Festivais de verão receberam em 2023 mais de meio milhão para serem mais “verdes”. Governo está a “rever instrumento”

Sê-lo Verde permitiu apoiar grandes eventos como festivais de musica com 553 mil euros para a adoção de práticas sustentáveis, mas o novo Governo não se compromete com a continuidade do programa.

O Vodafone Paredes de Coura, Rock in Rio Lisboa e o Meo Kalorama foram alguns dos beneficiários do programa Sê-lo Verde, do Fundo Ambiental, que visa apoiar os eventos de grande dimensão a adotarem práticas mais “verdes”. Ao todo, foram distribuídos no ano passado — quando o anterior Governo ainda estava em funções — verbas superiores a meio milhão de euros ao abrigo desta iniciativa, mas este ano o novo Executivo não garante a sua “continuidade”.

Ao ECO, o Ministério do Ambiente diz que está a “rever” e a “introduzir alterações” a este programa, “de modo a assegurar que as suas verbas são devidamente aplicadas em prol das políticas públicas de ambiente, ação climática e eficiência no uso dos recursos”. “A continuidade da presente medida e/ou os eventuais futuros contornos da mesma estão a ser avaliados num quadro mais amplo”, explica o ministério de Maria Graça Carvalho ao ECO. Este ano, não foram abertas candidaturas ao Sê-lo Verde.

Mas esta revisão será transversal a todo o Fundo Ambiental. Fonte oficial do Ministério do Ambiente revela ao ECO que o gabinete encontra-se atualmente a “avaliar em profundidade” este fundo – “incluindo os seus resultados” – para que possam “proceder às alterações que se venham a revelar necessárias para uma maior eficácia e transparência”. Estas alterações passam, desde logo, por “uma revisão e um reforço dos critérios de afetação de receitas e de controlo”, “monitorização e avaliação dos resultados” e, por outro lado, no sentido de dar uma maior visibilidade aos concursos e avisos lançados, divulgar os seus “benefícios e de resultados”.

Promotoras interessadas em (re)candidatar-se

Nascido em 2016, o Programa “Sê-lo Verde” é uma iniciativa do Ministério do Ambiente e do Fundo Ambiental, que pretende, entre outros objetivos, incentivar a adoção de critérios ambientais que contribuam, de modo efetivo, para uma redução dos impactes ambientais dos eventos e aumentem a utilização mais eficiente de recursos materiais e energéticos, nomeadamente festivais de música.

O Vodafone Paredes de Coura e o Meo Kalorama foram alguns dos eventos que beneficiaram deste programa que apoiou, em 2023, um total de 25 eventos, pelos quais foram distribuídos 553.943,60 euros. E, embora não esteja, para já, em cima da mesa a sua renovação, as promotoras destes festivais garantem que voltarão a recorrer dele assim que forem abertas as candidaturas.

“O Vodafone Paredes de Coura tem um compromisso com a sustentabilidade e o ambiente. Um princípio crucial e natural, tendo em conta o sítio magnífico e a paisagem natural onde o festival decorre”, respondem a Ritmos e Batidas ao ECO/Capital Verde, que revela ter concorrido a outras iniciativas internacionais semelhantes ao Sê-lo Verde que lhes permite tornar o festival mais “verde”.

epa10124535 Festival-goers during Paredes de Coura music festival, in Paredes de Coura, northern Portugal, 16 August 2022. The festival runs until 20 August. EPA/JOSE COELHOEPA/JOSE COELHO

A promotora recebeu um cheque de 40 mil euros do Fundo Ambiental, em 2023, que lhes permitiu implementar “19 medidas de sustentabilidade”, entre elas ecopontos de reciclagem, venda de copos reutilizáveis, e outras “medidas inovadoras” como um minimercado sem plástico ou um tapete de separação de resíduos. Ademais, criaram um manual de boas práticas, e doravante terão uma equipa no terreno de sensibilização ambiental e outra de apoio ao campista.

Já o Rock in Rio Lisboa, que este ano assinala a 20ª edição, pretendia voltar a recorrer do apoio este ano dado que a última vez que foi possível fazê-lo foi em 2018. Ora, este festival, que acontece a cada dois anos em Lisboa, não pode usufruir do Sê-lo Verde, em 2020, uma vez que pandemia obrigou a que a iniciativa do Fundo Ambiental e o próprio festival fossem adiados.

