Obrigações da SIC rendem pouco mais de 4% na carteira dos pequenos investidores

Apesar de pagarem 5,95%, a rendibilidade que os pequenos investidores retiram do investimento nas novas obrigações da SIC é fortemente impactada pelas comissões de negociação e pelos impostos.

A SIC é a sexta empresa este ano a recorrer aos pequenos investidores para se financiar por via de um empréstimo obrigacionista. Depois da Greenvolt, das sociedades anónimas desportivas do Sporting e do Benfica, da Vista Alegre e da CUF, agora é a vez da estação televisiva de Francisco Pinto Balsemão lançar uma operação de subscrição pública de obrigações (OPS), associada também a uma oferta pública de troca (OPT), no valor de 30 milhões de euros.

Para convencer os pequenos investidos a comprarem as “Obrigações Ligadas a sustentabilidade SIC 2024-2028” (“Obrigações SIC 2024-2028”), a SIC compromete-se a pagar uma taxa de cupão de 5,95%, com juros pagos semestralmente, durante quatro anos, segundo o prospeto da operação. No entanto, para o bolso dos pequenos investidores, o ganho que podem ambicionar com este investimento está longe destes números.

Não por culpa da SIC, que por cada 100 obrigações (que se traduz num investimento de 3.000 euros) paga 178,5 euros de “juros”, mas por conta das comissões bancárias cobradas pelos intermediários financeiros e dos impostos que seguem para os cofres do Fisco.

O potencial de ganho gerado pelo investimento nas “Obrigações SIC 2024-2028” está significativamente condicionado pelas comissões bancárias e pelos impostos, podendo reduzir a taxa interna de rendibilidade líquida para valores próximos de 1% ou até mesmo resultar em perdas.

Por exemplo, um investidor que não tenha outros ativos bolsistas e pretenda investir apenas 1.500 euros (montante mínimo permitido) através da aquisição de 50 destas obrigações, não deverá esperar alcançar uma taxa interna de rendibilidade (TIR) líquida de impostos e encargos muito acima de 1%, segundo contas do ECO com base nos preçários dos 12 bancos colocadores do empréstimo obrigacionista SIC, que tem como acionista único o grupo Impresa. E há mesmo casos em que através do investimento mínimo o investidor acaba por ter perdas, dado o impacto das comissões, como também alerta a SIC no prospeto da operação.

“Considerando a generalidade dos preçários dos intermediários financeiros, o investimento poderá não ter rendibilidade positiva para investidores que subscrevam apenas 50 ‘Obrigações SIC 2024-2028’ e queiram mantê-las até à maturidade se não tiverem outros valores mobiliários registados na mesma conta de registo”, lê-se no documento que rege o empréstimo obrigacionista.

É certo que, quanto maior o montante investido mais as comissões fixas, como a custódia de títulos, se diluem, aumentando assim a TIR do investimento. No entanto, mesmo assim, o máximo que um pequeno investidor sem uma carteira de ativos financeiros poderá ambicionar ganhar com as “Obrigações SIC 2024-2028” é uma TIR em redor dos 4%, e isso apenas para investimentos realizados através da internet e acima dos 30 mil euros – ou então para montantes mais baixos não considerando o efeito da comissão de custódia de títulos por já ser titular de uma carteira de investimentos.

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Como esta emissão obrigacionista está associada ao cumprimento de dois requisitos de sustentabilidade, a remuneração dos títulos poderá ter um acrescento de 0,4 pontos percentuais caso a SIC não consiga cumprir duas metas a que se comprometeu alcançar nos próximos anos em duas matérias:

  • Número de horas anuais de conteúdos com língua gestual portuguesa disponibilizados nos serviços de programas televisivos da SIC e na plataforma de streaming da SIC
  • Reduzir em 30% as emissões de gases com efeito de estufa das suas operações até 31 de dezembro de 2027

Para os atuais obrigacionistas da SIC, que há três anos adquiriram as “Obrigações SIC 2021-2025”, a proposta de troca desses títulos pelas novas obrigações pode também ser tentadora.

Desde logo porque as novas obrigações carregam uma taxa de cupão 2 pontos percentuais acima da taxa de cupão dos anteriores títulos de dívida. Mas essa não é a única conta nem a única análise que os investidores devem fazer antes de se tornarem credores da SIC.

Calcular o risco do investimento

Ao tornarem-se obrigacionistas de uma empresa, os investidores enfrentam uma série de riscos associados ao simples facto de se emprestar dinheiro a uma entidade. Entre esses riscos está, por exemplo, o risco de crédito e de perdas de imparidade que advém da incapacidade de uma ou mais partes da empresa cumprir com as suas obrigações contratuais.

Mas também o risco de liquidez de o emitente, neste caso a SIC, não ter capacidade para cumprir com as suas obrigações com os obrigacionistas, quer seja no pagamento dos cupões nas datas previstas como no reembolso do principal da obrigação a 3 de julho de 2028.

Uma forma de avaliar estes e outros riscos de uma obrigação é dada pela notação de risco creditício, que é medida numa escala internacional e que é conferida pelas agências de rating como a Fitch, a Moody’s ou a S&P. No entanto, no caso das “Obrigações SIC 2024-2028”, como a empresa não dispõe de uma notação de risco, os títulos de dívida também não.

