PGR questiona como compatibilizar liberdade de informar com segredo de justiça
Amadeu Guerra, questionou como se compatibiliza o direito de informar com o segredo de justiça e referiu que notícias sobre inquéritos por vezes “prejudicam claramente” a investigação.
O procurador-geral da República, Amadeu Guerra, questionou numa conferência como compatibilizar o direito de informar com o segredo de justiça e referiu que notícias sobre inquéritos por vezes “prejudicam claramente” a investigação.
Amadeu Guerra fez a pergunta na conferência “Construção da Democracia e Justiça Constitucional”, que decorreu em Lisboa, dirigindo-se à juíza portuguesa no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), Ana Maria Guerra Martins, antiga juíza do Tribunal Constitucional, que participou na sessão com o tema “Liberdade(s)”, na Academia das Ciências de Lisboa, no âmbito das comemorações oficiais dos 50 anos do 25 de Abril de 1974.
“Nós sabemos que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem aceitado, e eu também considero que sim, que não vamos atrás dos jornalistas por violarem” o segredo de justiça nessas situações, disse Amadeu Guerra. “Mas há, não sei se no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já há decisões, nomeadamente sobre os países, por exemplo no Reino Unido, que estabelecem sanções, coimas em situações dessas, que têm um regime diferente do nosso”, acrescentou.
Na resposta, a juíza Ana Maria Guerra Martins defendeu que “não há nenhuma hipótese” de serem consideradas punições aos jornalistas que violem o segredo de justiça quando o caso “está nos jornais há muito tempo”, sendo essa a situação “mais frequente”. Os jornalistas, disse, têm muitos direitos, são os `watchdogs´ [cães de guarda] da democracia, mas também têm deveres e os deveres implicam que cumpram a lei e, portanto, o violar o segredo de justiça é ilegal”.
“O problema é que, muitas vezes, quando o jornalista viola o segredo de justiça, já o segredo de justiça está nos jornais há muito tempo e, quando isso acontece, naturalmente que o jornalista tem direito à liberdade de expressão”, disse.
“Não há aqui nenhuma hipótese de considerarmos que eventuais punições ao jornalista estejam de acordo com a Convenção [Europeia dos Direitos Humanos. Esse é o caso mais frequente, aliás”, disse.
Amadeu Guerra chamou ainda a atenção para a “vertente da responsabilidade civil que pode ser solicitada pelas pessoas visadas” numa notícia, por exemplo testemunhas num inquérito que, após verem o seu nome publicado, tenham de ser colocadas em programas de proteção de testemunhas.
Em abril, o TEDH, sediado em Estrasburgo, condenou Portugal por violação da liberdade de expressão, impondo ao Estado português o pagamento de 1.510 euros a uma jornalista do Público por violação da sua liberdade de expressão.
A jornalista tinha sido condenada em primeira instância por violar o segredo de justiça no ‘caso das secretas’, sentença que foi confirmada no Tribunal da Relação.
Para o tribunal europeu, a justiça portuguesa limitou-se a uma “aplicação formal e automática do crime de violação do segredo de justiça”, sem ter em conta o que já se sabia do caso e o suposto impacto na investigação da divulgação daquelas informações. “É questionável se, tendo em conta a cobertura mediática do caso, os factos em investigação e a sua relevância política, era ainda necessário impedir a divulgação de informações que, pelo menos em parte, já eram do domínio público”, considerou o tribunal.
O TEDH destacou que o artigo publicado “era uma questão de interesse público considerável” e que o caso e os seus suspeitos já tinham sido anteriormente noticiados, pelo que a justiça portuguesa deveria ter tido essa circunstância em atenção.
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