Detergentes Jodel perto da falência com dívidas de 30 milhões e 90 empregos em risco

Entre os principais credores da fabricante da Azambuja estão o Estado e vários bancos. Administrador de insolvência culpa gerência por "destruir a empresa" e espera vendê-la em leilão por 20 milhões.

A fabricante de detergentes Jodel entrou em insolvência no final de outubro, requerida por uma ex-trabalhadora, com dívidas superiores a 30 milhões de euros. Entre os principais credores estão o Estado, vários bancos e a Agência para a Competitividade e Inovação (IAPMEI), segundo adiantou ao ECO o administrador de insolvência.

Tenho cerca de 300 reclamações de créditos e desconfio que vão ultrapassar os 30 milhões de euros – incluindo os 11 milhões de euros ao Estado –, mas não é um valor certo porque ainda não tenho todos os valores apurados em termos de reclamações de crédito”, contabiliza José Eduardo de Castro Martins, administrador de insolvência da Jodel, empresa situado em Aveiras de Cima.

Em declarações ao ECO, o administrador de insolvência traça como objetivo “manter a empresa para ser vendida em funcionamento, com os trabalhadores incluídos”. A assembleia de credores da Jodel está marcada para 19 dezembro. Nessa reunião promete apresentar um plano para “estabilizar a empresa durante três a quatro meses”, “preservar os cerca de 70 postos de trabalho” e “recuperar os clientes que saíram, como o grupo Sonae e o Lidl”.

Na fase seguinte, ambiciona “vender a empresa no e-leilões, com trabalhadores incluídos, sem nenhuma intervenção de leiloeiras, prontinha a trabalhar a lucrar”. José Eduardo de Castro Martins acredita que a “empresa valerá sempre acima dos 20 milhões de euros”. No entanto, clarifica que esse valor só será apurado “depois da avaliação”. É que, justifica, “avaliar a empresa hoje é uma coisa; e avaliar a empresa estabilizada é outra”.

Quero vender a empresa no e-leilões, com trabalhadores incluídos, sem nenhuma intervenção de leiloeiras, prontinha a trabalhar a lucrar.

José Eduardo de Castro Martins

Administrador de insolvência da Jodel

“Quero vender a empresa de uma forma absolutamente transparente, quero defender os postos de trabalho e proteger os credores para eles receberem o máximo”, acrescenta o administrador judicial. Mas traça, desde já, uma meta: “se conseguir pagar entre 50% a 60% aos credores, garantidamente é uma boa liquidação”.

De acordo com os dados consultados pelo ECO na plataforma Informa D&B, a sociedade Jodel Hygiene Products Manufacturing, Unipessoal Lda. acumulou prejuízos de quase 7 milhões de euros nos últimos dois anos. Em 2023 viu a faturação encolher para 14 milhões de euros, 27% abaixo do exercício anterior, com as exportações a valerem um terço do volume de negócios.

Família tenta manter gestão, mas tribunal não deixa

A 1 de outubro, os trabalhadores concentram-se em frente às instalações da empresa para denunciarem três salários em atraso referentes ao meses de julho, agosto e setembro. O administrador judicial diz que esses salários “vão ser reclamados no âmbito do processo de insolvência e irão ser pagos depois do resultado da liquidação”. No entanto, José Eduardo de Castro Martins garante ao ECO que “pagou os ordenados de outubro, no dia 12 de novembro, para conseguir ter os funcionários a trabalhar”.

Numa carta com data de 4 de novembro, a que o ECO teve acesso, os antigos administradores da Jodel requereram no processo de insolvência que “a gestão da empresa continuasse a ser assegurada pela gerência, atendendo ao facto de só assim se poder dar seguimento às encomendas em curso e ao normal funcionamento da empresa”. No entanto, o Juízo de Comércio do Tribunal de Vila Franca de Xira determinou que deviam ser entregue ao administrador de insolvência os elementos da contabilidade da empresa e de todos seus bens.

