Qualificações dos jovens não estão a ter o efeito de elevador social esperado
Estudo do ISCTE revela que o maior acesso a diplomas "não quebrou a reprodução da situação social de origem” e que as mulheres ganham menos do que os homens à entrada no mercado laboral.
O mercado de trabalho está a agravar as desigualdades sociais entre os jovens, revela um estudo divulgado esta sexta-feira, no qual se alerta que o aumento das qualificações não está a ter o efeito de elevador social esperado.
“O que mais inquieta neste estudo é que evidencia uma desigualdade estrutural entre os jovens, sugerindo que se distinguem no mercado de trabalho consoante a sua condição de classe“, defende o investigador do ISCTE Renato Miguel do Carmo, que coordenou o trabalho.
É a partir da condição social que os jovens “experimentam distintamente” o mundo do trabalho e a exposição a “graus variáveis” de desemprego, desproteção social e precariedade laboral.
“As habilitações literárias dos pais são atributos, não só geradores de diferenciação social, mas produtores de fortes níveis de desigualdade entre os jovens“, refere um documento de apresentação do estudo “Os Jovens e o Trabalho em Portugal – Desigualdades, (Des)Proteção e Futuro”.
A maioria dos jovens de famílias com menos recursos, sobretudo do interior do país, fica limitada a “trabalhos mal pagos e a empregos mais precários”, o que faz com que fiquem mais tempo dependentes da família e dos amigos.
Renato Miguel do Carmo, coordenador do Observatório das Desigualdades, nota que o maior acesso a diplomas “não quebrou a reprodução da situação social de origem”.
O inquérito desenvolvido por uma equipa de investigadores permitiu identificar um elevado número de jovens (63%) que atravessou períodos de desemprego sem qualquer proteção social ou resposta institucional.
Os resultados deram origem a um livro, a publicar na próxima semana, no qual são propostas duas linhas políticas para atacar os problemas: “alargar o Estado social a esta franja da população” e aumentar os salários e a proteção social no emprego.
Além da origem social, também o género marca a entrada no mercado de trabalho, com as mulheres a ganharem “significativamente menos do que os homens”, o que leva a que muitas tenham necessidade de ter mais do que um emprego. Em regra, segundo os investigadores, um licenciado ganha mais do que uma mulher com mestrado ou doutoramento.
“O mercado de trabalho vinca a desigualdade de género que se vive em Portugal, premiando com salários mais elevados os homens, inclusive quando comparados com mulheres com o mesmo nível de escolaridade”, destaca Inês Tavares, investigadora do ISCTE e coautora do livro, citada em comunicado.
Em termos gerais, os inquiridos enquadrados no perfil “integrados e protegidos” residem maioritariamente na Área Metropolitana de Lisboa (58%). “Cada área territorial vai perdendo o seu peso à medida que se afasta dos territórios mais urbanos e se aproxima dos mais periféricos”.
Para a investigadora, as disparidades salariais e as assimetrias contratuais e de proteção social que o mercado de trabalho português está a produzir “contribuem para o aumento e reprodução das várias desigualdades sociais”.
Em declarações à agência Lusa, o coordenador do estudo destacou que muitos jovens, para terem um nível de rendimento razoável, têm de “recorrer a várias atividades” e que são ainda “muito marcantes” as desigualdades de género, mesmo entre as gerações mais jovens.
“Uma maioria dos jovens que estiveram no desemprego, não recebeu subsídio de desemprego. Há aqui uma necessidade de uma resposta política“, acrescentou, considerando que os mais jovens são os que mais têm sofrido com as crises.
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