João Massano é candidato a Bastonário da Ordem dos Advogados Portugueses para o próximo triénio (2025-2027). Desde 2019 que é presidente do Conselho regional de Lisboa. Leia a entrevista.
João Massano é candidato a Bastonário da Ordem dos Advogados Portugueses para o próximo triénio (2025-2027). Sob o mote de candidatura “Juntos Podemos Mais” o candidato da Lista R acredita “que há outro caminho, e um caminho melhor, para a Ordem dos Advogados – para a devolver ao seu posicionamento inicial”.
Em 2004 tornou-me sócio fundador da ATMJ. Mestre em Direito em 2006, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Manteve uma carreira académica durante cerca de 17 anos, como docente universitário na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, na Universidade Lusófona e na Universidade Moderna. Agora trabalha em prática individual, com escritório próprio.
Ligado ao Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados (CR Lisboa) desde 2011, primeiro, como Vogal-Tesoureiro do CR Lisboa (triénio 2011-2013) depois, nos dois mandatos seguintes, como Vice-Presidente responsável pelo pelouro da Formação (triénios 2014-2016 e 2017-2019) e, finalmente (desde 2019), como Presidente do CR Lisboa.
Qual é a sua visão para o futuro da Ordem dos Advogados?
Quero uma Ordem dos Advogados (OA) moderna e respeitada por todos, a começar pelos advogados que deve representar e pela advocacia, como profissão, que deve defender.
Mas a Ordem é muito mais que isso: tem um papel institucional na sociedade e deve ser ouvida e respeitada como um agente indispensável do nosso sistema de Justiça, sobretudo pelo poder político. Só dessa forma se consegue defender a importância e a necessidade do papel do Advogado na defesa dos direitos, liberdades e garantias e do regime democrático.
Vejo no futuro próximo uma OA que dialoga e negoceia, que contribui e constrói um melhor sistema de Justiça, em cooperação com os outros agentes, abandonando a lógica confrontacional com as instituições que tem tido nos últimos tempos.
Quero uma Ordem que promove o diálogo construtivo para dentro e para fora e é por isso que, no meu programa, defendo medidas como (i) a criação de canais de comunicação regulares e eficazes com o Ministério da Justiça (mas também com o Parlamento e com os Grupos Parlamentares) para abordar temas da Advocacia e da Justiça em geral, (ii) a participação ativa da OA em grupos de trabalho e comissões relacionadas com temas que afetam a prática da Justiça, como o SADT mas também outros como (exemplo prático) a mudança do campus da Justiça em Lisboa, em que participo em nome do CRLisboa, etc.
Mas também quero uma Ordem que ouve, responde e trabalha com todos os seus órgãos internos e com todos e cada um dos Advogados. Uma Ordem que não se ‘fecha’ em Lisboa e ignora os Colegas que trabalham todos os dias em todos os pontos do país.
E sobretudo, quero uma Ordem que fala a uma só voz, não no sentido de uma liderança autoritária, que impõe os pontos de vista de uma pessoa única, mas que debate internamente as posições que quer assumir sobre determinados temas e que depois, para fora, ‘puxa’ toda para o mesmo lado, demonstrando consistência, coerência, força e união.

Quais são as suas três principais prioridades, caso seja eleito Bastonário?
Para começar, como defendo há muito tempo, quero (i) unir a classe. Este já era um problema há quase três anos quando me recandidatei à presidência do CR Lisboa, e agravou-se com a liderança da Ordem no mandato ainda em curso.
Esse clima de desunião e mal-estar na classe tem começado por afastar os advogados da vida da Ordem e, inclusive, da escolha e eleição dos seus representantes, e tem destruído a reputação e a notoriedade da Ordem, afastando-a da representatividade que deve ter na construção, dia-a-dia, dos sistemas de Justiça.
Depois, (ii) quero aproximar a Ordem dos seus representados, porque há muitos colegas que deixaram de se rever no posicionamento da OA e que não entendem o caminho que tem seguido e que se distancia cada vez mais da defesa dos interesses e problemas reais dos Advogados. Tenho passado muitos dias das últimas semanas a percorrer o país para levar as ideias da minha candidatura aos Colegas e o que tenho visto é um sentimento de abandono quando a Ordem devia imprimir nos Advogados um sentimento de pertença.
