Os CTT passaram a ter uma empresa espanhola como maior acionista e a Greenvolt é controlada por uma firma dos EUA. As participações qualificadas detidas por estrangeiros somam 26 mil milhões de euros.
Determinar com precisão a origem geográfica dos acionistas das cotadas do PSI é uma tarefa complicada tendo em conta a escassez de informação divulgada pelas companhias, mas é uma evidência que o peso dos investidores estrangeiros está a ganhar cada vez mais preponderância e relevância na bolsa nacional, sobretudo nas participações qualificadas e posições de controlo.
Duas operações concretizadas este ano reforçam esta dinâmica que teve a expressão máxima quando investidores chineses compraram diversas participações que permitiram alcançar o estatuto de maiores acionistas em empresas de peso no PSI. Investidores de outras nacionalidades têm nos últimos anos adquiridos posições relevantes noutras companhias, desequilibrando a relação de força com acionistas portugueses.
A Global Portfolio Investments, holding financeira da espanhola Indumenta Pueri, que por sua vez é a dona da fabricante de roupa infantil Mayoral, anunciou recentemente que superou a fasquia de 15% no capital dos CTT, assumindo assim o estatuto de maior acionista dos Correios, uma posição que era ocupada pelos portugueses da Manuel Champalimaud SGPS (13,72%). A companhia espanhola chegou à liderança da estrutura acionista dos CTT de forma discreta e prolongada, pois assumiu uma posição de 5% em 2017 e reforçou para mais de 10% em 2020.
A Greenvolt é a outra cotada do PSI que registou recentemente uma alteração da nacionalidade do seu acionista de topo, sendo que neste caso verificou-se também uma alteração de controlo. Os norte-americanos da Kohlberg Kravis Roberts (KKR) lançaram uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre a companhia de energias verdes e já controlam 82% do capital, assumindo a liderança de uma cotada que era dominada por capital português (Paulo Fernandes, João Oliveira e outros sócios).
Após estas duas operações, são já seis as cotadas do PSI que têm, direta ou indiretamente, investidores estrangeiros como maiores acionistas. As duas cotadas do Grupo EDP passaram a ser controladas pela China Three Gorges (CTG) na última fase de privatização em 2011 e a REN também passou a ter um investidor chinês como acionista de referência quando a State Grid comprou ao Estado português uma parcela de 25% em 2012. O BCP tem nos chineses da Fosun o maior acionista e completa o lote das cotadas nacionais com maiores acionistas de capital estrangeiro.
Participações qualificadas estrangeiras valem 26 mil milhões
A maioria das cotadas do PSI ainda mantém os maiores acionistas com capital português, mas o mesmo já não se pode dizer quando se analisam as participações qualificadas. Somando o valor de todas as posições acionistas superiores a 5% detidas por estrangeiros, é bem superior ao montante que corresponde a acionistas de capital português.
Segundo cálculos do ECO, as ações dos acionistas estrangeiros com participações qualificadas em cotadas portuguesas (ou acima de 2% quando reveladas pelas companhias) estão avaliadas em bolsa em cerca de 26 mil milhões de euros, bem acima do valor atribuído às posições controladas por investidores portugueses (17,7 mil milhões de euros) com o mesmo estatuto.
Assumindo como universo apenas as participações qualificadas, que são as que realmente mandam na gestão das companhias para efeitos de gestão e decisões estratégicas, o capital estrangeiro tem um peso de 59%, o que o ilustra o peso cada vez mais diminuto dos acionistas portugueses (41%).
Tendo em conta a capitalização bolsista total das 16 empresas do PSI (74,3 mil milhões de euros), as participações não qualificadas (inferiores a 5%) estão avaliadas no mercado em 30,5 mil milhões de euros, o que corresponde a 41% do total. Neste bolo, os acionistas estrangeiros representam 35% e os portugueses 24%.
Entre as participações qualificadas dos acionistas estrangeiros, os chineses estão em grande destaque, representando mais de metade do total. As posições da CTG no Grupo EDP, da Fosun no BCP, da State Grid da REN e da China Communications Construction (CCC) na Mota-Engil estão avaliadas em perto de 15 mil milhões de euros.
Entre as posições dos acionistas portugueses, a maior é a da família Soares dos Santos, com a posição de controlo na Jerónimo Martins avaliada em 6,9 mil milhões de euros. Apenas mais três participações qualificadas têm um valor superior a mil milhões de euros: a da família Amorim na Galp Energia (2,9 mil milhões de euros), da Semapa na Navigator (2,9 mil milhões de euros) e da Parpública na petrolífera (1,2 mil milhões de euros).
Portugueses afastados das grandes empresas
Depois do patamar mínimo da obrigatoriedade de comunicação das participações qualificadas ter sido elevado de 2% para 5% em 2022, ficou ainda mais complicado identificar a origem geográfica do capital das cotadas portuguesas. Acresce que são escassas as companhias que discriminam esta informação nos seus relatórios e contas, impossibilitando determinar com exatidão a parcela do capital das cotadas do PSI que é detida por acionistas estrangeiros.
Contudo, é garantido que será muito superior aos 35% apurados tendo em conta a contabilização das participações qualificadas. Uma fatia considerável do “free float” das empresas portuguesas estará na posse de investidores institucionais, que são sobretudo estrangeiros (fundos de investimento, gestão de ativos, fundos de pensões e outros investidores).
Basta olhar para a distribuição geográfica da estrutura acionista de empresas que divulgam esta informação, como é o caso da EDP e da Galp Energia. Os acionistas portugueses são sobretudo famílias que controlam as empresas por forma direta ou indireta. Destacam-se as famílias Soares dos Santos (Jerónimo Martins), Amorim (Galp Energia e Corticeira Amorim), Azevedo (Sonae e Nos), Queiroz Pereira (Navigator e Semapa) e Mota (Mota-Engil). Só nesta listagem estão metade das empresas do PSI, sendo que a Ibersol e a Altri também têm acionistas portugueses de referência.
Já a EDP, EDP Renováveis e BCP não têm qualquer acionista português com participações qualificadas. A elétrica portuguesa, que é a cotada portuguesa mais valiosa (14,8 mil milhões de euros), tem apenas 7% do capital nas mãos de acionistas portugueses, isto apesar da participação massiva dos pequenos investidores nas diversas fases de privatização da companhia. Na EDP Renováveis o peso do capital português é de 5%.
O BCP é outra das cotadas nacionais com uma base alargada de pequenos investidores, sendo que no caso do banco o peso do capital português ainda é significativo (26,2%). A única instituição financeira do PSI chegou ao final de 2023 com perto de 130 mil acionistas, sendo que os investidores individuais controlavam 21,4% do capital. Os 308 investidores institucionais detinham uma posição pouco superior (24,49%).
Mesmo nas empresas onde o maior acionista é português, a presença de mais investidores portugueses é escassa. A Galp Energia é o melhor exemplo, pois o capital português tem um peso de apenas 0,4% entre os investidores institucionais, que em conjunto detêm mais de metade do capital da petrolífera.
Esta conclusão de que o capital estrangeiro tem ganhado peso no mercado nacional é reforçada pelo número elevado de companhias que seguiu o caminho que deverá ser percorrido agora pela Greenvolt: abandonar a Bolsa portuguesa após aquisições por parte de firmas estrangeiras. Foi o que aconteceu com a Cimpor, Banco BPI e Luz Saúde, sendo que a Brisa só passou para capital estrangeiro a 100% já quando não tinha ações dispersas em bolsa.
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Estrangeiros já “mandam” em mais de metade do PSI
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