“Há um fluxo de alunos internacionais cada vez maior nas universidades e escolas portuguesas”

Em duas décadas, o sistema educativo português registou um "desenvolvimento gigante". Quem é diz é John Leitão, CEO de um grupo que tem várias escolas internacionais no país.

Portugal já não é visto apenas como destino turístico, havendo hoje “cada vez mais” famílias a escolher o país como morada. E consequentemente, são também mais os alunos estrangeiros nas escolas portuguesas. O retrato é traçado pelo CEO do Inspired Education Group para Portugal e para o Norte da Europa, que tem, por cá, três escolas internacionais.

Em entrevista ao ECO, John Leitão faz não só o diagnóstico do sistema de ensino português, como identifica a diferenças entre as escolas públicas, as escolas privadas e as escolas internacionais. Por exemplo, além das competências académicas, a autonomia, respeito e autoconhecimento têm uma presença forte, sublinha, no percurso dos alunos.

Uma das escolas do Inspired Education Group, a PaRK International School, vai apresentar este fim de semana um novo edifício, que vai receber o primeiro liceu internacional para o secundário em grande escala de Portugal. Ao ECO, o CEO explica que esse investimento (que ronda os 30 milhões) visa dar resposta à procura crescente, mas também reforçar a customização do ensino.

Na outra parte desta entrevista — que pode ler aqui –, John Leitão adianta as vantagens do ensino internacional para as carreiras dos alunos e debruça-se também sobre a fuga de cérebros de que Portugal padece.

Nos últimos 20 anos, as nossas universidades têm sido reconhecidas internacionalmente, e isso tem trazido um grande protagonismo ao setor educativo.

John Leitão

CEO do Inspired Education Group em Portugal e no Norte da Europa

É CEO de um grupo que tem várias escolas em Portugal. Comecemos pelo cenário mais global. Que retrato faz da educação – privada e pública – em Portugal?

A educação em Portugal tem tido um desenvolvimento gigante nas últimas décadas. Nos últimos 20 anos, as nossas universidades têm sido reconhecidas internacionalmente, e isso tem trazido um grande protagonismo ao setor educativo. Por outro lado, temos um fluxo de alunos internacionais cada vez maior, não só para o ramo universitário, como para o ramo escolar. Do lado das escolas, isso é muito alimentado pelo fluxo de famílias internacionais, que estão a escolher vir trabalhar para Portugal. Muitas vezes estas famílias escolhem o ensino privado internacional para manterem a flexibilidade no movimento das suas crianças.

De que modo?

Quem vem para Portugal não quer, muitas vezes, inscrever imediatamente os filhos no sistema nacional. Quer ser portável. Muitas das escolas internacionais nasceram para isso, nasceram do intuito de dar flexibilidade às famílias internacionais.

Falemos do ensino em si, o que diferencia o modelo de ensino dos vossos colégios dos outros colégios clássicos, além de o ensino ser em inglês e português?

Por um lado, temos um foco na excelência académica e na utilização das melhores práticas mundiais no ensino do currículo académico que o nosso sistema segue. Não só temos um grande foco em trazer os melhores professores para as nossas escolas, tanto nacionais como internacionais – temos equipas mistas –, como em dar os melhores equipamentos possíveis. Na parte mais psicológica, desde muito cedo, tentamos dar aos nossos alunos uma compreensão muito grande do conceito de autonomia. Desde muito novos que os alunos têm tempo individual de estudo, em que são eles decidem o que é que vão estudar. Há também um grande poder de livre iniciativa. Os nossos alunos participam na decisão do que vão aprender. Uma terceira parte que é muito trabalhada é o tema do autoconhecimento. Acoplado a isso está a noção de respeito.

John Leitão, CEO do Inspired Education Group em Portugal, em entrevista ao ECO - 22JAN24
John Leitão, CEO do Inspired Education Group em Portugal, em entrevista ao ECO Hugo Amaral/ECO

Quais são as maiores dificuldades em construir um modelo de ensino adaptado a exigências internacionais?

Mais do que isso, há o desafio de criar um indivíduo de sucesso para o futuro. O que na PaRK tentamos trazer é o domínio da competência académica, com um forte enfoque experimental. Outro tema que trabalhamos é a valência da compreensão do mundo local e do mundo global.

Mas o modelo de ensino britânico, que é o que seguem, tende a ser mais flexível do que o português, nomeadamente no que toca às disciplinas que podem ser escolhidas pelos alunos. Acha que esta flexibilidade é uma vantagem?

O que temos é um modelo de ensino bilíngue, em que nos regemos pelo currículo nacional, mais o currículo de Cambridge. O currículo de Cambridge foi desenvolvido pela Faculdade de Cambridge, que criou um standard [padrão] educativo que dita quais são as cadeiras que os alunos podem seguir e quais são os exames que devem executar. Temos esse currículo até ao 10.º ano, altura em que os alunos podem então optar por dois caminhos distintos: o diploma IB ou o sistema de Cambridge.