Por fim, e ligada com as outras duas prioridades, quero (iii) incluir todos os Advogados com uma Ordem que trabalha para todos os Colegas, sem divisões. Não quero uma Ordem para os ‘coitadinhos’ e outra para ‘os bem na vida’. Não quero uma Ordem das ‘quintas’ dos Advogados da prática individual e dos escritórios e das grandes sociedades.
A Ordem deve trabalhar e acolher todos os Advogados porque todos e cada um se debatem com questões diferentes, algumas que podem atingir mais uns do que outros, mas a Ordem deve trabalhar para dar resposta a todos. Um exemplo disso é a formação – quer a contínua, nos campos do Direito, quer a especializada – que hoje vai desde o marketing à cibersegurança.
Medidas para a CPAS?
É preciso ir além do debate entre a manutenção da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) e a migração para a Segurança Social. Além dessas duas possibilidades, e enquanto essa definição está a ser estudada pelo Governo, penso que devemos tomar a iniciativa e considerar uma terceira via: a criação de um sistema híbrido inovador, concebido para transcender as limitações inerentes aos dois sistemas, e que ofereça uma proteção mais robusta e adaptada às necessidades atuais da Classe.
Esse modelo – inspirado no dos bancários – assentaria em três pilares fundamentais, proporcionando uma proteção integral ao longo da carreira: (i) proteção na velhice (através da criação de PPR especializados), (ii), proteção na perda de rendimentos (expandindo e aperfeiçoando o plano atual da CPAS) e (iii) proteção na doença (implementando um sistema de saúde específico para a Classe, inspirado no modelo dos bancários). Este é um resumo do que gostaria de tentar fazer e, no meu programa, tenho um conjunto de medidas estudadas e detalhadas que penso por à consideração dos Colegas se me derem a honra de os representar como Bastonário.
Esse clima de desunião e mal-estar na classe tem começado por afastar os advogados da vida da Ordem e, inclusive, da escolha e eleição dos seus representantes, e tem destruído a reputação e a notoriedade da Ordem, afastando-a da representatividade que deve ter na construção, dia-a-dia, dos sistemas de Justiça”.
Medidas para o SADT?
Sobre o apoio judiciário, defendo a luta pela dignidade dos advogados inscritos no SADT, com a atualização regular da tabela de honorários, a garantia de condições adequadas de trabalho nos tribunais e instituições e o pagamento de honorários pelo IGFEJ todos os meses do ano, entre outras medidas.
Mas considero também que é urgente modernizar o sistema atual – um exemplo de uma tarefa em que a Ordem pode e deve trabalhar com os outros agentes da Justiça para melhorar o seu funcionamento – , com o uso mais atempado das plataformas CITIUS/ SITAF, para acelerar a inscrição dos Advogados e o pagamento das sessões já confirmadas e validadas pelo tribunal, remetendo automaticamente para o IGFEJ que deverá pagar num prazo de 30 a 45 dias após o pedido.
Como avalia o processo de digitalização dos tribunais e o que pode ser melhorado?
Ao longo de minha trajetória, tanto como presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados quanto como candidato a Bastonário, tenho enfatizado consistentemente a necessidade de modernizar e agilizar os processos judiciais. Acredito firmemente que a digitalização e a integração de tecnologias avançadas, como a inteligência artificial (IA), são fundamentais para melhorar a eficiência do sistema de Justiça.
A implementação de tecnologias como a IA pode trazer várias vantagens ao sistema judiciário. Por exemplo, a IA pode automatizar tarefas administrativas repetitivas, como a categorização de processos e a extração de metadados, permitindo que os magistrados se concentrem em questões mais complexas e estratégicas. Além disso, a digitalização de processos e a utilização de ferramentas de automação podem reduzir significativamente os custos operacionais e o tempo de tramitação dos processos.
Outro aspeto importante é o acesso à Justiça. Tecnologias como videoconferências e plataformas online podem aumentar o acesso à justiça, permitindo que as partes envolvidas participem nas audiências remotamente, reduzindo a necessidade de deslocações em zonas de Portugal onde essas deslocações se revelam particularmente difíceis, como sucede, por exemplo, nos Açores.
Embora a tecnologia ofereça grandes benefícios, é fundamental abordar desafios como o viés algorítmico e a privacidade dos dados. Para isso, é essencial estabelecer marcos regulatórios sólidos e promover a literacia jurídica sobre o uso ético da IA.
