Já se imaginou dependente?

  • Tiago de Magalhães
  • 10:18

Numa altura em que alguns questionam se a Sustentabilidade está a morrer, não é de mais recordar que a contratação de pessoas com deficiência traz inúmeros benefícios para as empresas.

Já se imaginou a não conseguir sair de casa porque não tem condições? Não conseguir ir a um determinado sítio porque está cheio de degraus? Não conseguir abrir a porta porque a mesma não é automática? Não poder ir a um restaurante porque é inacessível? O Dia Europeu da Vida Independente, celebrado a 5 de maio, é uma data significativa que nos convida a refletir sobre a importância da inclusão e da independência das pessoas com deficiência. Instituído pela ENIL – European Network on Independent Living, este dia destaca a necessidade de promover valores e práticas que garantam a autonomia e a participação plena das pessoas com deficiência na sociedade. Um dos pilares fundamentais para alcançar essa independência é, não só a eliminação de barreiras físicas e possibilidade de garantir o apoio em determinadas tarefas, como também e sobretudo a contratação de pessoas com deficiência, proporcionando-lhes uma base sólida para a sua autonomia económica e social.

Segundo o Gabinete de Estratégia e Planeamento, “No último ano, os dados disponibilizados pelo IEFP indicam melhorias em termos do desemprego registado das pessoas com deficiência. Em dezembro de 2022, havia 13.253 pessoas com deficiência desempregadas e inscritas nos Centros de Emprego, menos 2,4% face ao período homólogo de 2021. (…) Assinale-se, ainda, um aumento das mulheres com deficiência inscritas entre 2016 e 2022, em 7 p.p. (de 42% para 49%), indiciando maior dificuldade destas no acesso ao emprego.” Há, por isso, um caminho a percorrer ainda.

Em Portugal existe já legislação específica para promover a contratação de pessoas com deficiência – Lei n.º 4/2019, de 10 de janeiro – a qual estabelece um sistema de quotas de emprego para pessoas com um grau de incapacidade igual ou superior a 60%. Esta legislação, que tem espaço para melhorias, não deixa de ser passo crucial para garantir que as pessoas com deficiência tenham acesso a oportunidades de emprego, tanto no setor privado quanto no setor público, acabando por poder ser vista como um tipo de discriminação positiva. De acordo com a referida lei, as empresas com um número igual ou superior a 75 trabalhadores devem admitir trabalhadores com deficiência, em número não inferior a 1% do seu quadro de pessoal, sendo que para as empresas com 250 trabalhadores ou mais o número percentual sobe para 2%. Mais se prevê que as empresas têm a obrigação de garantir que, em cada ano civil, pelo menos 1% das contratações anuais seja destinada a pessoas com deficiência, visando assegurar um cumprimento faseado das quotas. A lei prevê exceções para as entidades empregadoras que comprovem a impossibilidade de aplicar as quotas de emprego devido à natureza dos postos de trabalho ou à falta de candidatos qualificados. No entanto, é importante destacar que há um trabalho prévio a ser feito e que a violação das disposições da lei constitui contraordenação sujeita ao pagamento de uma coima.

Numa altura em que alguns questionam se a Sustentabilidade está a morrer – que não está! –, não é de mais recordar que a contratação de pessoas com deficiência traz inúmeros benefícios para as empresas e para a sociedade em geral. Em primeiro lugar, promove a própria diversidade e a inclusão no local de trabalho, criando um ambiente mais rico e inovador. Além disso, a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho é um passo essencial para a sua independência económica. Ter um emprego permite que estas pessoas tenham uma fonte de rendimento mais estável, o que é fundamental para a sua autonomia e para a melhoria da sua qualidade de vida, com claros benefícios de todos. A independência económica também reduz a dependência de apoios sociais, promovendo uma integração mais plena na sociedade.

Ainda de acordo com a mesma Lei, não apenas são estabelecidas quotas de emprego, mas também a possibilidade de serem pedidos apoios técnicos e adaptações necessárias para garantir que as pessoas com deficiência possam desempenhar as suas funções de forma eficaz.

Promover a vida independente das pessoas com deficiência é um dever de todos nós. Por vezes basta mudar a lente com que olhamos para os outros colocando-a em nós mesmos. A contratação de pessoas com deficiência não é apenas uma obrigação legal, mas uma oportunidade para enriquecer o ambiente de trabalho e para construir uma sociedade onde todos têm a oportunidade de prosperar, ser independentes e autónomos.

  • Tiago de Magalhães
  • Associado Sénior de Direito do Trabalho e Fundos de Pensões da CMS

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