Operação Tutti-Frutti. Ministério Público iliba Medina, mas critica a sua atuação política
Duarte Cordeiro mal é referido no despacho do Ministério Público que conta com 1135 páginas. Ministério Público diz que Medina teve falta de zelo e violou princípio da imparcialidade.
Fernando Medina – ex autarca de Lisboa e ex-ministro das Finanças de António Costa – lamentou oito anos de processo com “calúnias” contra si. Na terça-feira, depois de conhecido o arquivamentos da investigação contra si no âmbito da Operação Tutti-Frutti, Medina admitia que recebia a notícia “com satisfação, mas também com naturalidade”.
No âmbito do processo Tutti Frutti, o Ministério Público deduziu acusação contra 60 arguidos por crimes de corrupção, prevaricação, branqueamento de capitais e tráfico de influência, mas ilibou Fernando Medina. Duarte Cordeiro, ex-ministro do Ambiente, que nem chegou a ser ouvido no processo, poucas referências teve no despacho de 1135 páginas do Ministério Público.
O ex vice-presidente da Câmara de Lisboa assume que ficou “finalmente livre” das suspeitas que lhe foram imputadas no caso “Tutti Frutti”. Numa nota que publicou nas redes sociais, Duarte Cordeiro escreveu que, no âmbito do processo “Tutti Frutti”, “ficou clarificado o que sempre disse”. “Não há nada que me surpreenda no que me diz respeito e só lamento o tempo que demoraram estes processos a concluírem as suas investigações. Relembro que nunca sequer fui ouvido. Depois de anos a lidar com especulação e suspeita, fico finalmente livre”, frisou.
Fernando Medina afirmou que em oito anos de processo “foram publicadas mais de duas mil notícias e foram passadas nas televisões 48 horas ininterruptas de notícias que envolveram o meu nome, com calúnias, insinuações, com acusações, com maldade muitas vezes”, completou.
Mas, apesar deste arquivamento, o DIAP de Lisboa admitiu que houve falta de zelo e de exigência na atribuição dos 200 mil euros, e que tal apoio foi “definido em reunião com o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina” que “não deixou, assim, de influir no desfecho que o mesmo conheceu”. Porém, não encontrou prática de crime. O socialista era suspeito da prática do crime de prevaricação por alegadamente ter beneficiado a XV – Associação Amigos do Rugby do Belém com um apoio de 200 mil euros decidido numa reunião que ocorreu a 2 de março de 2017 no gabinete do então presidente de Câmara de Lisboa.
“Da prova recolhida nos autos, não é possível extrair que Fernando Medina, acedendo às insistências de Sérgio Azevedo e acabando por resolver a situação de encontro aos interesses da XV -Associação Amigos do Rugby de Belém que lhe chegaram representados por este, o tivesse feito com o propósito inequívoco de os beneficiar por via de uma atuação conscientemente contrária ao direito”, diz a acusação. “A factualidade descrita revela comportamentos, incluindo de Fernando Medina, que se desviam e atropelam as normas que enquadram o exercício das funções públicas, e, por isso, ilícitos, reveladora de um modo de gestão e funcionamento da res publica merecedor de um juízo de censura. Porém, não sendo o crime em causa punido a título de negligência, mas de dolo, in casu até específico, sendo evidente que existia uma vontade de todos de que o resultado ocorresse, como ocorreu, não existe, contudo, a prova de uma intenção de desvirtuar as normas jurídicas e afastá-las para benefício dos mesmos”, acrescenta o despacho do Ministério Público.