Para a antiga gerência, liderada por Filipa Ferreira, “esta atuação vai deitar por terra todo o enorme trabalho efetuado pela gerência para recuperar a empresa, atirando para o desemprego mais de uma centena de trabalhadores, que ficam sem qualquer garantia para além do fundo de garantia salarial e do subsídio de desemprego”. Algo que, lê-se na mesma missiva, “não é, de forma alguma, o futuro preconizado pela gerência da Jodel para a empresa e para os trabalhadores”.

“Destruíram a empresa criada pelos pais com muito carinho”

Fundada em 1968 por José Ferreira e Maria Manuela Ferreira, a empresa estava a ser gerida pelos filhos, Paulo e Filipa Ferreira (que assumiu a presidência em 2020). José Eduardo de Castro Martins não hesita em dizer que foram os herdeiros “que destruíram a empresa, que foi criada pelos pais com muito carinho”.

Filipa Ferreira e Paulo Ferreira, presidente e vice-presidência do grupo JodelJodel

Em entrevista ao ECO, o administrador de insolvência dá ainda conta de que “na véspera da insolvência, dia 29 de outubro, desapareceram vários bens, como carros, equipamentos, sucatas, linhas de enchimento e moldes.

José Eduardo de Castro Martins acusa ainda “Filipa Ferreira de se ter apoderado no dia 31 [de outubro], já 24 horas depois da declaração de insolvência, de um montante de quase 54 mil euros que tinha sido depositado por uma empresa cliente”. A explicação que lhe foi dada foi de que a gerente terá usado esse dinheiro para pagar a fornecedores. Diz que pediu os comprovativos desses pagamentos, mas “até hoje [não recebeu] nada”.

José Eduardo de Castro Martins refere ainda que a antiga gerência “transferiu há uns meses para uma imobiliária [propriedade da família] um património superior a nove milhões de euros”, referindo-se a uns terrenos em Odivelas. O administrador de insolvência garante que “está a tentar resolver esse negócio e incorporá-los na massa insolvente”.

Por outro lado, alega que os funcionários da Jodel não tinham seguro de acidentes de trabalho e que, por causa disso, a 31 de outubro não deixou ninguém trabalhar. “No dia 30 houve um acidente de trabalho de um funcionário e já foi a massa insolvente que teve de pagar as despesas”, desabafa. Entretanto, diz que já fez uma nova apólice, que começou a vigorar a 3 de novembro.

O ECO tentou contactar Filipa Ferreira, formada em Engenharia Química em 1999, mas até à data da publicação não obteve qualquer resposta.

Da garagem de Odivelas à sucessão familiar

O negócio da Jodel começou com José Ferreira a produzir detergentes numa garagem em Odivelas, na zona de Lisboa, depois de ter tido um restaurante e ter trabalhado durante cinco anos como vendedor de detergentes numa grande fábrica, contou Filipa Ferreira em uma entrevista à Executiva.

Filipa Ferreira contou nessa mesma publicação que “o pai era curioso e apercebeu-se que a produção de detergentes tinha pouca ciência” e que foram “os antigos fornecedores de matérias-primas que ajudaram o pai a fazer o produto”. Com o escalar do negócio, no final da década 80, os fundadores (José Ferreira e a esposa Maria Manuela Ferreira) montam uma fábrica na Ramada, em Odivelas.

Em 1997 inauguraram uma nova fábrica de 120 mil metros quadrados em Aveiras, que permitiu integrar novas tecnologias e aumentar a capacidade produtiva, tendo iniciado em 2006 o fabrico de detergentes sólidos atomizados pelo processo de fabrico NTD e, em 2012, investido na construção de um armazém automatizado. Em 2020, Filipa Ferreira e Paulo Ferreira, que cresceram na empresa, assumiram, respetivamente, a presidência e vice-presidência do grupo Jodel, com o objetivo de aumentar a internacionalização.

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