Pedro Ferraz da Costa critica a falta de preocupação que o governos têm relativamente ao crescimento e defende a necessidade de se pagar melhor aos quadros do Estado. Foi no ECO24.
Pedro Ferraz da Costa é pragmático: “Não estamos em condições de selecionar” investidores estrangeiros. O presidente do Fórum para a Competitividade questionado no ECO24 sobre a forma como avalia o crescente investimento chinês em Portugal, em áreas como a banca ou a energia admite que gostaria de ver apostas de outras geografias e alerta para os riscos de se depender de um único mercado.
“Com certeza que gostava que tivéssemos mais investimento com a Noruega para o mar ou com a Alemanha no automóvel”, disse aos microfones da TVI. “Temos sempre de diversificar. Não vejo vantagem nenhuma em estarmos dependentes de um único investidor”, frisa. “Mas para isso também teríamos de ter uma visão estratégica e prática”, algo que o país não tem na sua opinião.
Não vejo vantagem nenhuma em estarmos dependentes de um único investidor.
E dá um exemplo dessa falta de estratégia, por exemplo ao nível da “política portuária”. “A concessão de Sines está a chegar ao ao fim e não se sabe o que vai acontecer. Perdemos oportunidades todos os dias, independentemente de a coisas estarem a correr bem”, garante.
Ferraz da Costa lança ainda uma alfinetada aos elogios que tecidos em torno do sucesso na colocação de dívida no mercado, a preços cada vez mais competitivos. “Atrair investimento para comprar dívida portuguesa não vai criar melhores hipóteses de futuro”, sublinha. E ataca outros dos pontos que o Executivo tem usado como bandeira do sucesso económico. “Estamos muito contentes porque temos muitas startups. Mas nenhuma consegue sair de um grau de insipiência”, lamenta.
“Não há estratégia nacional para ajudar as empresa a ganhar dimensão”
A falta de dimensão das empresas que compõem o tecido empresarial português é, aliás uma das principais preocupações do presidente do Fórum para a Competitividade. Ferraz da Costa critica o facto de, em Portugal, ao contrário do que acontece em Espanha, não haver uma estratégia nacional para ajudar as empresas a ganhar dimensão.
“Espanha tem um projeto que identifica as empresas que podem seguir objetivos como dobrar a sua dimensão. Não temos nada feito para esse setor, que é aquele que pode mudar o panorama económico em Portugal”, afirma o empresário. “Não são as PME, nem as muito grandes empresas que o vão conseguir”, garante.
O antigo presidente da CIP manifesta ainda a sua preocupação com o facto de “¾ das empresas nacionais exportarem para um só mercado e, em muitos casos, para Angola”. “Não é uma situação tranquilizadora”, diz.
Mas essa falta de dimensão não é culpa dos empresários, cuja coragem em conquistar novos mercados não merece senão elogios rasgados do presidente do Fórum para a Competitividade. O ónus está do lado do Governo, e não apenas do atual. “O problema da competitividade externa e do crescimento nunca foi preocupação de nenhum Governo que me lembro”, diz Ferraz da Costa. “Não fizemos um caminho sólido em termos de melhoria de competitividade”, acrescenta.
E porquê? “Em parte por eleitoralismo”, responde. “Temos um ciclo político de dois anos, se não fizerem as reformas nesses primeiros dois anos, depois já não as fazem porque há as autárquicas e as europeias”.
Ferraz das Costa lamenta ainda que os partidos se tenham “degradado brutalmente”, o que torna “difícil de imaginar pactos de regime”. Pactos que se deveriam estabelecer “em tudo o que exige objetivos a prazo: território, política de urbanização, transportes”, exemplifica.
Os partidos têm-se degradado brutalmente. É difícil imaginar pactos de regime.
Mas não é tudo. O empresário aponta ainda o dedo à instabilidade fiscal e ao nível das taxas de imposto, “que este ano subiram”, ao problema da burocracia — “para se fazer um licenciamento já demora quase tempo tempo como demorava”, denuncia –, os custos de contexto e ainda a legislação laboral. Já que, “entretanto, foram revertidas as medidas feitas no período de ajustamento”. “Não se veem bons sinais”, conclui.
