“Quando a Teleperformance precisa de recrutar fora da UE, torna-se muito difícil”

Pedro Gomes, CEO da Teleperformance, diz que o Plano de Ação para as Migrações criado pelo novo Governo agrada "bastante", mas defende que "poderia ser feito mais" para acelerar alguns processos.

A Teleperformance Portugal, o terceiro maior empregador privado do país, viu com bons olhos o Plano de Ação para as Migrações aprovado pelo novo Governo. Mas o CEO, Pedro Gomes, acredita que “poderia ser feito mais” para acelerar alguns processos, facilitando a importação de talento de fora da União Europeia (UE): “Às vezes, a necessidade de recrutar cinco ou dez pessoas de uma determinada nacionalidade impede-nos de ganhar um negócio que podia criar 300, 400, 500 postos de trabalho para pessoas portuguesas ou pessoas da União Europeia”, explica.

Quanto ao Programa Acelerar a Economia, que inclui a descida do IRC que é pago pelas empresas, diz que “algumas das iniciativas que lá estão incluídas são bastante bem intencionadas”. “Convém que depois se assegurem as condições para que o programa tenha efeitos práticos e que se monitorize”, alerta o gestor.

Quando precisamos de recrutar recursos fora da União Europeia, confesso que torna-se muito difícil, às vezes, obter o visto de trabalho e responder à necessidade daquele cliente.

Recentemente, o Governo apresentou o novo Plano de Ação para as Migrações. Daquilo que viu, agradou-lhe?

Sim, bastante. Nós recrutamos muita gente fora de Portugal, mas dentro da União Europeia. Quanto às pessoas que recrutamos dentro da União Europeia, nós não temos tido dificuldade com esse tipo de processo. No entanto, como prestamos serviços em várias línguas diferentes para multinacionais, muitas vezes temos necessidade de prestar serviços em línguas que não conseguimos encontrar dentro da União Europeia. Quando precisamos de recrutar recursos fora da União Europeia, confesso que torna-se muito difícil, às vezes, obter o visto de trabalho e responder à necessidade daquele cliente. E, às vezes, a necessidade de recrutar cinco ou dez pessoas de uma determinada nacionalidade impede-nos de ganhar um negócio que podia criar 300, 400, 500 postos de trabalho para pessoas portuguesas ou pessoas da União Europeia. Isso é algo com impacto grande no nosso negócio.

Obviamente, ficamos contentes pelas medidas que foram anunciadas, nomeadamente o compromisso, com a Estrutura de Missão da AIMA [Agência para a Integração Migrações e Asilo], de resolver o backlog [processos em atraso] que temos de atribuição de vistos e também de dotar as embaixadas e consulados de meios operacionais para poderem acelerar os processos de pedido de obtenção de vistos. Eu acho, eventualmente, que poderia ser feito mais.

Por exemplo?

Por exemplo: eu compreendo que tem de haver algum cuidado quando se atribui visto a alguém que quer vir de fora do país, mas que não vem com emprego e que não sabemos com que condições será integrado na sociedade. Mas quando nós estamos a falar de uma situação em que uma empresa — neste caso, a Teleperformance, mas podia ser outra — está em contacto com um candidato de um país estrangeiro, tem alojamento para esse candidato, tem um posto de trabalho, e estamos a falar de alguém que vem diretamente acrescentar valor à economia e à empresa, eu acho que podia pensar-se numa forma de acelerar esse tipo de processos, porque as preocupações legítimas que hoje existem com a gestão da imigração, nesse caso, não se aplicariam, e a empresa assegura a integração daquele colaborador na sociedade.

[Na quinta-feira passada, o Governo aprovou mais medidas para os trabalhadores imigrantes, nomeadamente a criação de uma rede de conselheiros para colocar em contacto empresas que queiram recrutar trabalhadores estrangeiros e orientar imigrantes que queiram vir para Portugal trabalhar de forma regulada. A entrevista foi realizada a 12 de junho, antes de se conhecerem essas medidas.]

E isso não acontece atualmente?

Isto não acontece atualmente, muito por força, penso eu, do backlog que entretanto se criou na obtenção de vistos e penso eu também por alguma incapacidade operacional nas embaixadas.

O fim das manifestações de interesse foi uma boa medida?

Nesse caso, eu diria que se calhar não tem assim tanto impacto [na Teleperformance]. Quando nós recrutamos fora do país, precisamos de soluções definitivas em que as pessoas confiem, em que vêm para o país e podem ficar no país de forma totalmente legal e bem estabelecidas.

Pedro Gomes, CEO da Teleperformance, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Houve outro programa que o Governo apresentou recentemente, que é o Programa Acelerar a Economia, com medidas para as empresas. Identifica 60 medidas para responder a 20 desafios. Foi apresentado pelo ministro da Economia e a medida mais emblemática é a descida do IRC, que ainda não sabemos exatamente como é que depois vai chegar ao terreno. O Programa Acelerar a Economia vai cumprir o que promete, na sua opinião?

Eu espero que sim. A partir do momento em que se decide lançar um programa, convém que depois se assegurem as condições para que o programa tenha efeitos práticos e que se monitorize. Não consigo fazer futurologia, se vai acontecer ou não, mas obviamente espera-se que sim. Algumas das iniciativas que lá estão incluídas são bastante bem intencionadas, nomeadamente no que diz respeito a dar mais condições às startups para se desenvolverem, a tudo o que sejam consolidações, para permitir depois melhores condições de sobrevivência a essas empresas. Eu penso que isto, de facto, pode ajudar a desenvolver economia.

A questão é essa: serão mais do que boas intenções?

Acho que a economia terá depois de fazer o seu próprio papel de aproveitar estas condições: por um lado, o Governo garantir que estas ações são efetivamente implementadas e, depois, garantir que a economia real tira o proveito delas.

Outra dessas medidas é a taxa de 20% de IRS para estrangeiros qualificados que queiram vir para Portugal. Na sua visão, é uma boa medida?

É uma boa medida, que nós já aproveitamos há algum tempo, porque essa medida já existia, e alarga-se é simplesmente o âmbito das pessoas que são tidas em conta. É mais um contributo muito positivo para a capacidade das empresas portuguesas atraírem talento estrangeiro e, para a Teleperformance, esse é um fator crítico.

É urgente baixar os impostos para as empresas e para as pessoas em Portugal?

Há aqui uma intenção de baixar os impostos para as empresas que é interessante. A questão de baixar os impostos para as pessoas é de facto altamente importante, sobretudo quando nós atravessamos agora um momento em que houve um aumento significativo da inflação, com perda de poder de compra para as pessoas e para os colaboradores. Criou-se uma grande pressão dos colaboradores sobre as empresas para que as empresas assumissem a responsabilidade de restabelecer esse poder de compra, mas as empresas vivem também dentro da sua competitividade e isto não é possível sem colocar as empresas fora de mercado. Cria-se aqui uma fricção grande entre os trabalhadores e as empresas, em que se espera que as empresas resolvam um problema que é geral da economia e que não está nas suas mãos resolver. Além disso, hoje a conversão do valor que uma empresa paga por um colaborador e aquilo que efetivamente lhe chega à mão é bastante baixo. Muito por alto, uma empresa, para pagar 1.000 euros líquidos a um colaborador, tem que despender 2.000 euros. Quando isto se inclui dentro dos modelos de negócio das empresas, é altamente desafiante.

Essa descida de impostos pode ajudar a Teleperformance a pagar melhores salários?

Não é só a Teleperformance. É qualquer empresa.

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