Continuarei a defender a modernização do sistema de Justiça através da tecnologia, garantindo que essas inovações sejam implementadas de forma responsável e justa, sempre priorizando o acesso à justiça e a eficiência dos processos judiciais. Acredito que, com um enfoque cuidadoso e estratégico, podemos criar um sistema mais eficiente, acessível e equitativo para todos.
Como a OA pode apoiar os advogados na adaptação às novas tecnologias e à transformação digital do sistema de Justiça?
Com formação, sempre mais formação, e com ferramentas digitais de apoio e facilitação de procedimentos, como muitas que temos vindo a promover no CR Lisboa. Por exemplo, um projeto que não tive tempo de implementar em Lisboa, mas que esta candidatura a Bastonário – se ganhar – me dá a oportunidade de projetar para todo o país, é a criação de uma rede integrada para a advocacia moderna – o Programa Advogado 360⁰ – um projeto chapéu que reúne um conjunto de ferramentas essenciais para o exercício da Advocacia, tais como: Skills em Gestão – Orçamentos, pricing, contabilidade, gestão administrativa e burocrática, etc.
Infraestrutura e Tecnologia – Espaço de trabalho (escritório ou cowork), gestão documental, IA para contratos e/ou peças processuais, faturação, segurança digital, etc. Networking – Eventos de networking, formação específica para o acesso a nichos de mercado e angariação de clientes de forma ética, programas de mentoria, promoção de marketing jurídico, etc.
Gestão de Clientes – Canais de comunicação, com foco no remoto, posicionamento e processos de aceitação de clientes e assuntos, foco na confiança, comunicação clara, etc. Desenvolvimento Profissional, Conformidade e Ética – Formação, atualização jurídica, capacidade de comunicação, gestão de conflitos de interesse, acesso a guias de boas práticas da Advocacia (em prática individual, in house), etc.
Este é o exemplo de um programa que pode ajudar todos os advogados, principalmente em prática individual, mas também para os das pequenas sociedades e de empresa, numa lógica de igualdade de oportunidades para o exercício da profissão, seja qual for o regime em que o advogado se encontra.
A implementação deste programa seria feita através do (i) incremento das plataformas internas da OA, aproveitando-as para criar canais de comunicação, mentoria e networking, (ii) a realização de protocolos de cooperação com plataformas que disponibilizam serviços de gestão deste tipo de serviços e do (iii) acesso a redes de apoio com profissionais relacionados com a atividade dos Advogados (uma espécie de bolsa de fornecedores certificados).
Este é o exemplo de um programa que pode ajudar todos os advogados, principalmente em prática individual, mas também para os das pequenas sociedades e de empresa, numa lógica de igualdade de oportunidades para o exercício da profissão, seja qual for o regime em que o advogado se encontra”
Como pretende melhorar a formação inicial e contínua dos advogados em Portugal?
Mesmo antes de ser presidente do CR Lisboa a Formação dos Advogados já era a minha paixão. Durante todos estes anos em funções no Conselho (seja em que cargo for) tenho pugnado por mais e melhor formação para a Classe e se há coisa que tenho a certeza de que fiz bem foi isso e os números falam por si com as inscrições a atingirem mais de 30 mil pessoas.
E este é um tema que continuará sempre a ser urgente. No meu programa conto fornecer ainda mais ferramentas de trabalho adaptadas às novas realidades da Advocacia, o que passa por, nomeadamente:
Incrementar as plataformas internas da Ordem dos Advogados, para permitir a criação de novos canais de comunicação, de mentoria e de networking, entre Advogados e os Órgãos representativos da Classe; Estabelecer protocolos de cooperação com plataformas que disponibilizam serviços de gestão de clientes e processos, de tarefa e de prazos, gestão documental, automatizações, contabilidade, faturação, entre outros (p. ex. plataformas de recrutamento de Advogados para integrar escritórios de Advocacia); Instituir protocolos com empresas credenciadas que possam assegurar os serviços de gestão documental, segurança digital (ferramentas de backup e proteção de dados), serviços de informática, de contabilidade, de arquitetura, de engenharia e outros; e Continuar a programar e desenvolver a formação contínua e diversificada nas diversas áreas do Direito; específica para o desenvolvimento profissional das Advogadas e dos Advogados (p. ex. soft skills, marketing, IA, CITIUS, SITAF; Outlook, Excell e outras ferramentas digitais/recursos); e generalizada e multidisciplinar (p. ex. em informática, empreitadas, gestão de empresas, compliance).
