Fuga de cérebros? “Podemos interpretar como uma viagem de aquisição de conhecimento”

John Leitão diz que o país precisa de estar atento à "balança comercial de talento", isto é, por cada profissional que saia, há que captar um estrangeiro que venha contribuir para a economia.

Muito menos fatalista” do que outros, John Leitão entende que, além de estar atento à saída de portugueses para o estrangeiro, há que manter os olhos na “balança comercial de talento“, isto é, por cada profissional que emigre, há que captar um estrangeiro, que venha contribuir para o desenvolvimento da economia nacional.

Em entrevista ao ECO, o CEO do Inspired Education Group para Portugal e o Norte da Europa precisa que o problema não está na saída desses portugueses — aliás, “precisamos de pessoas que tenham sido expostas a experiências diferentes”, defende –, mas no seu não eventual retorno. Ou seja, é preciso criar condições para que esses profissionais se sentiam atraídos pelo país que os viu nascer.

O Inspired Education Group tem três escolas internacionais em Portugal. Uma delas, a PaRK International School, vai apresentar este fim de semana um novo edifício, num investimento de 30 milhões de euros. O novo edifício vai receber o primeiro liceu internacional para o secundário em grande escala de Portugal e John Leitão adianta ao ECO que dificuldades tem enfrentado no recrutamento de professores para este novo colégio.

Na outra parte desta entrevista — que pode ler aqui –, o CEO debruça-se sobre o sistema de educação português e sobre as vantagens das escolas internacionais, garantindo que são cada vez mais os alunos que escolhem vir estudar para Portugal.

John Leitão, CEO do Inspired Education Group em Portugal, em entrevista ao ECO - 22JAN24
John Leitão, CEO do Inspired Education Group em Portugal, em entrevista ao ECO Hugo Amaral/ECO

É CEO de um grupo que tem várias escolas internacionais em Portugal. Que impacto é que frequentar uma escola internacional pode ter na carreira futura?

Um ser humano é uma obra muito complexa. Somos produtos em parte das experiências que temos na vida, e uma criança que ingresse numa escola internacional terá uma experiência bastante diferente do que teria noutra escola. Por exemplo, na PaRK, que é uma das nossas escolas em Portugal, o ensino é bilíngue. As crianças, desde o início, ou falam inglês ou português. Por outro lado, não só temos um foco muito grande na aquisição de competências académicas de excelência, mas também trabalhamos para dotar as crianças de capacidades psicológicas e sociais, que lhes permitam ser indivíduos que conseguem navegar pelo mundo de hoje.

O ensino bilíngue deixa essas crianças mais abertas, depois, à internacionalização das suas carreiras? Tem ideia da percentagem de alunos vossos que acabam por escolher estudar e trabalhar lá fora?

Na PaRK estamos agora no terceiro ano de conclusão de turmas do 12.º ano de escolaridade. Não temos alunos formados suficientes para apurar estas estatísticas. Mas já temos uma grande fatia de alunos a candidatarem-se a faculdades internacionais. É uma percentagem relevante. Por outro lado, estar imerso no mundo internacional desde muito pequeno – temos mais de 50 nacionalidades na nossa escola – cria uma compreensão do mundo internacional completamente distinta. Portanto, sim, podemos prever que essas pessoas provavelmente terão uma maior tendência a ingressar numa carreira internacional.

Disse que uma grande parte dos vossos alunos olha para as universidades estrangeiras, no momento da passagem para o ensino superior. É porque as instituições portuguesas comparam mal?

De todo. Mas nas últimas décadas, o mercado internacional tornou-se global. Tal como há alunos estrangeiros que acham que o curso da faculdade x em Portugal é o mais indicado para si, também acontece haver portugueses que decidem que a faculdade na Alemanha ou na Holanda é a que melhor se adequa às especialidades que querem tirar.

Na nossa escola, temos equipas mistas de professores internacionais e nacionais. É esse misto que cria o que acreditamos ser uma experiência académica mais completa.

John Leitão

CEO do Inspired Education Group em Portugal e no Norte da Europa

Olhando para o outro lado da questão, para as empresas portuguesas, que vantagem há em ter escolas internacionais no país? Dizia que prezam pela formação de jovens completos.

O que um empregador mais precisa é de diversidade de experiências e backgrounds. Contribuímos para essa diversidade de valências dos indivíduos.

