IRS tira mais de 300 euros a prémio de produtividade de 2.000 euros. Veja as simulações do 15.º mês
Prémios de produtividade estão isentos de IRS, mas fazem retenção na fonte. Só depois de cumpridas certas condições, Fisco reembolsa contribuintes. Em 2.000 euros, mais de 300 euros são retidos.
As confederações empresariais propuseram e o Governo de Luís Montenegro acolheu: os empregadores podem pagar prémios de produtividade, desempenho, participações nos lucros e gratificações de balanço isentos de IRS, até 6% do salário base anual do trabalhador. Ainda assim, no mês em que o pagamento é feito, é aplicada retenção na fonte. De acordo com as simulações da EY, um trabalhadores com um salário de dois mil euros brutos mensais que receba um prémio do mesmo valor, vê descontados 326 euros ao valor do bónus.
A ideia partiu da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), corria ainda o ano de 2023. Armindo Monteiro propôs ao então Governo de António Costa que as empresas pudessem pagar um 15.º mês aos respetivos trabalhadores isento de impostos e contribuições sociais.
Na altura, a medida não foi acolhida, mas o novo Governo, de Luís Montenegro, fez questão de incluir no seu programa a intenção de avançar com a isenção dos prémios de produtividade “correspondendo a um 15.º mês”. Concretizou essa promessa incluindo a medida, primeiro, no acordo assinado na Concertação Social e, depois, no Orçamento do Estado para este ano.
No entanto, nessa lei ficou previsto algo com o qual os empresários não concordam: os prémios, ainda que isentos de IRS, fazem retenção na fonte. Depois de verificar que o empregador cumprir as condições (nomeadamente, aumentar os demais salários), o Fisco reembolsa ao contribuinte retido em excesso.
Vamos a casos práticos. Sem esta medida, se um empregador quisesse atribuir a um trabalhador (solteiro, sem filhos) com um salário de mil euros um prémio de igual valor, esse bónus seria somado ao vencimento regular e agravaria a taxa de retenção na fonte.
Assim, em vez de descontar por mês 58,59 euros de mil euros, passaria a reter, nesse mês, mais de 300 euros dos dois mil euros totais, calcula a EY. Resultado: dos dois mil euros pagos pelo empregador nesse mês, o trabalhador recebera 1.564 euros líquidos.
Já com a nova medida, o prémio não agrava a taxa de retenção na fonte. Antes, é-lhe aplicada a taxa correspondente à remuneração mensal. Logo, o salário desse trabalhador continua a fazer o desconto que já vinha fazendo e o prémio de mil euros só retém 58,59 euros.
No total, nesse mês, são retidos 117 euros em IRS, o que quer dizer que, dos dois mil euros pagos pelo empregados, 1.773 euros chegam à carteira do trabalhador nesse mês, conforme mostra a tabela abaixo.
A EY também simulou o impacto da nova medida no imposto anual. Sem o que está previsto no Orçamento do Estado, um trabalhador com um salário mensal de mil euros e um prémio de mil euros teria, no total do ano, 1.456,88 euros de IRS anual a pagar. Feitas as contas, o seu vencimento anual líquido seria de 12.003,32 euros.
Já com a nova medida medida, tem menos 138,6 euros de IRS a pagar. Isto porque o prémio está isento de imposto até 840 euros (6% do ordenado anual). Logo, parte do imposto retido abate ao total devido ao Fisco.
Vamos agora ao caso de um trabalhador (solteiro, sem filhos) com um salário de dois mil euros e um prémio do mesmo valor. Sem a medida proposta pelos patrões e acolhida pelo Governo, dos quatro mil euros pagos pelo empregador, só 2.687 euros chegariam à carteira do trabalhador no mês do pagamento, porque a taxa de retenção na fonte sofreria um agravamento.
Já com a medida em questão, não há agravamento da taxa: o salário retém 326 euros e o prémio também. Dos quatro mil euros referidos, 3.128 euros chegam ao bolso do trabalhador nesse mês. São mais 441 euros do que no cenário anterior, como pode ver abaixo.
Vejamos agora o impacto anual. Sem a medida prevista no Orçamento do Estado para 2025, este trabalhador teria a pagar, no total, 5.142,84 euros de IRS num ano, o que significa que o seu rendimento líquido global seria de 21.777 euros.
