Os vencedores, os empatados e os derrotados das legislativas

O PSD ganhou as eleições, mas por margem mínima. O Chega registou uma noite histórica, enquanto o Livre cresceu e o ADN surpreendeu. Do lado dos derrotados ficaram o PS de Pedro Nuno Santos e a CDU.

Numa corrida renhida, a Aliança Democrática (AD) venceu, mas apenas por uma unha. O PS evitou a goleada que as sondagens à boca da urna faziam prever, mas não fugiu à derrocada face ao triunfo de 2022. A linha entre vencedor e derrotado nos primeiros dois lugares foi muito fina, deixando dúvidas até à contagem final. Em relação ao terceiro posto, no entanto, não existiu qualquer tipo de incerteza: o Chega foi o grande vencedor da noite, passando de 12 para 48 deputados.

Resultado positivo também do Livre, que quadruplicou a representação parlamentar. A vitória insólita pertenceu ao pouco conhecido ADN, que, por confusão de siglas ou outra razão ainda não visível, multiplicou os votos por dez, ultrapassando os 100 mil. Bloco, IL e PAN ficaram estacionados perto dos resultados de há dois anos. Do lado dos derrotados, além do PS, destaque para a CDU, que passa de seis para quatro lugares no Parlamento.

Os vencedores

Luís Montenegro (AD)

As sondagens divulgadas pelas televisões às 20h00 faziam prever uma vitória clara da AD (coligação PSD/CDS/PPM), com vantagem de cerca de 3 pontos percentuais face ao PS. Clara, mas não estrondosa, pois a combinação com as projeções para a IL não daria uma maioria absoluta para governação em coligação com os liberais sem obstáculos. Entre esse momento e o do final da contagem em território nacional (com 99,01% dos votos contados, faltam as dos círculos da Europa e fora da Europa) o cenário transformou-se de vitória confortável para uma obtida no tempo de compensação. Praticamente empatados em termos percentuais (29,49% da AD incluindo votos na Madeira vs. 28,66% do PS), a diferença de deputados está nos 2 (79 vs. 77). “Sempre disse que vencer as eleições era ter mais um voto e que só nessa circunstância assumiria funções de primeiro-ministro”, afirmou, no discurso de vitória.

Luís Montenegro e a AD estão entre os vencedores, porque ganharam as eleições e vão governar (embora sem maioria absoluta), mas a proximidade do resultado do PS e o salto gigante do Chega tiram muito brilho à vitória.

André Ventura (Chega)

“O Chega ganhou as eleições”, afirmou André Ventura, num discurso triunfante no Hotel Marriott em Lisboa. A declaração pode ser um exemplo da aptidão que o líder do Chega tem para a arte da hipérbole, mas desta vez não ficou muito longe da realidade. O partido de extrema-direita não venceu as eleições, claro, ficou em terceiro, mas foi sem dúvida o grande vencedor das legislativas. Capitalizando no voto de protesto, da anti-imigração e anticorrupção, o Chega disparou de 7,14% dos votos para 18,03%, passando de cerca de 382 mil votos para mais de 1,1 milhões. Em soma, vai ter 48 deputados na Assembleia da República, quatro vezes os 12 que elegeu em 2022.

Ventura não perdeu tempo e aproveitou logo a vitória, dizendo que “o Chega e ” PSD têm maioria absoluta nestas eleições” e “só um ato de grande irresponsabilidade pode afastar uma solução de Governo [à direita]”. Apontando ao futuro, vincou que poderá ser “daqui a seis meses, daqui a um ano ou daqui a dois anos, mas [o Chega] vai mesmo vencer as eleições legislativas em Portugal”.

Rui Tavares (Livre)

Após uma campanha que foi muito elogiada pelos comentadores, o Livre obteve um resultado positivo, quase triplicou o número de votos para perto de 200 mil e passou de partido com representante único em São Bento para grupo parlamentar com quatro deputados. Rui Tavares garantiu que “o Livre sabe crescer, crescer bem e com responsabilidade” e defende “as pessoas antes dos cargos” e que “há dez anos sabiam que seriam chamados a desempenhar um papel”.

O líder do Livre orgulhou-se de ter feito “uma campanha com propostas e não com divisão”, o que “pode ser tão ou mais eficaz que uma campanha baseada no medo”, num recado para o Chega. “É a grande lição que o Livre deixa desta campanha e para o futuro”, acrescentou.

Bruno Fialho (ADN)

Foi o fenómeno bizarro da noite. A Alternativa Democrática Nacional (ADN), pouco conhecida ou falada na campanha, teve 100.044 votos, o que compara com os 10 mil que colheu em 2022. Não conseguiu eleger um deputado, mas o resultado em si é uma vitória para o partido, provável fruto de uma semelhança de sigla com a AD ou de outro fator até agora não identificável.

