Só 43% dos alunos mais pobres ativaram contingente que lhes facilita entrada no ensino superior
Contingente prioritário para alunos carenciados que ingressem no ensino superior está a ser uma "medida positiva", mas "não está a chegar a todos". Bolsas insuficientes desincentivam adesão.
Menos de metade dos estudantes que poderiam ter ativado o contingente desenhado pelo Governo anterior para facilitar o acesso dos alunos mais carenciados ao ensino superior usou essa via no ano letivo de 2023-2024. O balanço é feito pelo think tank EDULOG, que, num novo estudo, alerta que a insuficiência das bolsas de estudo e do apoio aos estudantes deslocados ajuda a explicar este nível de adesão.
Anunciado em 2023 como projeto-piloto de adesão voluntária por parte das instituições de ensino superior, este contingente implica a reserva de 2% das vagas para os estudantes beneficiários do escalão A de ação social escolar, ou seja, procura fomentar a inclusão dos alunos mais carenciados no ensino superior.
E tem-no feito, mas “não está a chegar a todos os estudantes“, alerta Alberto Amaral, membro do conselho consultivo do EDULOG. Os números confirmam essa dinâmica.
Segundo o novo estudo, sem o contingente, cerca de 41% dos estudantes do escalão A que utilizaram esta via não teriam sido admitidos nos cursos e instituições em que foram colocados. Mais, esta medida aumentou em dez pontos percentuais a probabilidade de admissão de alunos carenciados e em 2,8 pontos percentuais a probabilidade de acesso a programas seletivos.
“Estes resultados refletem o papel facilitador do contingente no acesso a áreas de estudo mais competitivas por parte de estudantes de baixos rendimentos”, realça o EDULOG.
Contudo, “apesar dos benefícios”, só cerca de 43% dos candidatos elegíveis para este contingente O ativaram no momento da candidatura. Há três fatores a explicar essa trajetória, identifica Alberto Amaral, em conversa com o ECO.
Primeiro, a falta de informação sobre esta medida. Nos Açores e na Madeira, já estava previsto um outro contingente — que reserva uma parte das vagas no ensino superior no continente para os alunos insulares — e nessas regiões a adesão à via prioritária para alunos carenciados foi “notavelmente mais elevada“, o que mostra que a maior familiaridade com medidas deste tipo tem impacto na adesão.
Por outro lado, há a apontar a insuficiência dos apoios para os alunos deslocados, argumenta Alberto Amaral. É que o contingente até pode facilitar o acesso ao curso desejado, mas não assegura qualquer apoio extra à deslocação, cenário que é agravado pelo “custo crescente do aluguer de um quarto“.
“O valor modesto das bolsas de estudo para estudantes deslocados cria uma situação insustentável para os estudantes carenciados, impedindo que usem a totalidade das vagas criadas pela medida”, declara o também ex-reitor da Universidade do Porto.
Pior, para os alunos que se deslocam, muitos ficam em quartos em Lisboa e no Porto sem contratos de arrendamento, o que impede o acesso aos apoios desenhados para o alojamento.
Já o terceiro fator a desmotivar a adesão ao contingente para alunos carenciados tem que ver, segundo Alberto Amaral, com a perceção do grau de dificuldade dos cursos considerados de elite. É que os alunos que precisam de apoio social escolar têm de manter aproveitamento escolar e veem esses cursos como um “maior risco”, porque temem que sejam mais difíceis.
Recomendações para aumentar inclusão
Perante este cenário, o EDULOG deixa uma série de recomendações, a começar pela “necessidade de aumentar a divulgação e a consciencialização sobre o contingente, nomeadamente através da criação de vídeos tutoriais para professores e estudantes, e da disponibilização de informações mais claras no website da Direção-Geral do Ensino Superior”.
Além disso, o think tank sugere a publicação das notas mínimas de entrada para todos os contingentes, “de forma a ajudar os estudantes a tomar decisões mais informadas“.
Outra recomendação é a criação de apoios financeiros adicionais para despesas de deslocação e de alojamento, “que continuam a ser entraves significativos no acesso ao ensino superior”.
O EDULOG sublinha também a importância de uma monitorização contínua dos impactos deste contingente. “É essencial acompanhar os estudantes admitidos através desta medida, não apenas no que diz respeito ao seu percurso académico, mas também ao seu sucesso profissional, de forma a avaliar o impacto, a longo prazo, na empregabilidade e no rendimento destes jovens“, acrescenta o think tank.
Este think tank enquadra-se na Fundação Belmiro de Azevedo. O objetivo é, nomeadamente, “contribuir para a construção de um sistema de educação de referência” e a informação das políticas públicas “para a inovação e mudança na Educação”.
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