O presidente do Fórum para a Competitividade lamenta ainda a “conversa demagógica” que se tem levado a cabo em torno das PME. O empresário reconhece que estas “representam uma parte importante do emprego” e que é necessário “perceber os seus problemas”, mas Portugal precisa sobretudo de empresas que “possam internalizar novas tecnologias, lançar-se em novos mercados”. “Têm de ter uma dimensão de 200 a 300 pessoas”, identifica. “Temos muito poucas dessas e devíamos era perguntar porque é que crescem tão pouco”, acrescenta.
Mas o problema é que as grandes empresas têm “má reputação”, reconhece, uma situação que se deve a “motivos políticos, mas não é de hoje”, garante.
“Há um problema grande na estrutura patronal”
O antigo presidente da CIP, a Confederação Empresarial de Portugal considera que a estrutura que reúne os patrões nacionais, não está isenta de culpas. “Há um problema grande na estrutura patronal”, defende.
“No essencial temos a mesma estrutura que vem do Estado Novo”. Um problema que se estende aos sindicatos que também não são muito diferentes da “estrutura que vinha antes do 25 de Abril”. Ferraz da Costa considera ainda que António Saraiva, o atual patrão dos patrões, até “está numa posição de ser mais combativo”, manifestando uma forte preocupação pelas questões laborais, mas é confrontado com a dura realidade de as suas propostas não terem reflexo no Orçamento do Estado para 2018.
“É difícil convencer um Governo em situação de instabilidade política, se não tiver a opinião pública do seu lado”, reconhece. Um problema que se agrava pelo facto de o patronato “comunicar mal, ter pouca vontade de falar dos problemas e considerar que o silêncio é a melhor solução”. “As pessoas têm de ir a jogo”, diz, aquele que foi presidente da CIP apenas com 34 anos.
“Temos de ter uma sociedade que vá criando hipóteses para os mais novos, mas que não deixe ninguém para trás”, defende Ferraz da Costa. “Para o desafio que Portugal enfrenta no futuro — uma modernização mais rápida — estar dependente do PCP e do Bloco” não é bom porque “não o conseguirá fazer”.
“O que está a acontecer na Autoeuropa é difícil de entender”
Os efeitos da chamada geringonça fazem-se sentir também num outro dossiê — o da Autoeuropa. Com a saída do “líder histórico” da comissão de trabalhadores, António Chora, este órgão “deixou de ter força para negociar diretamente com a empresa” e “as forças sindicais tentam um rearranjo e equilíbrio de forças, porque pensavam que após um investimento” da envergadura do que foi feito para a fábrica de Palmela produzir em exclusivo para todo mundo o modelo T-Roc, “a empresa estava agarrada” e que “não é possível sair [do país] num prazo curto”.
Mas segundo Ferraz da Costa, os sindicatos não percebem que “os tempos de decisão de uma empresa desta dimensão é muito diferente do que as pessoas pensam”. Para o empresário “há um risco enorme” de que a questão não termine da melhor forma.
“Temos um problema que não vale a pena esconder: ou acreditamos que o nosso futuro está integrado nas políticas comunitárias ou continuamos a acreditar num Deus que não existe em sítio nenhum”, afirma, acrescentando que na sua opinião “o PCP toma atitudes dificilmente compreensíveis”.
“Pagamos muito mal aos quadros do Estado”
Finalmente, Ferraz da Costa defendeu que é necessária uma colaboração estreita entre o Governo e a Administração Pública, entre as universidade e as empresas, caso contrário não será possível lançar grandes projetos para o futuro. “Isso exige a cooperação de todos e uma Administração Pública com alguma estabilidade”, diz.
Para o empresário, um dos “aspetos piores” durante o período do ajustamento é Portugal pagar “muito mal aos quadros do Estado”. O antigo presidente da CIP admite que “se calhar era inevitável”, mas “já deveria ter sido corrigido”. Ferraz da Costa tem o cuidado de precisar que não defende que os funcionários públicos são mal pagos, até porque “aos menos qualificados se paga mais do que no privado”.
“Estou a falar dos quadros e dos quadros superiores. A necessidade que o Estado tem de recorrer a empresas de consultoria para quase todos os assuntos tem a ver com essa fragilidade, que é inaceitável”, afirma.
“Quando não se consegue definir políticas porque não se tem internamente pessoas para o fazer, para negociar com diversos interesses, que têm de ser temperados, geridos, avaliados é uma forma de ter o Estado desarmado”, conclui.
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