Quais são as suas propostas para valorizar a profissão de Advogado e combater a precariedade no setor?
Tenho um conjunto de propostas no meu programa que vão nesse sentido, mas quero também ‘tomar o pulso’ à Classe porque há muitos anos que não é feito um retrato concreto do que é a Advocacia hoje em Portugal.
Para isso pretendo realizar uma espécie de roadshow pelo país, para conhecer os Advogados, reunir com as estruturas da Ordem, auscultar os seus problemas e necessidades, com vista a melhorar o funcionamento interno e promover união e sinergias. Quero também realizar um Inquérito à Classe, para que possamos obter esse retrato mais atualizado da Advocacia em Portugal e fazer um levantamento dos principais desafios.
Depois, acho imperativo remodelar a tabela de quotas cobradas pela OA, promovendo a não atualização de quotas durante o mandato inteiro e o incremento de um patamar intermédio e revisão de valores.
Quero continuar a lutar pela dignificação dos atos próprios dos Advogados e vou fazer o que estiver ao meu alcance para negociar a reversão e adequação à realidade da profissão das alterações ao Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), sensibilizando o Governo e os grupos parlamentares para essa necessidade.
Também quero criar uma Comissão Contra o Isolamento da Advocacia, a qual deverá ser integrada por vários Colegas das mais diferentes Comarcas, para que se possa criar uma efetiva rede de apoio à Classe, sentindo e sistematizando as diversas necessidades dos Advogados nas diferentes regiões do País, para depois se poder atuar convenientemente. Para isso, serão organizados fóruns de troca de ideias nas diversas Delegações, para depois se intervir na integração de todos os Advogados na nossa Ordem.
Outra iniciativa que quero tomar é trabalhar junto do Governo para a aplicação do regime fiscal geral (como alternativa ao regime da transparência fiscal) a todas as Sociedades de Advogados, mesmo que estas não sejam integradas por sócios que não se encontrem inscritos no exercício da Advocacia, acabando-se com a discriminação atentatória criada pela atual lei que favorece claramente terceiros em detrimento dos Advogados.
Além disso, a nossa lista tem como objetivo sensibilizar o poder político para a necessidade de reduzir a taxa de IVA aplicada às prestações dos nossos serviços para 6%.
Outra iniciativa que quero tomar é trabalhar junto do Governo para a aplicação do regime fiscal geral (como alternativa ao regime da transparência fiscal) a todas as Sociedades de Advogados, mesmo que estas não sejam integradas por sócios que não se encontrem inscritos no exercício da Advocacia, acabando-se com a discriminação atentatória criada pela atual lei que favorece claramente terceiros em detrimento dos Advogados”
Como a OA pode apoiar os jovens advogados no início da sua carreira?
Para haver jovens advogados é primeiro preciso que consigamos ter jovens estagiários o que está muito comprometido, como sabemos, com as alterações ao EOA promovidas, há dois anos, pelo então Governo do PS. Uma dessas medidas, com a qual concordo como princípio, foi a de promover os estágios remunerados na Advocacia. Mas o mesmo governo não quis ou não soube equacionar se havia condições objetivas para o pagamento desses estágios. Ou não teve quem lhe explicasse as realidades da vida da Advocacia.
Por isso, uma das coisas que quero fazer é revisitar esse tema e propor a implementação de medidas no sentido de o Estado assegurar ou viabilizar os meios financeiros necessários à formação dos Advogados estagiários, seja criando bolsas ou disponibilizando acesso a outros meios de financiamento, seja com apoios do IEFP ou outros similares, de modo a permitir que todos os Colegas tenham a possibilidade de dar estágio remunerado.
Além disso, as medidas transversais de que já aqui falei, como a formação e o Programa Advogado 360, também se aplicam aos Colegas mais jovens, sobretudo na área da formação complementar, as chamadas soft skills, para ajudar os jovens advogados a planearem a sua prática.
Também defendo a implementação de uma linha de crédito bonificada, para jovens Advogados que pretendam iniciar a sua atividade, para instalação de um escritório, etc., entre outras medidas.
Como a OA pode garantir a independência dos advogados face a pressões políticas, económicas ou mediáticas?
