Contexto de imprevisibilidade obriga ‘investor relations’ a estarem ainda mais presentes
Bernardo Collaço, responsável pelas relações com investidores do BCP, destaca a crescente colaboração com equipas de ESG. Avanços tecnológicos, como a inteligência artificial, trazem novas exigências.
Bernardo Collaço, investor relations officer (IRO) do Millennium bcp, afirma que o atual contexto de grande imprevisibilidade obriga as equipas a estarem “ainda mais presentes e próximas dos intervenientes de mercado”.
Nomeado para o prémio de melhor responsável pela relação com investidores na 36.ª edição dos Investor Relations and Governance Awards, uma iniciativa da Deloitte, afirma que o maior desafio é a “construção de relações de confiança”. Colaboração com as equipas de sustentabilidade é crescente.
A evolução da política monetária e o crescente risco geopolítico têm contribuído para uma maior volatilidade nos mercados financeiros. Que desafios coloca este contexto à gestão da relação com os investidores?
A função de investor relations (IR) tem múltiplos desafios e a atual instabilidade relacionada com a evolução da política monetária e com os riscos geopolíticos que têm condicionado e gerado volatilidade nos mercados financeiros são um bom exemplo. No caso do BCP, tratando-se de uma empresa de capitais abertos listada numa bolsa de valores, o papel-chave do IR no seu relacionamento com o mercado de capitais baseia-se, por isso, no desenvolvimento de um capital de confiança, assente numa comunicação eficaz, que deverá contribuir para uma avaliação justa com base nos seus fundamentais, alinhando as expetativas dos investidores com as perspetivas da empresa, tendo presente o contexto em que opera e os potenciais impactos decorrentes dessa instabilidade.
O IR enquanto representante de uma instituição no mercado de capitais, tem de garantir o cumprimento dos princípios de equidade e proporcionalidade no acesso a informação por parte de stakeholders e investidores, mantendo um canal aberto e permanente de comunicação, fornecendo informação completa e de qualidade, rigorosa e oportuna, de modo a que a comunidade financeira tenha acesso ao desenvolvimento da atividade da empresa e estratégia de gestão delineada, permitindo desta forma aos investidores a tomada de decisões adequadas às suas avaliações e expetativas
Que outros desafios enfrentam hoje os IRO na relação com os investidores?
Sendo o IRO responsável pela relação com investidores e cabendo-lhe um papel determinante no sucesso e desenvolvimento de uma organização, o maior desafio prende-se sempre com a construção de relações de confiança que assentam forçosamente na forma como interagimos com os diferentes stakeholders e que tem de estar baseada numa comunicação eficaz, transparente e consistente, permitindo uma relação duradoura. O atual contexto de grande imprevisibilidade que vivemos, obriga a que as equipas de IR estejam ainda mais presentes e próximas dos intervenientes de mercado.
Contudo se tivesse de elencar outros grandes desafios que as equipas de IR têm nos dias de hoje salientaria os avanços tecnológicos, sobretudo os desenvolvimentos e utilização de inteligência artificial bem como a carga regulatória como alguns dos grandes desafios que obrigam a uma atenção especial.
Considera que as crescentes exigências regulatórias e de compliance são necessárias ou a sua complexidade é um entrave à atração de capital e ao desenvolvimento dos mercados?
As crescentes exigências regulatórias e de compliance devem ser interpretadas como positivas no sentido que visam manter a integridade e a estabilidade dos mercados financeiros.
O quadro regulamentar garante que os investidores estejam protegidos contra atividades fraudulentas, manipulação de mercado e abuso de informação privilegiada promovendo a transparência nos mercados financeiros que visam aumentar a confiança dos investidores e a eficiência dos mercados. Contudo, a complexidade do quadro regulamentar, apesar de considerar que não constitui um entrave à atração de capital gera algumas dificuldades às empresas, que têm de suportar elevados custos para garantir que estão a desenvolver a sua atividade em conformidade com os requisitos regulatórios.
Que impacto pode vir a ter a inteligência artificial no trabalho de um IRO?
A inteligência artificial desde há muito que tem vindo a ser utilizada nos mercados de capitais, através de algoritmos que visam, com base nos movimentos de vários ativos financeiros tomar decisões de investimento. Conforme referido anteriormente, sou de opinião que os avanços tecnológicos são um grande desafio mas simultaneamente uma oportunidade não apenas para as equipas de Investor Relations, mas para os mercados em geral. Acredito que tendo estas áreas como base de trabalho o tratamento de muitos dados, que a aplicação de tecnologia que permita retirar algumas tarefas das equipas seja vantajosa, permitindo desta forma que as equipas de IR estejam mais focadas em atividades de valor acrescentado, nomeadamente na criação de relações de confiança com investidores, reguladores, agências de rating e demais stakeholders.
Como é que os temas do ESG já estão a mudar o papel dos IRO e vão fazê-lo no futuro?
Considero que os temas ESG são muito relevantes e têm vindo a assumir um papel cada vez mais relevante nas organizações. Não apenas porque existem requisitos regulamentares ou porque é um nice to have, mas sim porque devem ser encarados pelas empresas como uma garantia de sustentabilidade no futuro. Do ponto de vista das equipas de IR é inequívoco que existe um crescente interesse dos investidores em conhecer o desempenho ambiental, social e de governance (ESG) das empresas em que investem. Alguns investidores têm critérios de investimento com métricas de ESG ou só investem em empresas com determinado score em termos de ESG.
Questões como risco climático financeiro, alterações climáticas, transição energética, práticas fiscais responsáveis, financiamento responsável e investimento de impacto não faziam parte das preocupações dos investidores até há poucos anos, mas estão atualmente na ordem do dia. E não apenas na perspetiva dos reguladores. A forma como as empresas respondem proactivamente às questões de ESG e às expectativas dos seus investidores tem uma correlação positiva com o custo de capital das empresas.
Os IRO estão têm expandido as suas competências ao longo do tempo, incluindo o foco no digital, na sustentabilidade e também no compliance. É cada vez mais comum, os IRO no âmbito das suas funções terem de responder a questões sobe estes temas, os quais são presença habitual nas questões de due diligence de programas ou emissões de dívida.
A crescente colaboração entre as equipas de Relações com Investidores e as equipas de ESG é também uma evidência, dada a relevância crescente deste tema para os investidores.
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