alargado regime dos ex-residentes poderá ser vir a ser uma ferramenta importante, porquanto a exclusão de tributação de 50% prevista para os rendimentos do trabalho dependente e rendimentos empresariais e profissionais se passará a aplicar sujeitos passivos que se tornem residentes fiscais nos anos de 2024 a 2026, desde que não tenham sido considerados residentes em território português em qualquer dos cinco anos anteriores e sem que se faça depender a aplicação da referida exclusão de tributação da residência anterior do sujeito passivo em território português.

No entanto, adensam-se as dúvidas e as preocupações, pois não é claro e, muito menos, certo que estas medidas consigam compensar as perdas na captação de talentos inerentes ao fim do RNH. E estas perdas poucas dúvidas há que as teremos.

Se outras razões não existissem (e bem sabemos que existem), por si só as questões em torno da atração de talento teriam recomendado uma melhor ponderação. Fica-nos até a dúvida se destruir os seus talentos não será um dos maiores talentos de Portugal. Veremos se a história se repete…

  • Gonçalo Pinto Ferreira
  • Sócio da TELLES

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