Como candidato a Bastonário e Presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados, sempre entende e entendo que a independência dos Advogados é fundamental para o funcionamento de um sistema de justiça equitativo e eficaz. A Ordem dos Advogados deve, portanto, ser uma “fortificação” da independência da Advocacia, garantindo que os Advogados possam atuar com liberdade e segurança, independentemente das pressões externas.
Para alcançar esse objetivo, a OA deve defender a autonomia dos Advogados, protegendo-os de influências políticas, económicas ou mediáticas que possam comprometer a sua capacidade de representar os clientes de forma ética e eficaz. Isso inclui promover uma cultura de resistência a pressões externas, oferecer suporte institucional aos Advogados e garantir que as normas deontológicas sejam rigorosamente aplicadas para evitar conflitos de interesses ou condutas abusivas.
Além disso, a OA deve manter um diálogo constante com o poder legislativo e outros atores sociais para assegurar que as leis e regulamentações respeitem a independência da Advocacia. Isso pode ser alcançado através da criação de comissões específicas que analisem e critiquem as reformas legislativas que afetem a profissão, garantindo que a voz dos Advogados seja ouvida e considerada no processo legislativo.
A formação contínua também desempenha um papel essencial, pois ajuda a reforçar a importância da independência profissional entre os Advogados. Workshops e seminários sobre dilemas éticos e estratégias para resistir a pressões externas podem ser particularmente benéficos.
Em resumo, a OA deve ser uma instituição forte e respeitada que proteja a independência dos Advogados, garantindo que eles possam exercer a sua profissão com integridade e liberdade, mesmo perante todos os desafios externos que enfrenta. Essa é uma missão essencial para a manutenção da confiança pública no sistema jurídico e para a defesa dos direitos dos cidadãos.

Como avalia a relação atual entre a OA e o governo, e o que pretende mudar ou melhorar?
Como já disse anteriormente e como, aliás, tenho vindo a dizer publicamente nos últimos tempos, considero que o caminho que a atual liderança da Ordem tem vindo a trilhar não é aceitável e muito menos desejável para o futuro da Ordem.
Não me revejo num posicionamento que é sempre ‘do contra’, seja qual for o tema, situação ou interlocutor. Acho que a Ordem tem o dever de contribuir para o sistema de Justiça como um parceiro ativo e construtivo, e batalhar para, dentro das adversidades e posições conflituantes, encontrar a melhor solução para os problemas – e muitas vezes a melhor solução é a solução possível, é o consenso mínimo que permite que as instituições continuem a funcionar e a prestar os serviços que devem prestar aos cidadãos.
Não vejo como crispar relações institucionais ao ponto de impedir o diálogo direto possa servir a Classe, muito menos a Justiça e o Direito e o papel do Advogado nesse universo. Por isso, como já referi, pretendo melhorar o posicionamento da Ordem no sentido de ser vista como um agente responsável e construtivo do sistema de Justiça, quando há tanta coisa que precisa de ser mudada e melhorada. Uma Ordem independente, livre, autónoma, em vez de autoritária, rígida e inconsequente.
Como a OA pode colaborar com outras instituições, como a magistratura, a polícia e a sociedade civil, para melhorar o sistema de Justiça?
Sempre defendi que a colaboração entre a OA e outras instituições, como a magistratura, a polícia e a sociedade civil, é essencial para o aperfeiçoamento do sistema de justiça. O diálogo institucional permanente entre a OA e essas instituições é fundamental, mas, infelizmente, atualmente, está a faltar.
A participação da Ordem nos vários grupos de trabalho para discutir problemas do setor é fundamental. No entanto, essa participação não está a ocorrer como deveria, como tenho vindo a sublinhar. Acredito que o sistema de justiça só pode melhorar com a participação conjunta de todos os intervenientes.
Para avançar nesse sentido, podemos e deveremos implementar sistemas mais ágeis aproveitando as novas tecnologias, como plataformas digitais de comunicação entre todos. Isso não apenas agiliza os processos judiciais, mas também melhora a transparência e a eficiência do sistema. Além disso, é importante trabalhar em conjunto para criar leis mais justas e eficazes, assegurando os direitos de defesa e promovendo a justiça de forma equitativa, abandonando lógicas confrontacionais e / ou de “quintinhas”.
Outra área importante de colaboração é a criação de campanhas de literacia sobre os direitos fundamentais e o funcionamento do sistema de justiça. Isso ajuda a educar a população e a aumentar a confiança nas instituições judiciárias. A OA deve, portanto, fortalecer as suas parcerias com a sociedade civil para promover essas iniciativas e garantir que o sistema de justiça seja mais acessível e compreensível para todos.
