Marcelo veta blindagem que impede passagem da Carris a privados
O Presidente da República devolveu à Assembleia o diploma que prevê a passagem da Carris para a Câmara de Lisboa por este limitar as opções futuras da autarquia.
Marcelo Rebelo de Sousa devolveu à Assembleia da República, sem promulgação, o diploma que altera as regras da passagem da Carris para a alçada da Câmara de Lisboa. Segundo a carta divulgada na página oficial da Presidência da República, o Presidente considera que o regime, como ficou definido, limita excessivamente as opções futuras da autarquia relativamente à Carris, ao impedir a concessão ou subconcessão a privados, mesmo que seja essa a vontade da Câmara.
“O presente decreto impõe ao Governo e às autarquias locais um regime que proíbe qualquer concessão da Carris mesmo que tal possa vir a corresponder um dia à vontade da Autarquia Local”, pode ler-se na carta enviada por Marcelo a Ferro Rodrigues. Para Marcelo esta não deve ser uma decisão do legislador, mas sim “da Administração Pública”, correndo o risco de se tornar “politicamente contraproducente”.
“Por princípio, num Estado de Direito Democrático, o legislador deve conter-se, em homenagem à lógica da separação de poderes, não intervindo, de forma casuística, em decisões concretas da Administração Pública”, continua a carta. “Mesmo que essa indesejável intervenção legislativa possa não ser qualificada de inconstitucional – e, por isso, não suscitar a correspondente fiscalização –, pode ser politicamente contraproducente, e, por isso, excessiva e censurável.”
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"Mesmo que essa indesejável intervenção legislativa possa não ser qualificada de inconstitucional – e, por isso, não suscitar a correspondente fiscalização –, pode ser politicamente contraproducente, e, por isso, excessiva e censurável.”
No ano passado, o Presidente da República já tinha decidido impedir a passagem de um diploma semelhante que, segundo este, vetava “taxativamente” a participação de privados na concessão da STCP e da Metro do Porto.
“Decisão correta” para alguns, “irresponsabilidade” para outros
Em declarações aos jornalistas, o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, afirmou que, ainda que este assunto não faça parte da sua pasta, a “manutenção das empresas na esfera pública e esfera privada é uma decisão que compete aos poderes públicos”, pelo que, para o próprio, a passagem da Carris para o município “foi uma decisão correta”, que já está a sortir “melhorias claras”.
O memorando da passagem de gestão da Carris para a Câmara Municipal de Lisboa foi assinado por Fernando Medina e António Costa em novembro do ano passado. O objetivo, segundo os próprios, era dar resposta às necessidades de melhoria do transporte público e de qualidade da mobilidade urbana na capital, mas a medida recebeu oposição da direita à esquerda.
O PCP considerou que “é ao Governo que cabe assegurar uma Carris pública, de qualidade, ao serviço dos trabalhadores e da população da cidade e da região de Lisboa”. Já o PSD considerou “uma irresponsabilidade” separar a gestão da Carris da do Metropolitano “sem existir uma estratégia ou articulação conjunta entre os dois modos de transporte”.
A carta de Marcelo Rebelo de Sousa a Ferro Rodrigues, na íntegra
“Excelentíssimo Senhor Presidente da Assembleia da República,
Dirijo-me a Vossa Excelência nos termos do n.º 1 do Artigo 136.º da Constituição, transmitindo a presente mensagem à Assembleia da República, relativa ao Decreto N.º 155/XIII, sobre a Primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 86-D/2016, de 30 de dezembro, que atribui ao município de Lisboa a assunção plena das atribuições e competências legais no que respeita ao serviço público de transporte coletivo de superfície de passageiros na cidade de Lisboa, transfere a posição contratual detida pelo Estado no Contrato de Concessão de Serviço Público celebrado com a Carris, e transmite a totalidade das ações representativas do capital social da Carris do Estado para o município de Lisboa.
1. Por princípio, num Estado de Direito Democrático, o legislador deve conter-se, em homenagem à lógica da separação de poderes, não intervindo, de forma casuística, em decisões concretas da Administração Pública, que têm de atender a razões de natureza económica, financeira e social mutáveis. E em que ela está em melhores condições para ajuizar, até por se encontrar mais próxima dos problemas a resolver.
Mesmo que essa indesejável intervenção legislativa possa não ser qualificada de inconstitucional – e, por isso, não suscitar a correspondente fiscalização –, pode ser politicamente contraproducente, e, por isso, excessiva e censurável.
2. O presente decreto impõe ao Governo e às autarquias locais um regime que proíbe qualquer concessão da Carris mesmo que tal possa vir a corresponder um dia à vontade da Autarquia Local.
3. O regime em apreço, ao vedar, taxativamente, tal concessão representa uma politicamente excessiva intervenção da Assembleia da República num espaço de decisão concreta da Administração Pública – em particular do Poder Local, condicionando, de forma drástica, a futura opção da própria Autarquia Local.
Assim sendo, entendo dever a Assembleia da República ter a oportunidade de ponderar de novo a matéria.
Devolvo, por conseguinte, sem promulgação, o Decreto n.º 155/XIII da Assembleia da República.
Marcelo Rebelo de Sousa”
(Notícia atualizada pela última vez às 13h10 com correção do título “Marcelo veta passagem da Carris para a Câmara de Lisboa” para o atual)
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