Descida dos juros vai contribuir para que Portugal “continue a registar taxas de crescimento razoáveis”
O administrador financeiro do BCP, Miguel Bragança, espera "um alívio das condições financeiras, que deverá contribuir para um maior dinamismo do consumo privado e do investimento".
Miguel Bragança, administrador financeiro do BCP, é um dos nomeados na categoria de melhor CFO nos Investor Relations and Governance Awards 2024, uma iniciativa da consultora Deloitte. Em resposta por escrito a questões do ECO, o gestor afirma que o contexto de subida das taxas de juro obrigou o banco a adaptar os produtos e serviços, mas espera agora um alívio na política monetária do BCE, que “deverá contribuir para um maior dinamismo do consumo privado e do investimento”.
A persistência de taxas de juro mais elevadas por mais tempo é o principal desafio que os CFO irão enfrentar este ano? Que outros destacaria?
Uma equipa de gestão, da qual o CFO é parte integrante, enfrenta constantes desafios, sendo por isso muito importante para o exercício das suas funções garantir que tem à sua disposição os dados que permitam tomar decisões informadas sobretudo em contextos de incerteza, como o que vivemos atualmente.
Ao longo dos últimos anos vivemos um período prolongado de taxas de juro negativas, que não espelham o normal funcionamento dos mercados. Não me recordo de ter tido contacto nos compêndios de macroeconomia com cenários de taxas de juro nominais negativas, pelo que foi necessário encontrar novas formas de gerir uma entidade financeira num contexto extremamente desafiante. Importa recordar que as taxas de juro de facilidade permanente de depósitos do BCE entraram em terreno negativo em 2014 tendo atingido o valor de -0,5% em 2019, passando apenas para terreno positivo na 2ª metade de 2022, atingindo valor máximo de 4% em setembro de 2023. Assim, o que se verificou com a subida das taxas de juro, deve ser encarado como a sua normalização progressiva.
De qualquer forma, o cenário que está implícito nas curvas de taxa de juro de mercado é de alguma redução dos atuais níveis dentro dum contexto de normalidade, o que deverá aliviar o esforço financeiro das famílias e empresas.
Em qualquer caso, o contexto de incerteza tenderá a manter-se, visto a globalização condicionar a atividade e decisões dos agentes económicos, através de fatores exógenos, como sejam a instabilidade geopolítica no médio oriente, a persistente guerra entre a Ucrânia e a Rússia, bem as alterações de modelos de negócio associadas aos desenvolvimentos tecnológicos.
Enquanto CFO de um Banco não deixa de ser importante referir que ao longo dos últimos anos, e em 2023 em particular, o sistema bancário mostrou ser muito resiliente perante a turbulência enfrentada por força da gestão cuidadosa dos diferentes riscos, incluindo os de crédito e os desafios pontuais de acesso aos mercados, até pelas dificuldades pontuais enfrentadas por outros sistemas bancários.
Como é que o banco se adaptou a este contexto de taxas de juro mais altas? Foi necessário cortar custos?
Como acima comentado, este nível de taxas de juro reflete essencialmente a sua normalização. Para uma instituição financeira, diria que as maiores preocupações associadas à subida das taxas de juro são o acompanhamento e monitorização do risco de crédito de particulares e empresas assim como a gestão integrada de ativos e passivos, garantindo também um adequado equilíbrio entre os objetivos de rentabilidade e o contributo para o crescimento da franquia e para a economia.
Enquanto responsável financeiro de um banco, que tem como objetivo proteger os depositantes, simultaneamente concedendo crédito sustentável às famílias e empresas, tivemos de adaptar as diferentes soluções de produtos e serviços a este novo contexto de taxas de juro bem como as necessidades particulares dos diferentes segmentos de clientes garantindo a gestão adequada dos riscos de taxa de juro e liquidez.
Prevê um alívio nas condições financeiras ainda este ano?
Atualmente, as previsões dos investidores e as indicações dadas pelo BCE sugerem que o ciclo de redução de taxas de juro se irá iniciar nos próximos meses. Neste contexto, é expectável um alívio das condições financeiras que deverá contribuir para um maior dinamismo do consumo privado e do investimento e, por conseguinte, para que a economia portuguesa continue a registar taxas de crescimento razoáveis nos próximos trimestres.
Que impacto é que os avanços na inteligência artificial poderão ter no negócio?
Acredito que a adequada utilização de novas tecnologias é um dos principais temas da atualidade com benefícios significativos, quer para as empresas quer para os consumidores, ao nível da qualidade das decisões e dos ganhos de produtividade. A inteligência artificial, que alavanca uma crescente capacidade analítica de dados, permite acréscimos de produtividade ao automatizar um vasto conjunto de operações e rotinas e antecipar necessidades específicas dos clientes, gerando propostas individualizadas num curto espaço de tempo.
Como é que os temas do ESG estão a mudar o papel dos CFO?
Os temas ESG são muito relevantes para as instituições e não podem ser reduzidos a uma mera obrigação regulamentar. A preocupação das empresas com os temas ambientais, sociais e de governance deve ser encarada como uma necessidade de desenvolvimento das mesmas, garantindo desta forma a sua sustentabilidade no futuro. Importa assim aplicar medidas adequadas que visam, não apenas cumprir com os requisitos regulatórios, mas que garantam a sustentabilidade ambiental, a intervenção na sociedade, bem como a aplicação das práticas mais adequadas em termos de governo das sociedades.
O BCP tem-se assumido como um protagonista no processo de transição energética no setor financeiro com diferentes iniciativas, por exemplo, com a implementação de uma central fotovoltaica nas instalações onde funcionam os serviços centrais do TagusPark. Posteriormente, o Banco passou a utilizar 100% de energia verde nas suas instalações em Portugal, tanto nos serviços centrais como nas sucursais, num mix de energia produzida pela central fotovoltaica e de energia adquirida com certificados de origem renovável. O consumo de energia verde faz parte do Plano de Sustentabilidade do Banco, que contempla, entre outros, a redução contínua dos consumos de água e papel em todo o mundo. No global, as medidas de sustentabilidade adotadas ao longo dos últimos cinco anos permitiram ao Banco reduzir o consumo de energia em cerca de 60%.
Em todo o caso, gostaria de salientar a integração total destes temas no plano estratégico do banco, que inclui iniciativas que visam antecipar os riscos para o cliente das alterações climáticas e apoiá-lo na respetiva minimização.
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