Quatro advogados fiscalistas apontaram quais são os pontos positivos e negativos desta proposta de Orçamento do Estado para 2024 do Governo.
No dia 10 de outubro, pouco depois das 13 horas, o ministro das Finanças, Fernando Medina, entregou a proposta do Orçamento do Estado para 2024 (OE2024) ao presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva.
A Advocatus foi saber junto de quatro advogados fiscalistas quais são os pontos positivos e negativos desta proposta de Orçamento do Estado para 2024. Este trabalho foi feito antes da crise política.
O que elogia no Orçamento do Estado para 2024?
A nível fiscal, e infelizmente, não me parece que haja elogios a fazer. Continuam a faltar as reformas fiscais estruturais que são sucessivamente adiadas e a redução da tributação da atividade empresarial, são prorrogadas as incontáveis contribuições setoriais que se pretendiam inicialmente temporárias e “extraordinárias”, as medidas para descongestionamento dos tribunais parecem tímidas e continuamos a evitar a reforma do funcionamento da administração tributária, sobretudo na dimensão das relações com os cidadãos. Nessa medida, este Orçamento foi mais uma oportunidade perdida para introduzir as melhorias necessárias no sistema fiscal.
O que critica no Orçamento do Estado?
O fim do regime dos residentes não habituais, sobretudo pela forma abrupta e precipitada como está a ser concretizado. Este regime foi fundamental para a recuperação económica de Portugal nos últimos, tendo permitido atrair para Portugal um conjunto de pessoas muito qualificadas e atividades de alto valor acrescentado que produziram um impacto bastante visível em Portugal. De acordo com os estudos disponíveis, o impacto económico positivo deste regime foi de uma enorme magnitude. Sem prejuízo de alguns acertos que pudessem ser necessários, custa a compreender a forma ligeira como se decidiu acabar com este regime, sem quaisquer estudos de impacto económico. Creio que é um erro cujas consequências ainda não são inteiramente claras e que creio que irá ter um custo bastante elevado para Portugal.
O que elogia no Orçamento do Estado para 2024?
O OE tem algumas medidas positivas como sejam a melhoria do incentivo fiscal, em sede de IRC, ou a capitalização das empresas, que permitirá, ao tecido empresarial português, reestruturar, com benefícios, os seus capitais próprios. Outras das boas notícias do OE é a nova taxa de IRC de 12,50% para as startups nos primeiros 50.000 de lucro. Por último, saliento a redução transversal das taxas marginais de IRS consagrando uma redução de cerca de 3% dos escalões de rendimentos, até ao 5.º escalão, traduzindo-se numa diminuição de imposto para os sujeitos que aufiram rendimentos iguais ou inferiores a 27.146 euros.
O que critica no Orçamento do Estado?
O OE traz uma notícia bastante negativa, já muito discutida nos últimos dias, que está relacionada com o fim do Regime dos Residentes Não Habituais, que, na minha opinião, não resolverá os problemas de habitação nas grandes cidades, e que para além de estar em contraciclo com o que os restantes países da UE estão a implementar ou até a melhorar os seus regimes, o impacto indireto que terá na economia portuguesa será bastante significativa, não só já em 2024, mas, ainda mais, nos anos seguintes. Qualquer outro regime que esteja contemplado no OE não compensará nunca a perda de credibilidade que o País já está sofrer com o fim do regime do RNH.
O que elogia no Orçamento do Estado para 2024?
Infelizmente, não há muitos elogios a fazer. A ligeira redução da tributação autónoma sobre veículos e uma amortização mais rápida do goodwill adquirido numa concentração de empresas são sinais positivos, embora muito tímidos, de uma tentativa de melhorar o ambiente fiscal das empresas. Acresce ainda a possibilidade de migrar processos que se arrastam há anos nos tribunais tributários para a arbitragem – embora tal venha comprovar que as instituições simplesmente não conseguem resolver o problema das pendências nos tribunais tributários. Para além disso, é positivo que as alterações sejam apenas cirúrgicas, não se agravando (muito) a manta de retalhos em que se transformaram as leis fiscais.
O que critica no Orçamento do Estado?
A grande crítica vai para a forma errada de executar boas intenções. Como exemplo, temos o incentivo fiscal à habitação dos trabalhadores, que tem um propósito interessante, mas cuja aplicação termina em três anos, o que não permite que seja utilizado com verdadeiro impacto pelas empresas. Outro exemplo é a criação de um regime fiscal atrativo para as startups, que em si mesmo é positivo, mas depois consubstancia-se numa pequena redução do IRC, agravando a natureza progressiva deste imposto e a sua complexidade, que são duas características que prejudicam muito a competitividade nacional. Esta crítica é extensível à multitude de incentivos e benefícios que apenas conferem vantagens fiscais diminutas ou de difícil aplicação e que, por isso mesmo, não são aptas a mudar comportamentos, complexificando o sistema e criando despesa sem gerar o benefício pretendido. Em vez de IRS Jovem e regimes de ex-residentes, que geram confusão e despesa sem benefício, não seria melhor um esforço sério de redução do IRS? Em vez do incentivo à valorização salarial, não seria melhor acabar com a progressividade do IRC? Em vez do incentivo fiscal à habitação dos trabalhadores não seria melhor reduzir o IMT? A resposta parece-me evidente.
O que elogia no Orçamento do Estado para 2024?
O que mais elogio na proposta de OE para 2024 é a manutenção de uma generalizada estabilidade fiscal, com exceção do tema dos residentes habituais onde se promove uma gravosa eliminação do regime, bem como alguns ajustamentos positivos em sede de IRS, nomeadamente no âmbito do IRS jovem e descida das taxas dos escalões inferiores do imposto.
O que critica no Orçamento do Estado?
Num orçamento que se assume pouco expansionista, critico, por um lado, a eliminação do regime dos residentes não habituais, sem que tal situação seja acompanhada de outras medidas capazes de atrair o investimento estrangeiro e ajudar o país no âmbito da competitividade fiscal internacional – como por exemplo a criação de regimes favoráveis à captação de empresas estrangeiras, a baixa significativa das taxas de IRS (em todos os escalões e não só nos mais baixos) e da taxa nominal de IRC. Por outro lado, critico a diminuta importância – ou omissão – quanto às medidas incentivadoras das empresas e do investimento, que mais uma vez poderiam passar pela descida do IRC e das Derramas.
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Fiscalistas são críticos face ao novo Orçamento do Estado
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