Em resumo, a colaboração entre a OA e outras instituições é vital para o aperfeiçoamento do sistema de justiça. Devemos priorizar o diálogo institucional, a participação em grupos de trabalho e a implementação de soluções tecnológicas e educativas que beneficiem a todos os envolvidos.
Como a OA pode contribuir para uma maior proximidade entre os advogados e a sociedade civil?
Julgo que mais do que tudo é preciso colocar o cidadão no topo das prioridades da Justiça. Como? Criando campanhas de literacia jurídica para consciencializar o cidadão sobre os seus Direitos e o acesso à Justiça, disponibilizando plataformas digitais para facilitar o acesso à informação e serviços jurídicos, etc.
Depois, é preciso melhorar o SADT, promovendo o acesso dos mais carenciados, implementando um sistema de consulta jurídica prévia obrigatória, simplificando a solicitação de apoio judiciário e estabelecendo pontos de atendimento e informação em áreas de maior vulnerabilidade social.
É urgente, também, resolver o problema das custas judiciais como obstáculo ao acesso à Justiça: lutar pela sua redução, criar escalões de desconto progressivos, propor a possibilidade de apenas serem liquidadas no final dos processos ou pugnar pela taxa reduzida de IVA a 6% para a prestação dos serviços jurídicos;
E, claro, continuar o combate à procuradoria ilícita, defendendo uma maior moldura penal para prática do respetivo crime e a natureza pública.
Como a OA pode apoiar os advogados que atuam em causas de interesse público ou em casos mediáticos?
A OA pode desempenhar um papel fundamental no apoio aos Advogados que atuam em causas de interesse público ou em casos mediáticos. É essencial garantir que esses Advogados possam exercer a profissão com segurança, reconhecimento e independência.
A OA deve intervir sempre que os Advogados sejam alvo de pressões ou ameaças por defenderem causas sensíveis. Nesses casos, é essencial reforçar o estatuto do Advogado, assegurando que tenham condições dignas e proteção adequada contra retaliações. Isso pode ser alcançado através da criação de mecanismos internos que permitam monitorar e responder prontamente a situações de risco, como ameaças ou intimidações.
Além disso, a OA deve promover a educação contínua sobre os direitos e prerrogativas dos Advogados, destacando a importância da independência profissional e do sigilo profissional, só assim poderemos fortalecer a confiança dos Advogados e ajudá-los a enfrentar os desafios com maior segurança.
A colaboração com outras instituições, como a magistratura e a polícia, também é vital. A OA deve trabalhar em estreita parceria com essas entidades para garantir que os Advogados sejam respeitados e protegidos no exercício de suas funções, especialmente em casos de grande visibilidade ou sensibilidade.
Por fim, a OA deve estar preparada para defender publicamente os direitos dos Advogados e denunciar qualquer ato que atente contra a sua independência ou segurança. Isso inclui a possibilidade de intervenção judicial, quando necessário, para assegurar que os Advogados possam cumprir o seu papel sem medo de represálias.
Em resumo, a OA deve ser uma fortaleza de apoio aos Advogados que enfrentam desafios em causas de interesse público ou em casos mediáticos, garantindo-lhes as condições necessárias para exercerem a profissão com dignidade e segurança.
Como vê o impacto da inteligência artificial e da automação na profissão de advogado?
A Inteligência Artificial (IA) está a perturbar quase todas as indústrias e profissões, algumas de forma mais rápida e profunda do que outras. Enquanto, por um lado, está a otimizar trabalhos sustentados por mão de obra física, por outro, a IA está também a provocar uma mudança muito profunda em muitas funções especializadas ligadas aos serviços que antes se pensava estarem protegidas da automatização.
Algumas destas profissões estão a ser completamente transformadas pelas capacidades sobre-humanas da IA para fazer coisas que antes não eram possíveis, aumentando – e até certo ponto substituindo – os seus ‘colegas’ humanos nos escritórios.
E a prática do Direito não está a ser alheia a esta revolução. Para a Advocacia, a IA tem muitas vantagens já que economiza tempo, aumenta a produtividade, melhora o acesso à Justiça, aumenta as oportunidades de negócio, permite uma avaliação de risco mais precoce (e mais precisa), melhora a estrutura organizacional e lógica, aumenta a análise criativa e a identificação de precedentes persuasivos, tudo além de reduzir o stress e a frustração dos Advogados e de melhorar as relações com os clientes.