“Estamos a aguardar a publicação da portaria que regula o programa, e assim que seja lançado iremos sim candidatar-nos”, indicam ao Capital Verde. Tal não deverá acontecer este ano, mas mesmo sem o recurso ao apoio do Fundo Ambiental, a promotora do Rock in Rio Lisboa diz manter-se fiel ao seu compromisso com a sustentabilidade desde a sua primeira edição.

Rock In RioWikimedia Commons

“Desde então temos evoluído e assumimos vários compromissos”, refere ao ECO/Capital Verde Dora Palma, head de sustentabilidade do Rock in Rio. Desde logo, na promoção da mobilidade sustentável, cálculo e compensação da pegada carbónica (todas os concertos são compensadas e os artistas recebem um certificado com essa garantia) e uma gestão de resíduos que os permite ser um “evento zero resíduos em aterro”. Mas não só.

Em parceria com a Refood, o festival de música com origem no Rio de Janeiro também promove a doação de sobras alimentares. Tudo isto, permitiu que o Rock in Rio Lisboa ganhasse a certificação ISO 2012.

Por seu turno, o Meo Kalorama revela que, através do apoio de 40 mil euros que recebeu em 2023, conseguiu desmaterializar parte da comunicação, substituindo os suportes físicos por digitais, como mupis digitais, e promover “boas práticas”, como o cálculo da pegada carbónica do festival que “subsequentemente” é compensada. Mas não se ficou por aqui. Desde a primeira edição que a promotora se comprometeu em atingir uma taxa de reciclagem acima de 60% e garantir que 70% da energia fosse fornecida pela rede, “o que reduziu em muito a utilização de gasóleo”.

Mas reconhecendo que ainda “há espaço para melhorar”, o Meo Kalorama recorreu do Sê-lo Verde para reduzir “ainda mais” a pegada carbónica do evento.

Visita ao recinto da 2.ª edição do MEO Kalorama, que decorre de 31 de agosto a 02 de setembro no Parque da Bela Vista em Lisboa. 30 de agosto de 2023. MIGUEL A. LOPES/LUSAMIGUEL A. LOPES/LUSA

“Existe um impacto que precisa de ser medido e compensado, e este financiamento permite aos promotores de eventos trabalharem mais as suas iniciativas ambientais, poluir menos e compensar o inevitável. Sendo o MEO Kalorama um evento da Last Tour, encaramos como muito positivo que os governos se disponibilizem a impulsionar as boas práticas, através de ferramentas como o Sê-Lo Verde”, diz Dora Palma, diretora de sustentabilidade do MEO Kalorama. “Sempre que existirem iniciativas como o Sê-Lo Verde iremos candidatar-nos”, garante.

Já a Everything is New, promotora do festival Nos Alive, embora nunca tivesse recorrido deste apoio, admite ter intenções de o fazer no futuro caso for renovado, “preferencialmente com tempo para desenvolvimento de novas medidas que possamos aplicar no festival”.

A promotora explica ao ECO que nas edições passadas, aquele que é considerado o maior festival de verão em Portugal, não teve oportunidade de se candidatar a este programa devido aos prazos e aos critérios definidos.

O aviso do programa foi lançado com o prazo de apenas um mês para desenvolvimento e apresentação da candidatura”, revela a Everything is New, admitindo ter tido “dificuldade em identificar medidas inovadoras”, para além das que já estavam a ser praticadas, “que fossem de relevo e de acordo com os requisitos do programa”.

Nos últimos 16 anos, o Nos Alive tem procurado adotar as melhores práticas, desde a gestão de resíduos, promovendo a reciclagem e a recolha de biorresíduos para a compostagem, reutilização de materiais e equipamentos e promovendo, também, a mobilidade sustentável através de parcerias com redes de transportes públicos, serviços de mobilidade suave e postos de carregadores.

Ademais, procurou-se reduzir o consumo de energia fóssil através da instalação de 5 postos de transformação fixos para aumento da utilização da energia elétrica da rede, sendo que, da energia consumida no festival, 90% já é rede pública.

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