Porque é que João Tiago Silveira e Rui de Oliveira Neves, sócios da Morais Leitão, são arguidos?
Na lista de arguidos da chamada 'Operação Influencer' dois nomes são de sócios da Morais Leitão: João Tiago Silveira, arguido, e Rui de Oliveira Neves, detido e arguido. Veja as suspeitas.
Na lista de arguidos da chamada ‘Operação Influencer‘ dois nomes são de sócios da Morais Leitão: João Tiago Silveira, arguido, e Rui de Oliveira Neves, detido e arguido. Silveira, que também foi ex-secretário de Estado e porta-voz do PS no tempo de José Sócrates, estaria a preparar um decreto-lei para simplificar o licenciamento no âmbito do urbanismo, ordenamento do território e indústria, para o próprio Governo, de acordo com os interesses da empresa Start Campus.
Esse diploma acabaria por ser aprovado em Conselho de Ministros do dia 19 de Outubro.
João Tiago Silveira é sócio da Morais Leitão desde 2017, para onde regressou em 2011. Coordena o departamento de direito público, urbanismo e ambiente. Foi nomeado porta-voz do PS por José Sócrates, em 2009, e trazido por Sérgio Sousa Pinto para o PS em 1994. Foi adjunto de António Vitorino e António Costa nos governos de Guterres e secretário de Estado de Alberto Costa, ministro da Justiça de Costa.
Diz o Ministério Público, no despacho de indiciação que o ECO consultou no capítulo que chama de “Simplex” industrial”, que “antes de ser submetido a Conselho de Ministros, tal diploma foi preparado, do ponto de vista jurídico, pelo arguido João Tiago Silveira”.
Mas os procuradores do DCIAP acreditam que a iniciativa nasceu da cabeça de João Galamba – arguido no processo e atual ministro das Infraestruturas –, que terá “tomado conhecimento do regime legal que estava em vias de ser aprovado e com o propósito de beneficiar indevidamente os interesses da Start Campus”.
Assim, para conseguir esse objetivo, no dia 12 de Outubro de 2023, Galamba contactou Diogo Lacerda Machado, consultor na empresa, e pediu-lhe que a Start Campus lhe enviasse informação com as normas do data center em questão, “para assim inserir tais normas no diploma”.
E aqui entra em cena Rui de Oliveira Neves que pede ao colega de escritório, João Tiago Silveira, que fizesse as tais alterações, “o que este aceitou fazer”, diz o despacho do DCIAP.
E esta foi a conversa que está nas escutas juntas ao processo:
Rui Oliveira Neves (RON)- “O Galamba ontem ligou à noite porque queria pôr os data center nesse regime (…) Pede ajuda para trabalhares com a equipa da Start para ainda hoje ter o que é necessário pôr lá para os Data Centers estarem incluídos”.
João Tiago Silveira (JTS) – “Sim, mas para hoje é difícil”.
RON: “O Galamba está a pedir para hoje”.
JTS: “O Galamba em Conselho de Ministros falou em aplicar o regime das dispensas de loteamentos/dispensa de procedimento administrativo mediante parecer não vinculativo da câmara que, na prática, dispensa tudo (…) À partida é uma coisa muito fácil de meter lá, já não é fácil aceitar, mas o espírito neste momento é aceitar”.
João Tiago Silveira diz estar a tratar disto há meses e que esteve “com o Costa quatro horas a ver isto na quarta-feira e o gajo está completamente entusiasmado com isto (…) Espírito é acabar com a maluqueira que as câmaras inventam, o espírito é positivo. É uma dispensa normalmente para coisas de entidade públicas, têm que arranjar aqui uma maneira qualquer de ligar isto aos projetos (…) A melhor forma de passar é a relação dos projetos com a Global Parques”.
RON: “Depois de estar do lado do Galamba o governo que decida,”;
JTS: Diz que quem vai decidir isto é ele próprio que “aquilo é uma dispensa normalmente para coisas de
entidade públicas, têm de arranjar aqui uma maneira qualquer de ligar isto aos projetos” e que “a melhor forma de passar é a relação dos projetos com Global Parques”;
RON: “Quem faz o licenciamento é a Global Parques, dizer que é para as entidades públicas e naturalmente se essas entidades tiverem entidades privadas a usar os terrenos/infra-estruturas”.
Diogo Lacerda Machado, amigo de Costa; Vítor Escária, chefe de gabinete do primeiro-ministro; Rui Oliveira Neves, administrador da Start Campus e também sócio da Morais Leitão; Afonso Salema, CEO da mesma empresa; e Nuno Mascarenhas, autarca de Sines, são os arguidos que estão detidos.
O ministro das Infraestruturas, João Galamba, a empresa Start Campus, o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, e João Silveira são os restantes arguidos, mas não foram detidos.
E em que medida Rui de Oliveira Neves pode estar implicado nesta teia de alegado tráfico de influência, prevaricação e corrupção (ativa e passiva)?
Alegadamente, os suspeitos Afonso Salema, Rui Oliveira Neves e Diogo Lacerda de Machado “mantiveram contactos com grande frequência” com João Galamba, secretário de Estado da Energia até janeiro de 2022 e atual ministro das Infraestruturas, com Nuno Lacasta, presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, e ainda Duarte Cordeiro, atual ministro do Ambiente, “tendo logrado obter o favor destes em matérias relacionadas com a Start Campus, das quais se destaca a dispensa de aprovação da APA, quanto à primeira fase do projeto (NEST) e a emissão da declaração de Impacte Ambiental favorável com condições na segunda fase do projeto (REST)”.
O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) denuncia ainda encontros marcados no escritório da Start Campus, em Lisboa, ou ainda almoços e jantares privados com um valor elevado. Ou com um “valor não despiciendo”, como refere o MP no mandado. Refeições essas pagas pelos gestores da Start Campus – Afonso Salema e Rui Oliveira Neves – ao ministro das Infraestruturas, João Galamba, e ao presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta.
Rui de Oliveira Neves regressou à Morais Leitão como sócio em 2021, com “responsabilidade pela transformação do negócio para disponibilizar, de forma transversal, uma oferta renovada de serviços jurídicos com uma abordagem estratégica e de gestão de risco focada na assessoria de transações, projetos e matérias regulatórias”, segundo o site do escritório.
Entre 2013 e 2021, foi diretor de assuntos jurídicos e governance, secretário-geral e desempenhou funções de gestão na Galp. Anteriormente, tinha desenvolvido a sua carreira na Morais Leitão durante 14 anos.
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