Falemos do novo edifício da PaRK International School, que vai acolher o primeiro liceu para o secundário em larga escala em Portugal. Foi difícil encontrar os recursos humanos (professores, assistentes) necessários para dar resposta a esses novos alunos que vão acolher?

Acho que para quem lidera instituições de ensino, é sempre um desafio trazer talento de professores e de lideranças académicas de qualidade. Acho que podia ser CEO de qualquer empresa e estaria aqui a dizer que a parte mais difícil é encontrar talento. As empresas de sucesso ou as organizações de sucesso fazem-se de bom talento. É um desafio que trabalhamos diariamente, nomeadamente do ponto de vista de aquisição, recrutando o que acreditamos ser o melhor talento a nível nacional e a nível internacional. Na nossa escola, temos equipas mistas: tanto professores totalmente internacionais, como professores nacionais, como outros que estiveram a dar aulas fora e voltaram. É esse misto que cria o que acreditamos ser uma experiência académica mais completa.

Mas encontrar professores portugueses que falem inglês e que consigam dar o ensino bilíngue é particularmente desafiante?

Não. Temos um mercado de trabalho bastante dinâmico e encontramos professores de elevadíssima qualidade em Portugal. Ao ingressar na Inspired, ingressam no maior grupo internacional de escolas privadas internacionais. Temos hoje mais de 110 escolas. Dessas, muitas delas são algumas das melhores do mundo.

Acho que todas as instituições de ensino sentem desafios no recrutamento de talento. Acho que esse é um tema que perfaz muitas das indústrias.

John Leitão

CEO do Inspired Education Group em Portugal e no Norte da Europa

 

No ensino público, fala-se muito em escassez de professores. Não tem sentido também essa dificuldade?

Sim, acho que todas as instituições de ensino sentem desafios no recrutamento de talento. Mas, como lhe disse, acho que esse é um tema que perfaz muitas das indústrias.

E em relação às condições que oferecem aos docentes, são diferenciadas face àquilo que poderíamos encontrar no privado clássico? Os salários têm que ser mais atrativos, tendo em conta que há também a exigência do inglês?

Temos um grande enfoque em trazer o melhor talento e criamos condições muito atrativas para trazer o melhor para a nossas empresas. Mas não consigo dizer se temos [condições] mais atrativas ou menos atrativas. Há muitas escolas, há muitas oportunidades diferentes para os professores. Portanto, ingressar na Inspired, é uma oportunidade profissional muito interessante para um jovem professor ou para um professor muito experiente.

Sim, mas diria que estão em linha ou acima do mercado?

Em linha com o mercado e, nalguns casos, acima.

John Leitão, CEO do Inspired Education Group em Portugal, em entrevista ao ECO - 22JAN24
John Leitão, CEO do Inspired Education Group em Portugal, em entrevista ao ECO Hugo Amaral/ECO

Ao longo desta conversa, várias vezes referiu que há cada vez mais estrangeiros a virem para Portugal. Mas também é um bocadinho inevitável falar na questão da “fuga” de cérebros portugueses para fora. Tem alguma recomendação ou desejo sobre como se pode parar essa fuga?

Tenho uma opinião muito pessoal. O que as pessoas, muitas vezes, interpretam como fuga de cérebros, podemos interpretar como uma viagem de aquisição de conhecimento para retorno.

O problema não é saírem. É não voltarem. É isso?

Certo. Ou não conseguimos ter um interchange [intercâmbio] positivo. Ou seja, num mercado global, não queremos fazer todos os produtos em Portugal. Portanto, se há um indivíduo que acredita que a melhor oportunidade para si, numa fase da sua carreira, é ir para fora, esperamos que haja um indivíduo estrangeiro que acredite que Portugal é a melhor oportunidade para ele em termos profissionais. Devíamos estar a olhar para essa balança comercial de talento. O mundo hoje é infinitamente complexo e é preciso haver pessoas que foram expostas a muitas experiências diferentes para contribuírem para o nosso país. Isto não quer dizer que uma pessoa que tenha toda a sua carreira em Portugal não contribua para o país. Mas também são precisas pessoas que tenham visto outras coisas e tragam esse conhecimento também. Sou muito menos fatalista nessas estatísticas.

Mas da experiência que temos dos estrangeiros que têm vindo para Portugal, que lições é que devemos tirar para atrair os portugueses que saíram a voltarem para o país?

Ainda é muito cedo para fazer essa avaliação. Esta conexão com o mundo internacional certamente trará os seus frutos.

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