Parabéns ao ADN, que foi o grande vencedor da noite. O ADN hoje já venceu”, disse Bruno Fialho, num discurso feito por volta das 00:15, na sede de campanha do partido, em Lisboa, imediatamente aplaudido pelos cerca de 15 apoiantes presentes. Com o resultado deste domingo, o partido passa a ter direito a receber subvenção pública para o seu financiamento, algo que está previsto a partir dos 50 mil votos, mesmo que não eleja qualquer deputado para a Assembleia da República.

Os empatados

Rui Rocha (IL)

O resultado dos liberais é um empate com sabor a vitória. O partido liderado por Rui Rocha aumentou ligeiramente o número e a percentagem de votos, mas manteve o mesmo grupo parlamentar com 8 membros. No entanto, o contexto muda tudo. Se há dois anos, num cenário de maioria absoluta do PS, o IL tinha pouca ou nenhuma influência real na governação, desta vez poderá ser o apoio que a AD deverá precisar para governar com alguma estabilidade.

“Não será pela IL que não haverá uma solução estável de governação”, garantiu o líder da IL. “Com o mesmo sentido de responsabilidade que tivermos de ir sozinhos, seremos responsáveis nos cenários que se venham a colocar”, acrescentou.

Mariana Mortágua (BE)

O Bloco de Esquerda obteve um resultado idêntico ao de janeiro de 2022: 4,46% dos votos, mantendo assim os 5 deputados no hemiciclo. Mariana Mortágua falou ainda antes da vitória da AD ser confirmada, portanto referiu a “situação ainda não totalmente clara” em termos de mandatos, mas sublinhou que apesar “desta viragem à direita” nas eleições de domingo, o partido “manteve-se firme” e teve mais “cerca de 30 mil votos”, continuando com os mesmos deputados.

A coordenadora do BE assegurou ainda que o partido será parte de uma “solução que afaste a direita do Governo”, considerando que a “inegável viragem à direita” é resultado da “política desastrosa” da maioria absoluta do PS. “Faremos exatamente o que dissemos que íamos fazer”, assegurou.

Inês Sousa Real (PAN)

O Pessoas, Animais, Natureza até aumentou a votação, acrescentando cerca de 30 mil votos e recolhendo 1,93% das escolhas. Não conseguiu, contudo, formar um grupo parlamentar, mantendo-se partido com representante único, neste caso Inês Sousa Real. Mesmo essa confirmação chegou bem tarde, às 23h30 de uma noite que terá certamente sido de nervos no quartel-general do partido, no edifício da Estação do Rossio.

Os derrotados

Pedro Nuno Santos (PS)

Uma derrota que podia ter sido pior. A tarefa de Pedro Nuno Santos não era fácil, tentar assegurar uma vitória após o colapso de um Governo de maioria absoluta socialista, após anos de desgaste e com pouco tempo para preparar a corrida. Ao início da noite, o resultado parecia refletir essas dificuldades, com o PS a ficar atrás da AD em todas as sondagens de boca de urna, com os máximos socialistas a tocarem apenas nos mínimos da coligação de centro-direita. Ora, à medida que os resultados foram sendo contados, foi mesmo esse cenário que transpareceu. No final, o PS ficou com 77 lugares no parlamento contra 79 da AD (incluindo os da Madeira).

Ainda assim, é impossível deixar Pedro Nuno Santos fora da lista dos derrotados. O PS perdeu a maioria absoluta, não conseguiu uma maioria relativa sequer, perdeu (por enquanto) 40 deputados e caiu de 41,68% dos votos para 28,66%. “Apesar da diferença tangencial, e sem desrespeito pelos votos das comunidades [emigrantes], tudo indica que o resultado não permitirá ao PS ser o partido mais votado”, assumiu o líder do PS.

Nova vida na oposição e o PS não vai “suportar um Governo de direita, vamo-nos renovar, renovar as pessoas, o programa, o partido, para criar uma nova maioria”, disse o líder, voltando a afirmar que “não inviabilizará um Governo” da AD, “não aprovaremos moções de rejeição, não obstaculizaremos a formação de um Governo”, porque “não podemos cair num impasse constitucional”.

Paulo Raimundo (CDU)

A CDU, coligação do PCP com o PEV, perdeu dois lugares no Parlamento, ficando agora com quatro, empatado com o Livre e atrás dos cinco do Bloco. Paulo Raimundo reconheceu que a perda de votos e de representação parlamentar na próxima legislatura é “um desenvolvimento negativo, mas não deixa de constituir uma importante expressão de resistência” da CDU. O líder comunista, que foi pela primeira vez a votos após substituir Jerónimo de Sousa, criticou ainda a “menorização” do partido, a “falsificação de posicionamentos do PCP” e os “preconceitos anticomunistas”.

“A história não acabou aqui, temos um longo caminho pela frente para percorrer”, acrescentou. Perspetivando uma vitória da AD, dramatizou que o novo quadro político irá “facilitar um caminho de retrocesso e de ataques a direitos e o favorecimento do grande capital”.

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