Nesses sistemas, há ou não maior liberdade de escolha por parte dos alunos?

No sistema português, no início, não se tomam opções nenhumas e, depois, quando se chega ao 9.º ano, toma-se um de quatro caminhos. No sistema de Cambridge, o aluno pode escolher as disciplinas, nos últimos três anos. Já no sistema IB, o aluno tem de fazer um pouco de todas as cadeiras. O aluno tem pouca opção de se especializar numa ou noutra área. Tem, sim, de mostrar competência em todas as áreas. É um sistema mais parecido com o sistema alemão. Portanto, a resposta a essa pergunta não é assim tão simples.

A expansão do nosso campus prende-se com duas razões. Por um lado, a crescente procura e, por outro lado, o nosso interesse em customizar ainda mais a experiência educativa das crianças.

John Leitão

CEO do Inspired Education Group em Portugal e no Norte da Europa

Vão apresentar um novo edifício. Esse investimento prende-se com o facto de Portugal ter cada vez mais imigrantes e, ao mesmo tempo, portugueses com carreiras internacionais ou a emigrarem?

A expansão do nosso campus prende-se com duas razões. Por um lado, a crescente procura e, por outro lado, o nosso interesse em customizar ainda mais a experiência educativa das crianças. Em concreto, do lado da procura, temos sentido uma procura cada vez maior de opções de ensino internacional. Há famílias inteiras a chegar a Portugal, mas também há pais portugueses que acreditam que o modelo de ensino internacional é uma boa experiência para os seus filhos.

Falou em customizar a experiência educativa. Quer concretizar?

Uma das nossas missões como instituição de ensino é customizar o máximo possível a experiência académica. Como referi, disponibilizamos dois rumos possíveis, entre o sistema de Cambridge ou o diploma IB. Até aqui, não tínhamos esta opção. Este novo edifício vai permitir ter estas duas opções. Isso permitirá a crianças com perfis diferentes escolher o percurso que melhor se adequa às suas necessidades e às suas características, tanto em termos das suas características inatas, como em termos dos seus objetivos de carreira, porque diferentes tipos de diploma aumentam ou reduzem a probabilidade de entrar em diferentes instituições de ensino.

No último ano letivo, o setor público em Portugal foi muito afetado pela falta de professores e por greves. Sente que o ensino privado tem vindo a beneficiar dessa circunstância? No vosso caso em particular, têm tido mais inscrições de alunos portugueses?

As estatísticas dizem-nos que o ensino privado aumentou ligeiramente a sua quota sobre o ensino público. Existe essa tendência macro de existirem cada vez mais famílias a optar pelo ensino privado. Isso é inegável. Se é derivado ou não das falhas do ensino público ou da crescente oferta e da valência do privado

As nossas escolas têm 70% de alunos nacionais e 30% de alunos internacionais, que perfazem mais de 50 nacionalidades. Sentimos cada vez mais um fluxo de pais internacionais a optarem por viver em Portugal.

John Leitão

CEO do Inspired Education Group em Portugal e no Norte da Europa

Mas nas vossas escolas em Portugal, qual é a percentagem de alunos portugueses?

Neste momento, as nossas escolas têm 70% de alunos nacionais e 30% de alunos internacionais, que perfazem mais de 50 nacionalidades. Sentimos cada vez mais um fluxo de pais internacionais a optarem por viver em Portugal. Aí já não tem que ver connosco, como escola, mas tem que ver com o próprio país. Portugal tem condições excecionais em termos de segurança, esperança média de vida e de condições climatéricas.

Os resultados do PISA apontaram para uma queda abrupta do desempenho dos alunos. Que reflexões devemos fazer sobre estes resultados?

Não me compete a mim avaliar a performance do ensino como um todo. Obviamente que me entristece, como português, que estejamos a perder no ranking nacional. Espero que nos próximos anos voltemos à trajetória positiva, que estávamos a ter há várias décadas. Como tudo o que é estatístico, isto pode ser uma situação que venha a ser corrigida nos próximos testes.

Voltemos ao edifício novo da PaRK International School. Qual é o investimento que estão a fazer com este edifício?

A PaRK International School é uma escola que tem três campus. Temos dois campus na Praça de Espanha e no Restelo. E temos um campus muito maior em Alfragide, onde temos até ao 12.º ano de escolaridade, que alberga hoje cerca de 1.200 a 1.300 alunos. Vamos aumentar a nossa capacidade em cerca de 600 alunos. O investimento é de cerca de 30 milhões de euros.

  • Diogo Simões
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