A nova medida traz uma poupança de de 537,60 euros, uma vez que 1.680 euros dos dois mil euros de prémio estão totalmente isentos de IRS (6% da retribuição anual desse trabalhador), indica a EY.
Prémio de cinco mil euros retém quase 1.500 euros
A lei em vigor diz que os prémios de produtividade estão isentos de IRS até 6% da retribuição base anual do trabalhador, mas não estipula qualquer teto quanto aos ordenados considerados. Tal significa que o impacto desta medida torna-se cada vez maior, quanto maior o salário bruto.
Consideremos o caso de um trabalhador (solteiro, sem filhos) com um salário bruto mensal de cinco mil euros e um prémio de igual valor. Sem esta medida, a taxa de retenção agravar-se-ia e acabaria por receber, do total de dez mil euros, somente 5.735 euros. Com esta medida, a retenção não se agrava. O salário retém cerca de 1.500 euros e o prémio outros 1.500 euros, o que significa que, dos dez mil euros totais, 6.462,00 euros chegam à carteira. É uma diferença de 727 euros entre os cenários considerados.
Já no acerto de contas anual, 4.200 euros desses cinco mil euros de prémio ficarão isentos de imposto (6% da retribuição anual), o que significa que haverá uma poupança anual de 1.890 euros para esse contribuinte.
Num outro exemplo, um trabalhador (solteiro, sem filhos) com um salário de dez mil euros e um prémio de igual valor vai ver 3.715 euros desse bónus “absorvido na fonte”. Logo, dos 20 mil euros pagos nesse mês, apenas 11.470 euros vão chegar à sua carteira.
A alternativa seria, porém, menos generosa. Sem esta medida, a taxa de retenção na fonte agravar-se-ia de modo a que, dos tais 20 mil euros, 10.690 euros chegariam efetivamente ao trabalhador.
Quanto ao impacto anual, sem esta medida, teria a pagar, no conjunto do ano, 55.433,72 euros de IRS. Passa a ter de entregar 51.191,72 euros, porque 8.400 euros do prémio ficam isentos de imposto. É um ganho de mais de quatro mil euros.
Importa explicar que, se o empregador não cumprir as condições subjacentes a esta medida, os prémios têm menos de pagar impostos. Portanto, a vantagem no cenário anual desaparece.
Patrões apelam ao fim da retenção. E os partidos?
À saída da última reunião da Concertação Social, o presidente da CIP avisou que, como está, a medida “não é exequível” do ponto de vista prático, apelando a que a Autoridade Tributária “se organize” para que não seja feita retenção na fonte de IRS.
Apesar dos apelos do patrão dos patrões, os partidos do arco da governação, PSD e PS, não tencionam propor alterações legislativas para fazer cair a retenção na fonte dos prémios de produtividade e atira a bola para o Governo.
“Estamos bem com o regime criado, que tem uma cláusula de antiabuso e não estamos a pensar mudá-lo a não ser que surja uma proposta do Governo”, afirmou ao ECO o vice-presidente do PSD, Hugo Carneiro.
“Este incentivo é equilibrado e salvaguarda os interesses dos trabalhadores e do Estado. É importante que se façam os descontos no momento em que se paga o prémio e só depois se efetive a isenção, devolvendo essa parte que foi retida, para que se verifiquem que os requisitos para usufruir desse benefícios foram cumpridos”, argumento o deputado.
Por outro lado, “o Parlamento não pode alterar leis que impliquem perda de receita por causa da norma-travão”, acrescenta o social-democrata.
Do lado do PS, também não se perspetiva a entrada de um projeto de lei para dispensar a retenção na fonte do 15.º mês. Contudo, o vice-presidente do PS e antigo secretário de Estados dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, defende que “se um prémio está isento não devia estar sujeito a retenção”.
“Mais uma vez este é um Governo que diz uma coisa e faz outra. O Governo tem um padrão: cria uma expectativa e depois não é bem assim. Acordou com os parceiros sociais isentar o prémio, mas depois esqueceu-se de retirar a obrigação de retenção na fonte”, criticou o deputado socialista.
O ECO questionou o Ministério das Finanças se pretendia mudar a lei, de forma a eliminar a obrigação de retenção na fonte do 15.º mês, mas até ao fecho deste artigo não obteve resposta.
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