Mas esta ferramenta tecnológica não é isenta de riscos e tem de ser usada com responsabilidade e regras de regulação claras. Há um conjunto de desafios e considerações que os Advogados devem ter em conta antes de avançar para estas soluções e devem ser cautelosos ao confiar em ferramentas de IA sem supervisão, até por causa das questões éticas, que vão desde o sigilo profissional, à proteção de dados, ao potencial de enviesamento de decisões, etc.
Ou seja, acredito que embora não seja infalível e exija que os Advogados sejam cautelosos, a IA para Advogados tem o potencial de transformar positivamente a forma como trabalham. Quando usadas com responsabilidade, as ferramentas de IA podem ser ensinadas a automatizar e executar tarefas rotineiras, ajudando os Advogados a realizar mais com menos tempo e esforço, libertando tempo para uma melhor relação com os clientes, a um custo menor. Desta forma, a utilização de ferramentas de IA também pode ajudar a melhorar o acesso à Justiça.
A Ordem dos Advogados não pode ser vista como uma entidade arruaceira, mesmo quando falamos de disputas ou discordâncias internas. As pessoas comuns podem não ligar às ‘tricas’ e ao detalhe dos debates internos dos Advogados, mas vêm e incorporam a forma como nos tratamos mutuamente”
Quais são as competências essenciais que os advogados precisam desenvolver para o futuro?
Numa era de constante mudança, é preciso dotar os Advogados de meios atualizados para enfrentar as exigências do mundo moderno e adaptados às novas realidades da Advocacia. A resposta é sempre a mesma: Mais Formação.
Passa pela formação contínua – nas diversas áreas do Direito, pela mais específica – para o desenvolvimento profissional, e pela generalizada e multidisciplinar. Isto faz-se também com o incremento das plataformas internas da Ordem, com a criação de novos canais de comunicação, de mentoria e networking, mas também com protocolos de cooperação com plataformas ou empresas credenciadas que disponibilizam serviços de gestão de clientes, processos, gestão documental, automatizações, contabilidade, segurança digital, informática, contabilidade, etc.
No nosso programa tenho um projeto a que chamámos “Advogado 360⁰”: é uma rede integrada para a Advocacia moderna que reúne um conjunto de ferramentas essenciais para o exercício da profissão, em áreas como gestão, infraestrutura e tecnologia, networking, gestão de clientes e desenvolvimento profissional, conformidade e ética, entre muitas outras. É um programa dirigido principalmente aos Colegas em prática individual, mas também para os das pequenas sociedades e de empresa, numa lógica de igualdade de oportunidades para o exercício da profissão, seja qual for o regime em que o Advogados se encontra.
Como a OA pode garantir que a Advocacia continue a ser uma profissão relevante e respeitada no século XXI?
Para pedirmos respeito temos de nos dar ao respeito primeiro. Para isso, o posicionamento público da Ordem, seja perante os Advogados, seja perante o poder político e as instituições, seja junto da Sociedade tem de mudar.
A Ordem dos Advogados não pode ser vista como uma entidade arruaceira, mesmo quando falamos de disputas ou discordâncias internas. As pessoas comuns podem não ligar às ‘tricas’ e ao detalhe dos debates internos dos Advogados, mas vêm e incorporam a forma como nos tratamos mutuamente.
O papel do Advogado na sociedade é demasiado importante – e tem perdido validade nas últimas décadas – pelo que temos de nos dar ao respeito, saber dirimir as nossas diferenças e discordâncias com elevação e trabalhar para ser parte da solução e não do problema.
Os órgãos cimeiros da Ordem há muito que deviam estar a ter um papel mais relevante na promoção do Direito e da Advocacia junto da Sociedade Civil, por exemplo, no âmbito da literacia jurídica. Como podemos esperar que as pessoas se lembrem da importância do aconselhamento de um Advogado na sua vida do dia-a-dia quando nem percebem bem como funciona a Justiça?
Claro que esse papel de capacitação do cidadão deveria ser em primeiro lugar do Estado, mas nada impede a Ordem de também cooperar para esse objetivo e, de caminho, explicar a importância de ter um ‘Advogado de Família’ tal como se tem um ‘Médico de Família’, por exemplo.