Essa situação não facilita a análise dos investidores, mas também não torna essa tarefa numa missão impossível. No prospeto que acompanha o empréstimo obrigacionista é possível identificar uma série de riscos que os potenciais compradores destes títulos devem ter consciência como, por exemplo:

  1. Dependência da Publicidade: A SIC é uma empresa de comunicação social que opera num mercado altamente competitivo, onde a liderança de audiências é crucial para gerar receitas de publicidade. Em 2023, as receitas provenientes da publicidade representaram 68% dos proveitos operacionais consolidados da SIC, ascendendo a 106,8 milhões de euros. No entanto, trata-se de uma queda de 0,9% face aos números registados em 2022. A capacidade da SIC para manter e aumentar as suas receitas publicitárias depende significativamente da sua posição nas audiências. E, recentemente, a SIC perdeu a liderança das audiências para a TVI que detinha desde fevereiro de 2019, o que representa um risco para a evolução do negócio. Esta perda de liderança pode diminuir a atratividade da SIC para os anunciantes, resultando numa redução das receitas de publicidade.
  2. Estrutura financeira pouco robusta: A análise das demonstrações financeiras da SIC revela uma operação com grandes desafios de gestão de liquidez. No final do ano passado, o passivo corrente da SIC era de 95,5 milhões de euros, mais do dobro dos 46,5 milhões de euros que a empresa apresentava como ativo corrente. Esta discrepância de valores indica que a SIC pode enfrentar dificuldades em cumprir as suas obrigações de curto prazo, especialmente se não conseguir gerar fluxos de caixa suficientes a partir das suas operações, como a própria empresa reconhece no prospeto.
  3. Incertezas regulatórias: A SIC opera sob um quadro regulatório que pode mudar, afetando potencialmente a sua capacidade de gerar receitas. Alterações nas regras aplicáveis à publicidade ou à gama de numeração “760” podem reduzir as receitas que a SIC gera a partir de concursos e passatempos televisivos, que constituíram a terceira maior fonte de receitas da empresa em 2023, com um total de 10,7 milhões de euros.
  4. Vulnerabilidade a fatores externos: A SIC também está sujeita a riscos derivados de fatores externos, como a concorrência intensa e a necessidade de inovação constante. A empresa fundada por Francisco Pinto Balsemão há 31 anos deve continuar a produzir ou adquirir conteúdos que atraiam uma audiência ampla e diversificada para manter a sua posição no mercado. Qualquer incapacidade de oferecer conteúdos atrativos pode resultar numa diminuição das audiências e, consequentemente, das receitas publicitárias.

No folheto comercial deste empréstimo obrigacionista, que conta com a imagem de algumas caras conhecidas da estação televisiva como a atriz Júlia Palha e os apresentadores João Baião e Diana Chaves, a SIC convida os investidores a serem “o novo protagonista da SIC”, instando-os com a mensagem: “subscreva e/ou troque e ganhe 5,95% ao ano”.

Esta proposta surge como uma oportunidade apelativa à primeira vista, especialmente pela taxa de cupão apresentada. No entanto, os pequenos investidores devem abordar este investimento com cautela.

O potencial de ganho gerado pelo investimento nas “Obrigações SIC 2024-2028” está significativamente condicionado pelas comissões bancárias e pelos impostos, podendo reduzir a taxa interna de rendibilidade líquida para valores próximos de 1% ou até mesmo resultar em perdas, dependendo do montante do investimento e do intermediário financeiro que recorrem para comprarem os títulos.

O cenário financeiro da SIC também não é isento de riscos. A dependência das receitas publicitárias, os desafios que enfrenta atualmente a estrutura financeira da empresa são fatores que podem impactar negativamente a capacidade da empresa cumprir com as suas obrigações.

Para os atuais obrigacionistas da SIC, a oferta de troca pode parecer tentadora devido à taxa de cupão superior. Contudo, é essencial que cada investidor avalie minuciosamente o risco envolvido e considere se a remuneração proposta compensa os potenciais risco. E para fazer essa avaliação é essencial ler com atenção o prospeto da emissão, consultar os últimos relatórios e contas da Impresa, fazer a sua própria pesquisa, e procurar junto do seu intermediário financeiro uma simulação do investimento que pretende realizar.

Ficha técnica das “Obrigações SIC 2024-2028”

  • Nome: Obrigações SIC 2024-2028
  • ISIN: PTSINCOM0001
  • Valor nominal: 30 euros
  • Investimento mínimo: 1.500 euros
  • Taxa de cupão: 5,95%
  • Prazo de subscrição: Entre 17 e 28 de junho
  • Data de reembolso: 3 de julho de 2028
  • Juros: O pagamento dos cupões será realizado semestralmente a 3 de janeiro e 3 de julho de cada ano
  • Admissão: As obrigações serão admitidas à negociação na Euronext Lisboa após serem conhecidos os resultados da emissão
  • Emissão: 30 milhões de euros que se traduzem em 71,65 milhões de euros após descontar os encargos da emissão. No entanto, a empresa pode aumentar a emissão até 26 de junho, fazendo uma adenda ao prospeto.

Nota: A análise do ECO à nova emissão obrigacionista da SIC não dispensa a consulta do prospeto da operação.

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