Madeira dá ligeiro empurrão a Montenegro na corrida às legislativas mas cenário ainda é de instabilidade
A vitória de Albuquerque é uma "lufada de ar fresco" para o PSD nacional. Mas é preciso "prudência" na extrapolação de resultados. Ingovernabilidade deverá manter-se, segundo vários politólogos.

A larga vitória do líder do PSD da Madeira, Miguel Albuquerque, nas eleições regionais de domingo, com 43,4% dos votos e a apenas um deputado da maioria absoluta, dá um ligeiro empurrão a Luís Montenegro na corrida às legislativas de 18 de maio e provoca mossa em Pedro Nuno Santos. No entanto, “é preciso prudência” na extrapolação dos resultados, dada a especificidade madeirense. E o cenário, a nível nacional, continua a ser de instabilidade política no pós-eleições, segundo vários politólogos consultados pelo ECO.
No ato eleitoral do passado domingo, o PS Madeira passou de segunda a terceira força política, tendo sido ultrapassado pelo JPP, que surge como o principal partido da oposição. O Chega manteve-se em quarto lugar, mas perdeu um deputado.
“As eleições na Madeira foram uma lufada de ar fresco para Luís Montenegro, mas ainda estamos longe de alcançar estabilidade política”, de acordo com a análise do investigador de doutoramento do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Hugo Ferrinho Lopes.
Para Bruno Costa, professor de Ciência Política da Universidade da Beira Interior, “é natural que o PSD nacional e Luís Montenegro procurem aproveitar a vitória do PSD Madeira para assinalarem a importância do reforço da votação na Aliança Democrática (AD)”, coligação que juntou PSD, CDS e PPM nas legislativas de 2024.
Na mesma senda, Paula Espírito Santo reconhece que “não há eleições que não sejam inócuas”. “Pode haver algum efeito a nível nacional”, salienta a professora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa (ISCSP). Também André Azevedo Alves, professor de Ciência Política da Universidade Católica Portuguesa, conclui que “é inevitável fazer leituras nacionais das eleições regionais”.
Os politólogos, ouvidos pelo ECO, são unânimes de que a “pesada derrota” foi sobretudo para o PS da Madeira e para o seu líder, Paulo Cafôfo. Mas o secretário-geral socialista, Pedro Nuno Santos, poderá sofrer alguma mossa neste momento de pré-campanha para as legislativas, designadamente pelo efeito “cumulativo” de derrotas, assinala Bruno Costa.
O líder socialista perdeu contra Montenegro nas eleições de há um ano, sofreu nova perda nas regionais do passado domingo, “o que pode fazer soar os alarmes face à estratégia política seguida e à capacidade de convencer o eleitorado”, sublinha o especialista em Ciência Política.
No entanto, todos aconselham cautela nas projeções para o contexto nacional. “Os resultados da Madeira são obviamente positivos para o PSD e negativos para o PS, mas há diferenças importantes para a realidade nacional: o PS Madeira está ainda mais fragilizado do que o PS nacional, o Chega terá bastante mais impacto nas legislativas nacionais sob liderança de André Ventura e não há, no contexto nacional, um fenómeno comparável ao JPP. Tudo razões que recomendam prudência em extrapolações para realidade nacional”, defende André Azevedo Alves.
No ato eleitoral do passado domingo, o PS Madeira passou de segunda a terceira força política, tendo sido ultrapassado pelo JPP, que surge como o principal partido da oposição. O Chega manteve-se em quarto lugar, mas perdeu um deputado.
A separar o panorama regional do nacional, Bruno Costa lembra que “a Região Autónoma da Madeira apresenta um histórico político eleitoral e um eleitorado específico“. A este respeito, Paula Espírito Santo salienta que “o contexto regional tem um histórico particular”. “Desde 1976 que o PSD está no poder na Madeira. De 1978 a 2015, com Alberto João Jardim e, há 10 anos, com Miguel Albuquerque. Ou seja, cenário semelhante não se verifica no contexto nacional”, esclarece. Além disso, “o efeito” das eleições na Madeira “vai ficar diluído nos dois meses que medeiam este ato eleitoral e as eleições legislativas”, acrescenta.
Outro fator de incerteza está na quantidade de eleitores que não sabe em que partido votar nas eleições legislativas de 18 de maio. “A campanha vai ser longa e dura, e muito centrada na personalização dos candidatos. Os eleitores atualmente indecisos poderão ser determinantes”, sublinha o professor da Universidade da Beira Interior, Bruno Costa. Hugo Ferrinho Lopes corrobora a mesma tese: “Temos um recorde de indecisos, 39%, que é quase metade. Serão eles que vão decidir a eleição”.
Para além disso, a maioria que o PSD alcançou na Madeira, e que se transformou em absoluta através do acordo com o CDS, parece difícil de se replicar no território nacional. “Ainda estamos longe de alcançar uma maioria estável à direita, estamos longe de alcançarmos uma estabilidade como na Madeira. A situação ainda é muito idêntica ao que aconteceu há um ano. AD e PS estão num empate técnico e o Chega continua a surgir destacado como a terça força política”.
Do mesmo modo, Bruno Costa considera que “o quadro eleitoral madeirense não pode ser reproduzido para a vertente nacional, permitindo uma leitura de que está em aberto o caminho para um cenário de governabilidade a três (PSD, CDS e IL)”.
Casos e casinhos com pouco impacto na decisão do eleitorado

Uma das lições que é possível retirar das eleições regionais na Madeira é que “o facto de políticos e dirigentes partidários serem alvo de acusações de corrupção ou de falta de ética ou transparência não beneficia mas também não prejudica os partidos, tal como vários estudos académicos já o demonstraram”, segundo Hugo Ferrinho Lopes.
“Por exemplo, Miguel Albuquerque esteve envolvido numa série de escândalos, mas isso não beneficiou a oposição nem prejudicou o PSD Madeira. Por outro lado, a fadiga eleitoral, por causa de sucessivas eleições e da falta de estabilidade política, atraíram os eleitores às urnas que desejaram estabilidade, daí terem dado uma maioria ao PSD”, aponta o investigador de doutoramento do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
De lembrar que Albuquerque está indiciado de oito crimes, incluindo corrupção ativa e passiva, prevaricação, tráfico de influência e abuso de poder e atentado contra o Estado de direito, pelo que foi constituído arguido no início do ano passado.
No panorama nacional, o caso é diferente. Montenegro não é suspeito de crime algum nem foi constituído arguido, mas têm sido levantadas dúvidas sobre questões éticas e de falta de transparência, envolvendo a empresa familiar Spinumviva, as quais motivaram a apresentação de duas moções de censura, do Chega e PCP, ambas chumbadas e, uma moção de confiança, que foi rejeitada e que ditou a queda do Governo.
Apesar dos avisos do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, contra as derivas populistas e os ataques à democracia, a campanha será dominada pela polémica em torno da empresa familiar de Montenegro. Um pouco à semelhança do que aconteceu na Madeira, “a oposição, designadamente Pedro Nuno Santos, poderá não tirar dividendos do caso e Montenegro poderá não ser prejudicado“, estima Hugo Ferrinho Lopes.
“A população muitas vezes valoriza mais a proximidade, a obra feita ou a alternativa em vez de casos ligados à justiça”, reforça Paula Espírito Santo. Contudo, a professora do ISCSP avisa que “o carisma que Albuquerque granjeia na Madeira não é o mesmo que Montenegro tem no Continente”, até porque “ainda não teve tempo suficiente para dar provas de governação”. “Só esteve cerca de nove meses” ao leme do Executivo, sublinha.
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