Fernando Medina prestou declarações, dizendo, em síntese, “que não teve intervenção no procedimento conducente à atribuição do apoio financeiro, o qual competia aos serviços da Câmara Municipal de Lisboa, ao vereador responsável pelo pelouro do desporto e ao executivo camarário, não tendo sequer estado presente na reunião de executivo na qual foi deliberada a respetiva atribuição”, dizem os magistrados. “Referiu, ainda, que agendou a reunião a pedido de Sérgio Azevedo, desconhecendo os interesses que o mesmo pudesse ter na atividade da XV, e que nessa reunião ouviu os interessados, na presença do vereador do Desporto, e que o que daí saiu foi que a Câmara Municipal de Lisboa apoiaria a construção do campo, o que o próprio, intimamente, apenas admitiria na circunstância de estarem reunidos os pressupostos legais para o efeito. Negou ter comprometido o município com a sua atuação e ter interferido no procedimento, acrescentando que o município apoia financeiramente outros clubes na cidade e que, inclusivamente, Lisboa preparava-se para ser Cidade Europeia do Desporto, considerando que o apoio concedido era, também por isso, de interesse para a cidade”. Para os magistrados do DIAP de Lisboa, nas ações de Medina não houve indícios de dolo nem de provas que mostrassem que Medina queria beneficiar aquela associação de rugby com o apoio financeiro que acabou a autorizar.
Contudo, o Núcleo de Assessoria Técnica (NAT) da Procuradoria-Geral da República (PGR) considerou que Fernando Medina terá alegadamente violado o Regulamento de Atribuição de Apoios pelo Município de Lisboa. Os peritos dizem mesmo que o “senhor presidente de Câmara de Lisboa atuou ao arrepio do Regulamento Municipal que aprovou e que estava obrigado a cumprir, tendo violado o princípio de “imparcialidade” e promovido a “falta de fundamento” da proposta do apoio de 200 mil euros.
O seu advogado, Paulo Sá e Cunha, sublinhou que a decisão de não acusar era esperada e juridicamente correta, mas lamenta o tempo que demorou a ser tomada. O processo, iniciado em 2016, poderia ter sido encerrado mais cedo, apontou o advogado de defesa em entrevista à SIC Notícias. Mas relativamente ao ‘puxão de orelhas’ do despacho de arquivamento, o advogado rejeita a ideia de que o Ministério Público tenha legitimidade para “dar reprimendas” a políticos. O advogado voltou a lembrar que a decisão de atribuir o subsídio à associação de rugby não foi de Medina, mas sim da Câmara Municipal de Lisboa, por deliberação unânime dos vereadores. Considera, por isso, que é injusto atribuir-lhe responsabilidades diretas.
A ‘Tutti Frutti’ investigou desde 2016 alegados favorecimentos a militantes do PS e do PSD. A maioria do PSD. O líder da concelhia (Luís Newton), o líder da distrital de Lisboa (Ângelo Pereira) foram formalmente acusados pelo Ministério Público.
“Os arguidos Sérgio Azevedo, Rodrigo Gonçalves, Vasco Morgado, Nuno Firmo, Luís Newton, Ângelo Pereira, Fernando Braamcamp, Ameetkumar Subhaschandra, Patrícia Brito Leitão, Rodolfo de Castro Pimenta, Ana Sofia Oliveira Dias, Inês de Drummond e José Guilherme Aguiar praticaram os factos de que vêm acusados no exercício de mandato autárquico, valendo-se dos respetivos cargos para satisfazer interesses de natureza privada em prejuízo do interesse público, em grave violação dos deveres inerentes às suas funções de autarcas”, escreve o MP no despacho do MP.
Seis após o seu início, a investigação da operação “Tutti Frutti” em 2023 foram conhecidos novos dados, depois da exibição da investigação da TVI, no final de maio de 2023, que revelou uma alegada conspiração entre dirigentes do PS e PSD para negociar lugares políticos entre juntas de freguesias e distribuição de cargos fictícios. Neste processo estavam a ser investigados antigos responsáveis pela Câmara Municipal de Lisboa, como Fernando Medina e Duarte Cordeiro.
Por isso, a PGR da altura, Lucília Gago, criou uma super equipa – com cinco magistrados do Ministério Público e cinco inspetores da Polícia Judiciária – para a conclusão da investigação, que ficaram em regime de exclusividade até agora. O inquérito em causa inquérito contava com 38 volumes processuais e 72 apensos com cerca de 560 volumes).
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