“Talento e crescimento não só rimam. Estão perfeitamente interligados”, alerta Nuno Amado

Nuno Amado, da Business Roundtable Portugal, defende que são precisas políticas pragmáticas e focadas na atração de talento para Portugal, a bem do desenvolvimento e crescimento do país.

Todos os anos, milhares de profissionais qualificados saem de Portugal, deixando as empresas que por cá operam com dificuldades sérias no recrutamento de trabalhadores. Para contrariar este cenário, os empregadores têm, sim, um papel, mas também as políticas públicas. Este retrato foi traçado esta segunda-feira por Nuno Amado, da direção da Associação Business Roundtable Portugal, que apelou, por isso, a políticas “não ideológicas”, mas pragmáticas e que se foquem neste tema, a bem do próprio desenvolvimento do país.

“O que precisamos são de políticas não ideológicas, nem preconceituosas. Precisamos de políticas pragmáticas, executáveis no curto prazo, que nos coloquem numa posição de competitividade com os restantes países, porque talento, desenvolvimento e crescimento não só rimam, como estão perfeitamente interligados. Precisamos de ter políticas mais focadas neste segmento”, sublinhou o também presidente do Millennium BCP, num evento sobre a valorização e atração de talento.

A propósito, Nuno Amado destacou que o regime dos residentes não habituais “estava a ganhar alguma força” (nomeadamente, na atração de talento estrangeiros), mas “foi cancelado, como o conhecemos”.

Por outro lado, o programa Regressar (que oferece um subsídio aos portugueses emigrados que queiram regressar ao país) tem “alguma dimensão”, mas ainda “é pequena“, face às necessidades do país.

Nuno Amado assinalou também que, na última década, o país perdeu mais de 700 mil pessoas para a emigração, o que veio agravar “o chamado inferno demográfico”. E esse não é um problema que tenha sido, entretanto, resolvido, alertou o mesmo. “Estamos a perder, por ano, 15 a 20 mil licenciados, e continuamos”, detalhou o responsável.

Para a Business Roundtable Portugal, uma das razões por detrás dessas saídas é o “aperto fiscal”. “Portugal é dos países que tem o tax wedge maior da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE)”, realçou Nuno Amado, referindo-se à fatia do custo total que as empresas têm com o fator trabalho que acaba nos cofres do Estado.

É urgente que se possa fazer o desagravamento deste aperto fiscal“, apelou o já mencionado membro da direção da associação. De notar que o alívio fiscal tem sido, repetidamente, defendido pelos empresários como forma, nomeadamente, de permitir que os salários subam, retendo trabalhadores no país.

Quanto ao que está nas mãos das empresas, a Business Roundtable Portugal apresentou vários exemplos esta tarde, como a criação de uma cultura empresarial vocacionada para a meritocracia, “suportada por uma avaliação de desempenho transparente e consequente, à importância da agilidade das organizações, são vários os exemplos apresentados”, e a aposta em as carreiras flexíveis em zig zag, que “abrem novas perspetivas a muitos quadros sem que tenham a necessidade de mudar de empresa para serem expostos a novos desafios e oportunidades”.

No encontro desta segunda-feira, também participou a especialista Laura Lindeman, que veio contar aos empresários portugueses o que os finlandeses estão a fazer para resolver a sua própria escassez de talento. A Portugal, a especialista deixou a recomendação de se começar por perceber porque é que as pessoas estão a emigrar, ainda que seja certo “que a resposta não seja simples” e envolverá várias partes. Ou seja, não dependerá apenas das políticas públicas, mas também dos empresários, e vice-versa.

Já Friedrich Kuhn, da consultora de talento Egon Zehnder, sublinhou que explicou que há quatro fatores que fazem das empresas, como conjunto, mais atrativas para o talento, dos quais, pelo menos, dois já têm presença comprovada em Lisboa: uma boa cena cultural, uma comunidade académica forte, empresas que invistam no futuro e uma comunidade de líderes focados no futuro (estas últimas duas são aqueles em que Portugal precisa ainda de trabalhar).

Da agilidade da organização ao sistema de carreiras

Várias das empresas portuguesas associadas à Business Roundtable têm testado iniciativas focadas na atração e retenção de talento, e os responsáveis aproveitaram o encontro desta segunda-feira para apresentar os primeiros resultados e recomendações.

No caso da Salvador Caetano, que se tem focado na construção de uma proposta de valor do empregador, Paula Arriscado explicou que o trabalho que tem sido feito permitiu perceber que, afinal, as empresas já “têm muitos benefícios, mas precisam de os estruturar e comunicar de forma mais eficaz” aos seus trabalhadores para o reter.

Já da parte dos CTT, que se tem dedicado à construção de um sistema de carreiras, Patrícia Durães salientou que é, cada vez mais “crítico” para os trabalhadores perceberem como podem evoluir na organização. “Traz uma grande motivação, mas também contribui para a produtividade”, salientou a responsável, que recomenda transparência às empresas que estejam interessadas em abraçar esta estratégia de sistema de carreiras.

Por outro lado, no caso da Altice, o foco tem sido a identificação de líderes, e Ana Gama Marques sublinhou, antes de mais, que “uma organização que premeia o mérito é mais sólida“. A responsável frisou ainda que, primeiro, há que definir os valores que queremos nas lideranças, a vários níveis.

Por sua vez, Margarida Uva, da Deloitte, que se tem dedicado à agilidade, sublinhou que o benefício dessa estratégia é “ter a capacidade de ouvir as pessoas e reter o melhor talento“. A responsável admitiu, neste caso, não há um modelo que sirva todas as organizações, mas recomendou olhar para os vários processos para perceber em quais é possível ser mais ágil.

Já da parte da Mind Alliance, que tem explorado a avaliação peer to peer, Raquel Sampaio defendeu que esta medida resulta num maior envolvimento do talento, mas também numa melhoria das relações interpessoais entre colegas. “Este tipo de avaliação não vai resultar para todas as equipas”, reconheceu, recomendando que as empresas comecem a testá-lo, primeiro, com grupos focados, só depois alargando o âmbito da iniciativa.

Atualizada às 17h08

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