No CR Lisboa fizemos várias campanhas neste sentido e será um objetivo da minha liderança continuar a fazê-las.
Se há coisa que não vale a pena esperarem de mim é que fique fechado no gabinete a pensar sobre a importância de ser bastonário – mais depressa me verão na rua, a ouvir os Advogados e os órgãos que os representam um pouco por todo o país”
Quais são as suas propostas para tornar a OA mais transparente e acessível aos seus membros?
Como já disse, das minhas prioridades de campanha fazem parte dois valores essenciais: aproximar e incluir. Aproximar a Ordem dos seus representados significa funcionar de ‘porta aberta’ por assim dizer, não nos escondermos atrás dos cargos para não ter de resolver os problemas.
No CR Lisboa temos tido essa prática, temos vários suportes que permitem aos advogados comunicarem com a direção, temos os canais das redes sociais abertos a todos, sem qualquer censura, divulgamos tudo o que fazemos, pomos temas à consideração dos Colegas, nomeadamente, através da realização de inquéritos.
Se os Colegas me escolherem para bastonário, esse continuará a ser o meu posicionamento: se há coisa que não vale a pena esperarem de mim é que fique fechado no gabinete a pensar sobre a importância de ser bastonário – mais depressa me verão na rua, a ouvir os Advogados e os órgãos que os representam um pouco por todo o país.
Por que razão os advogados devem escolhê-lo como Bastonário?
Sou candidato a Bastonário porque acredito que há um caminho melhor para a Ordem dos Advogados – para recuperar o prestígio de uma instituição que tem como missão, além de representar a profissão e reforçar a solidariedade entre os Advogados, colaborar na administração da Justiça, promover o acesso ao Direito, contribuir para o desenvolvimento da cultura jurídica e ser ouvida na construção legislativa relevante.
Acredito que, nos últimos anos, estas competências têm sido descuradas, com efeitos perniciosos para a credibilidade da Ordem e para a reputação da Advocacia. Esse posicionamento, que considero errado, tem criado um clima de desunião e mal-estar na Classe (afastando os Advogados da vida da Ordem – muitos nem sequer se sentem interessados em votar para eleição dos seus órgãos) e uma erosão da reputação e da notoriedade da Ordem, levando mesmo a que algumas portas se venham fechando ao seu contributo, como tem sido público.
Penso que é urgente inverter esta realidade e quero, com a minha candidatura, devolver a Ordem à Advocacia, com base três valores (i) Proximidade, (ii) Inclusão e (iii) Representatividade. É urgente recuperar o papel da Ordem como parte da solução e não dos problemas.

Que mensagem gostaria de deixar aos advogados portugueses e à sociedade em geral?
Quero deixar uma mensagem de esperança e união. O lema da nossa candidatura, “Juntos Podemos Mais”, reflete minha convicção de que a união e a colaboração são essenciais para enfrentar os desafios atuais e futuros da Advocacia em Portugal, como tem acontecido, por exemplo, no CRLisboa, na colaboração que temos desenvolvido com todas as Delegações da nossa circunscrição territorial.
Acredito que, juntos, podemos recuperar a dignidade da Ordem dos Advogados e da nossa classe. Isso implica promover a transparência em todas as nossas ações, garantir a sustentabilidade financeira da instituição e fomentar a unidade entre os Advogados, sem criar cisões dentro da classe, entre por exemplo, os Advogados em prática individual, como eu, e os advogados em prática societária. Esses princípios são fundamentais para restaurar a confiança pública na Ordem e na profissão como um todo.
À sociedade em geral, quero transmitir que a Advocacia é uma profissão essencial para a defesa dos direitos fundamentais e para o funcionamento de um sistema de justiça equitativo. A OA deve ser uma instituição que não apenas proteja os interesses dos Advogados, mas também sirva como uma voz ativa na promoção da justiça social e na defesa dos valores democráticos.
Portanto, peço que juntos trabalhemos para construir uma Ordem dos Advogados mais forte, mais unida e mais comprometida com a justiça e com a sociedade. Juntos, podemos fazer a diferença e garantir que a Advocacia continue a ser uma força vital na defesa dos direitos e liberdades em Portugal.
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“Para pedirmos respeito temos de nos dar ao respeito primeiro. A OA não pode ser arruaceira”, diz João Massano, candidato a bastonário dos advogados
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