Ordem dos Advogados vai entregar proposta de colaboração premiada ao Governo
Ordem dos Advogados já preparou uma proposta para entregar ao Governo em que estará em cima da mesa em que moldes pode ou não exisitir uma colaboração premiada a quem ajudar na investigação de crimes
A Ordem dos Advogados (OA) está a preparar uma proposta de lei relativamente à delação premiada, embora de forma limitada. Ou seja: alguém que esteja envolvido numa investigação criminal ou que seja pelo menos cúmplice de um crime que, ajudando as autoridades judiciárias, possa vir a ter uma redução de pena. A proposta estabelece um conjunto de “condições mínimas que são absolutamente exigíveis” para que “possa estruturar-se um sistema em que haja, de facto, uma colaboração processual que possa ser, como tal, premiada”.
Numa entrevista dada ao Boletim da OA, o presidente do Gabinete de Política Legislativa, José António Barreiros, que está envolvido na preparação do diploma, admite que o que se pode pôr em causa é, a partir daqui, “construir condições contratualizadas, situações de verdadeiros negócios processuais, em que chega a haver, no fundo, quase taxas de sucesso, uma espécie de success fee, em que se por acaso, em virtude do colaborador premiado, alguém for condenado na pena “x”, então ele tem o benefício “y” percentual na pena que lhe cabe”.
O membro do Gabinete de Política Legislativa admite “nós temos de dizer honradamente que não podemos ter uma posição maximalista, não podemos dizer que os Advogados portugueses estão absolutamente contra a colaboração premiada ou que estão totalmente a favor”.
Segundo José António Barreiros, o que está em causa é basicamente isto: estabelecer a listagem das condições mínimas que são absolutamente exigíveis para que possa estruturar-se um sistema em que haja, de facto, uma colaboração processual que possa ser premiada.
“Já está em marcha a criação de um pequeno grupo de trabalho que irá promover a elaboração dessa minuta de projeto, que irá ouvir quem tiver que ouvir, a qual será apresentada ao Bastonário e que, por via dele e do Conselho Geral, que é o órgão politicamente competente, será apresentada ao poder político para decisão”, segundo José António Barreiros explica no boletim da Ordem dos Advogados.
A lei portuguesa já prevê algumas situações para os chamados arrependidos ou para quem queira colaborar com a justiça. No Brasil, a chamada delação premiada é admitida. Mas, por exemplo, além do testemunho, o “colaborador” tem que apresentar provas do que alega.
Os “acordos de colaboração processual” entre o criminoso denunciante e o Ministério Público existem no Brasil conhecidos por “delação premiada”, em Itália com os “collaboratori della giustizia” e de forma mais mitigada no direito anglo-saxónico com os “crown witness”, na Alemanha com os “kronzeugen” e em Espanha com os “arrepentidos”, nestes últimos casos limitados a criminalidade organizada e terrorismo.
“A verdade é que tenho muita dificuldade em aceitar, enquanto cidadão e enquanto profissional do foro, que uma democracia com mais de 40 anos de existência, possa pensar em consagrar em termos semelhantes ao Brasil o sistema da delação premiada”, explica António Jaime Martins em declarações ao ECO/Advocatus.
O líder da Regional de Lisboa da Ordem defende que “sendo a finalidade do direito penal a de proteger bens jurídicos necessários à boa convivência em sociedade, promovendo os valores da ética e da honestidade, creio que a busca de uma sanção penal deve respeitar e promover aqueles mesmos valores e não os que fundaram as condutas que se pretendem combater”.
O advogado defende que “a denúncia do delator não constitui um ato espontâneo de colaboração com a investigação criminal, mas antes representa a obtenção para o infrator, também ele participante na prática criminal, de um benefício pela denúncia de outros participantes. O delator denuncia pelo temor de já ter sido descoberta ou estar em vias de o ser a atividade criminosa por si prosseguida. Mas mais relevante que tudo o mais, entendo que o recurso à delação premiada como forma generalizada de investigar constitui, em si mesmo, o embrião do desmantelamento da máquina de investigação criminal. E, do ponto de vista jurídico-constitucional, constituiria um ataque sem precedentes ao princípio da defesa e deixaria aos advogados o papel de aconselharem sobre a oportunidade de delatar, independentemente da intensidade da participação (ou ausência de participação) no ilícito”, concluiu António Jaime Martins.
Na recente alteração à chamada lei da corrupção no fenómeno desportivo, a Assembleia da República aprovou um regime próximo à delação premiada, ao ficar consagrado na tal lei (13/2017, de 2 de maio) que as penas podem ser atenuadas “se o agente auxiliar concretamente na recolha das provas decisiva para a identificação ou a captura de outros responsáveis”.
Politicamente, o parlamento divide-se. PSD e CDS estão a favor. PS e Bloco de Esquerda são contra. No setor, magistrados (quer juízes, quer procuradores) são a favor desta matéria.
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