Regulador da energia admite revisão de preços da luz mais frequente
Desvios como o que deu origem ao salto histórico da dívida tarifária podem ser atenuados com mais revisões. Caso este desvio fosse todo incorporado nos preços regulados de 2024, estes subiriam 34%.
O regulador da energia defende que a gestão que está a fazer da dívida tarifária, a qual teve um aumento histórico este ano, é “sustentável”. Aponta a volatilidade dos preços de mercado da eletricidade como o principal problema, que é exacerbado pela atual falta de flexibilidade do sistema. Se o armazenamento e uma gestão otimizada dos consumos serão a melhor resposta no futuro, para já o regulador vê a dívida tarifária como um instrumento adequado para responder à volatilidade, e admite fazer revisões de tarifas mais frequentes.
O valor da dívida tarifária aumentou em 1.717 milhões de euros, para um valor, no final de 2023, de 1.995 milhões de euros. Foi o maior aumento de que há registo, quando nos últimos anos a trajetória havia sido descendente. E quem paga esta dívida são todos os consumidores. Isto justificou o pedido por parte dos deputados da Comissão da Energia para ouvirem o presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), Pedro Verdelho.
A ERSE esperava que o preço médio da eletricidade no mercado grossista fosse de 200 megawatts-hora (MWh) em 2023, mas a realidade “surpreendeu” o regulador, nas palavras de Pedro Verdelho. Em média, verificou-se um preço de mercado da luz 120 euros por MWh mais baixo do que era previsto em dezembro de 2022, a altura de definir as tarifas reguladas para todo o ano seguinte. E foi este desencontro que desequilibrou as contas, e que está na origem do aumento da dívida tarifária.
Com um preço de mercado muito mais baixo, ao contrário daquilo que seria mais intuitivo, não existem necessariamente menos custos. Porque há dois fatores em jogo: o preço da luz é dado pela tarifa da energia (ligada ao preço da eletricidade) e pela tarifa de acesso às redes (definida, a cada ano, pelo regulador, e que diz respeito ao custo de manutenção e expansão das redes).
Mas há um terceiro fator a complicar as contas: uma parte relevante da energia em Portugal tem preços garantidos, isto é: uma das condições que foram acordadas quando esta capacidade foi instalada é que a tarifa a pagar pela energia não mexe. Geralmente, esta tarifa da energia está acima do preço de mercado, representando um sobrecusto para os consumidores. Mas, em 2022, os preços de mercado estiveram tão altos que os preços garantidos, em vez de representarem um sobrecusto, representaram um sobreganho.
De forma a que não fosse criada uma dívida tarifária maior, o regulador ajustou a meio do ano, em julho, as tarifas. “Se não tivéssemos revisto as tarifas em julho, a dívida seria de 3 mil milhões de euros, em vez de 1,7 mil milhões”, indicou o presidente.
E, se a ERSE tivesse assimilado o desvio de 2023 inteiramente nas tarifas de 2024, em vez de distribuir o desvio por vários anos na forma de dívida tarifária, o aumento nos preços regulados seria de 34% em vez de 2,9%, “muito acima do que seria expectável no próximo ano”, alertou o líder do regulador.
“Enquanto os investimentos em flexibilidade não surgirem – e vão demorar a surgir – a revisão excecional de tarifas poderá ser mais frequente“, indicou Verdelho, acrescentando que está a ser avaliado um “aperfeiçoamento dos ajustamentos tarifários”, de forma a que a revisão excecional de tarifas seja substituída “por algo mais automático”. “Já fazemos isso nos ajustamentos da componente de energia, temos de fazer na componente de acesso”, concluiu.
A dívida acumulada deverá recair sobre os consumidores ao longo de um período “alargado”. “Esta alocação num período alargado é sustentável. Consegue-se no fundo recuperar o desvio mas sem afastar muito os preços pagos [a cada ano] dos custos reais que são expectáveis”, defendeu Verdelho perante os deputados.
Mas mantém-se a questão – qual a justificação para tamanho desvio ter acontecido, para que as previsões fossem tão diferentes da realidade. A culpa, indica Verdelho, é da volatilidade, causada por uma fatia cada vez maior de renováveis no mix energético, quando o sistema ainda não é flexível o suficiente para acomodar estas mudanças no modo de produzir energia.
A volatilidade, explicou o líder da ERSE, apesar de inevitável, pode ser acomodada com “a entrada de tecnologias descentralizadas que contribuem para flexibilidade”, contratação de energia mais a longo prazo, com uma revisão mais frequente – e até mais automatizada – das tarifas, tanto de energia como de acesso à rede. Em paralelo, “a existência de tarifas sociais é essencial”, considera.
No futuro, a aposta no armazenamento, a descentralização e gestão individual do consumo virão também dar uma ajuda. O problema de base, a volatilidade, “só será ultrapassado quando tivermos mais armazenamento do sistema”, admitiu Verdelho. “A mensagem chave é flexibilidade”, concluiu.
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